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CHAMADA DE ARTIGOS PARA DOSSIÊ

Estimadxs, os convidamos a contribuir com artigos inéditos em nosso próximo dossiê “Habitar a cidade. Estado e cidadania na América Latina desde a segunda metade do século XX”, que será publicado em dezembro de 2022.

 

Fundamentação

Resulta evidente que o cenário pandêmico pôs no centro da cena a desigualdade social no que se refere ao acesso aos serviços básicos como água e habitação para evitar a propagação do vírus. A enorme desigualdade no acesso à habitação e no exercício do direito universal de habitar a cidade são problemáticas pré-existentes e estruturais das cidades latino-americanas, que se incrementaram fortemente na década dos noventa, após a implementação das políticas neoliberais. Nesses anos, foi-se consolidando um modelo de cidade que apontou à segregação sócio espacial, o que gerou uma maior concentração da terra urbana por parte do mercado imobiliário e um modelo de fragmentação social.

No contexto da Guerra Fria, a problemática urbana se converteu em um problema político e objeto de debate, que levou a que distintos atores governamentais promovessem uma série de políticas orientadas à construção da habitação social, junto à promoção de créditos hipotecários. Tais políticas se desenvolveram junto à formulação de um conjunto de planos reguladores para o desenvolvimento urbano.

Durante os anos cinquenta, as cidades latino-americanas cresceram exponencialmente e se aprofundou a crise habitacional. O processo de industrialização posto em marcha em vários países da América Latina produziu um acelerado processo de urbanização nas áreas metropolitanas. Isso se traduziu na visualização e proliferação da informalidade urbana, que obrigou os Estados a enfrentar o problema da habitação visto como sintoma de “atraso”. Se propuseram um conjunto de políticas estatais tendentes a promover o planejamento urbano e o ordenamento territorial, a construção de bairros e moradias para setores populares. Este tipo de políticas estiveram estreitamente vinculadas à obra pública que descansava sobre a base de uma planificação centralizada sob diferentes formas de governo e em sistemas de economia capitalista. Ao longo do período, a autoconstrução popular conviveu com as “soluções” habitacionais que aplicavam os Estados e, em alguns países, se tratou de uma política governamental tendente a brindar respostas com participação social à complexa situação habitacional.

Na América Latina, os anos posteriores à Conferência de Vancouver de 1976 se caracterizaram pela queda do crescimento econômico, o desemprego, as dívidas externas e a retirada do Estado em matéria social. Se favoreceu a remercantilização de bens e serviços antes protegidos pelo Estado, a privatização das empresas públicas e dos bancos hipotecários. Foram promulgadas leis de descentralização dos serviços básicos e se promoveu a desestatização e focalização, o que produziu sérias crises sociais. Muitos setores sociais criticavam as políticas de planificação centralizadas e a produção massiva de habitação por parte do Estado. Os Estados assumiram um rol “facilitador” ao impulsionar o fim dos sistemas nacionais de provisão habitacional centrados no financiamento da oferta. Isso favoreceu a expansão do mercado imobiliário já que a tendência foi limitar a regulação do mercado de solo urbano, da habitação e dos serviços urbanos. Desse modo, a flexibilização das normas urbanas aprofundou os processos de segregação sócio espacial.

Ao longo das últimas décadas, o campo da história urbana adquiriu uma notável relevância para refletir sobre como se pensaram as cidades latino-americanas e que tipo de políticas governamentais se implementaram nos distintos processos históricos. Em função do exposto, o objetivo deste dossiê é reunir um conjunto de investigações empíricas e teóricas que abordem e reflitam sobre distintos aspectos da problemática urbana e dos modos de habitar de diferentes atores sociais (habitantes dos bairros, movimentos sociais e de bairros, agentes governamentais, atores transnacionais, etc.). Espera-se reunir um conjunto de trabalhos que privilegiem o enfoque multidisciplinar, os estudos de casos ou comparativos, que dialoguem com perspectivas teóricas e problemas metodológicos da área dos estudos urbanos na América Latina desde meados do século XX até as primeiras décadas do século XXI, em suas múltiplas escalas e dimensões de análise.

Particularmente, interessam os trabalhos que indaguem sobre diferentes atores das políticas urbanas do habitar em relação às políticas de habitação, de erradicação da informalidade urbana, construção de habitações sociais, alugueis, conformação de assentamentos populares e estratégias de autoconstrução. Espera-se um conjunto de trabalhos que problematizem as políticas estatais implementadas tendentes a brindar algum tipo de “solução” ao problema habitacional: como foram concebidas, quem e como se instrumentalizaram, quais foram seus efeitos e quais tem sido as respostas dos atores populares a tais políticas. Ainda, interessa convocar pesquisas dedicadas a reconstruir as discussões disciplinares sobre as problemáticas habitacionais e urbanas em instituições e publicações acadêmicas provenientes dos campos da arquitetura, do urbanismo, da sociologia e antropologia urbana, assim como trabalhos que reflitam sobre um conjunto de fontes históricas como os censos nacionais, as imagens cartográficas, os relatórios técnicos elaborados por agências estatais para o estudo do habitar popular e urbano.

De acordo com o exposto, propõe-se uma série de eixos que servirão de guia para a seleção dos trabalhos:

Que tipo de cidade se tendeu a consolidar na América Latina em relação a como foi pensada a cidadania e quem habita e fica excluído da cidade? Como pensar os projetos urbanos em relação à cidadania?

Que efeitos tiveram as intervenções urbanas das ditaduras latino-americanas e que continuidades e rupturas tiveram nos governos pós-ditatoriais?

Que ferramentas teóricas e epistemológicas permitem reconstruir historiograficamente a transformação dos processos urbanos?

Como se modificaram historicamente os modos de habitar dos setores populares e suas práticas de apropriação do espaço urbano? Quais foram as mudanças operadas sobre o universo simbólico de seus habitantes? O que nos dizem as cartografias e as imagens de época sobre as condições de vida de seus habitantes?

 

Palavras-chave: Cidade; Estado; Habitar; Cidadania.

 

Coordenadoras

María José Bolaña (Departamento de Ciencia Política, Facultad de Ciencias Sociales, Universidad de la República Oriental del Uruguay)

maria.bolana@cienciassociales.edu.uy

 

Gabriela Gomes (Consejo Nacional de Investigaciones Científicas y Técnicas, Universidad Nacional de General Sarmiento, Universidad de Buenos Aires) gabrieladaianagomes@gmail.com

 

Eulalia Portela Negrelos (Universidade de São Paulo, Instituto de Arquitetura e Urbanismo - IAUUSP) negrelos@sc.usp.br

 

Correio eletrônico de contato: rrihalc@ffyh.unc.edu.ar