Conceito de massa e a relação massa-energia no conteúdo de relatividade especial
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REVISTA DE ENSEÑANZA DE LA FÍSICA, Vol. 34, n.o 1 (2022) 11
A. O Conceito de Massa Relativística
O conceito de massa apresenta uma rica história (Jammer, 1999, 2009), mas que muitas vezes é omitida dos livros
didáticos e técnicos. Inicialmente, o conceito de massa confundia-se com as noções de peso ou de matéria (Jammer,
1999, 2009). Algumas narrativas atribuem ao filósofo natural e matemático italiano Galileu Galilei à definição moderna
de massa, porém, isso não é verídico (Westfall, 1966, Jammer, 1999, 2009).Foi Newton, em seu Principia, que tentou
fornecer uma definição rigorosa de massa, distinguindo a massa inercial, que ele associou a quantidade de matéria de
um corpo (Newton, 2012a, p. 39), e a massa gravitacional, que ele associou a interação gravitacional, mas não espe-
culou sobre a sua natureza (Westfall, 1993, Cohen, 1999, Jammer, 1999, 2009). Newton também realizou experimentos
envolvendo pêndulos cujo bulbo era feito de diferentes materiais e concluiu que a massa inercial e massa gravitacional
eram equivalentes (Whittaker, 1952, 1953, Westfall, 1993, Cohen, 1999, Newton, 2012). No século XVIII, Euler definiu
a massa inercial como uma medida da inércia do corpo por meio do coeficiente entre força e aceleração (Jammer,
1999). Embora a obra de Newton e a definição de Euler tenham ganhado forte adesão, principalmente a partir do
século XVIII (Whittaker, 1952, Westfall, 1966, 1993, Cohen, 1999, Jammer, 1993, 1999, 2009), porém alguns comenta-
ristas e críticos denunciaram um caráter circular entre as definições de massa e força (Poincaré, 1902, Whittaker, 1952,
Westfall, 1993, Cohen, 1999, Jammer,1999, 2009).
No final século XIX, os desenvolvimentos na eletrodinâmica indicavam que a natureza última da massa poderia ser
eletromagnética (Poincaré, 1895, 1900, 1902, 1904, 1905, 1906, 1908, Lorentz, 1912, 1931, Langevin, 1913, Whittaker,
1953, Martins, 1989, 2005, 2015, Darrigol, 1995, 1996, 2003, 2004, 2006, Miller, 1997). Ainda no final do século XIX,
estudos envolvendo elétrons em altas velocidades, mostravam que sua inércia crescia à medida que sua velocidade se
aproxima da velocidade da luz. O fato mais curioso é que a variação da massa inercial do elétron era diferente para as
direções longitudinais e transversais, em relação ao movimento (Langevin, 1913, Whittaker, 1953, Fadner, 1988, Mar-
tins, 1989, 2005, 2012, 2015, Darrigol, 1995, 1996, 2003, 2004, 2006, Costa, 1995, Miller, 1997). Em 1898 e 1900, o
físico Phillip Lenard (1862-1947) mediu a razão e/m (sendo e é a carga do elétron, m sua massa) para elétrons em
velocidades próximas a da luz e detectou um aumento de sua massa (MARTINS, 2005, 2015). Estes resultados foram
confirmados em 1901, pelo físico Walter Kaufmann (1871-1947) (Miller, 1997, Martins, 2005, 2015). Em 1902, o físico
Max Abraham (1875-1922), mostrou que a variação da massa do elétron dependeria da direção em que a força externa
é aplicada sobre a carga (Miller, 1997, Martins, 2005, 2015). De forma simplificada, Abraham mostrou que é mais fácil
acelerar (ou desacelerar) um elétron do que defleti-lo, pois no primeiro caso a inércia é menor (Martins, 2005, 2015).
Embora, o modelo matemático proposto por Abraham tenha sido contestado por Bucherer e, posteriormente, por
Lorentz, todos eles concordavam com as implicações qualitativas apresentadas por Abraham (Fadner, 1988, Martins,
1989, 2005, 2012, 2015, Darrigol, 1995, 1996, 2003, 2004, 2006, Miller, 1997).
Paralelo a esses desenvolvimentos, em 1900, Henri Poincaré mostrou que a radiação também deveria apresentar
uma massa inercial (Poincaré, 1900, Lorentz, 1912, 1931, Langevin, 1913, Whittaker, 1953, Kantor, 1954, Fadner, 1988,
Martins, 1989, 2005, 2012, 2015, Darrigol, 1995, 1996, 2003, 2004, 2006, Miller, 1997). Posteriormente, Abraham e
Hasenhörl, mostraram que uma caixa perfeitamente espelhada, cheia de radiação, deveria sofrer um aumento de sua
inércia (Lorentz, 1912, 1931, Langevin, 1913, Whittaker, 1953, Kantor, 1954, Fadner, 1988, Martins, 1989, 2005, 2012,
2015, Darrigol, 1995, 1996, 2003, 2004, 2006, Miller, 1997). Embora todos estes resultados tenham aparecido antes
dos trabalhos de Einstein, eles foram assimilados pela Teoria da Relatividade. Assim, logo que a Teoria da Relatividade
surgiu, os pesquisadores reconheceram três tipos de massa inercial (Langevin, 1913, Costa, 1995, Miller, 1997, Martins,
1989, 2005, 2012, 2015):
1. Massa cinética, associada a energia eletromagnética de uma carga em movimento;
2. Massa maupertuisiana de Poincaré, que está associado a quantidade de movimento (momento) dos corpos pon-
deráveis e da radiação;
3. Massa acelerativa, de Abraham, que está associada a força aplicada sobre um corpo ponderável. Essa massa
acelerativa pode ser longitudinal (quando a força aplicada sobre o corpo é paralela ao vetor deslocamento dele)
ou transversal (quando a força aplicada sobre o corpo é perpendicular ao seu vetor deslocamento).
Em seu ensaio de 1905, Einstein estudou a variação da inércia dos elétrons em movimento uniforme como uma
consequência do princípio da relatividade e propôs que esse efeito deveria ser verificado em todos os corpos ponde-
ráveis (Einstein, 1905a). Einstein (1905b) também deduziu uma regra para transformação das massas longitudinal e
transversal, porém a dedução desta última estava incorreta (Cullwick, 1983, Miller, 1997, Martins, 2015). Em 1906,
Planck corrigiu o erro de Einstein e apresentou a forma relativística da hamiltoniana (Planck, 1906, Whittaker, 1953,
Miller, 1997, Martins, 2015). A partir da hamiltoniana, Planck definiu o momento generalizado e a partir dele, mostrou
que todas as massas inerciais poderiam ser deduzidas a partir desse princípio (Planck, 1906, Whittaker, 1953, Miller,
1997, Martins, 2015). Em 1908 e 1909, G. N. Lewis e R. C. Tolman, desenvolveram, a partir do trabalho de Planck, os