VOLUMEN 33, NÚMERO 2 | Número especial | PP. 97-104
ISSN: 2250-6101
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REVISTA DE ENSEÑANZA DE LA FÍSICA, Vol. 33, no. 2 (2021) 97
La evaluación del presente artículo estuvo a cargo de la organización de la XIV Conferencia Interamericana de Educación en Física
Laboratório de ciências em uma
escola técnica na perspectiva dos
professores
Science laboratory in a technical school from
teachers' perspective
Niomar Bolano Jalhium
1
* y Fernanda Catia Bozelli
2
1
Faculdade de Ciências, Programa de Pós-Graduação em Educação para a Ciência, Universidade Estadual Paulista, Av.
Eng. Luiz Edmundo Carrijo Coube, 14-01, Vargem Limpa, CEP 17033-360, Bauru, São Paulo, Brasil.
2
Faculdade de Engenharia, Departamento de Física e Química, Universidade Estadual Paulista. Avenida Brasil, 56,
Centro, CEP: 15385-000, Ilha Solteira, São Paulo, Brasil.
*E-mail: nb.jalhium@unesp.br
Recibido el 1 de junio de 2021 | Aceptado el 1 de septiembre de 2021
Resumo
O que revelou o processo de organização, por professores e membros da gestão escolar, de um laboratório de Ciências uma escola
técnica? Que possibilidades e desafios se mostraram aos participantes diante da busca por promover atividades experimentais a
alunos do ensino médio de uma escola em que os laboratórios existentes são de natureza técnica? De natureza qualitativa, a
pesquisa foi realizada em uma das escolas técnica do estado de São Paulo, Brasil, e contou com a participação de professores que
lecionavam as disciplinas de Física, Biologia, Química, Matemática, professor coordenador pedagógico e o diretor da escola. Por
meio de questionário, gravação em áudio e documentos, a pesquisa revelou que ainda é necessário enfrentar o desafio de superar
a necessidade de um espaço físico para a realização das atividades experimentais; que estas continuam assumindo uma função
motivadora para as aulas e que estas concepções estão fortemente relacionadas a formação do professor e sua experiência; que
possibilidades para o desenvolvimento de atividades experimentais de Ciências em escolas técnicas a partir da integração do
núcleo gestor, pedagógico e docente, independente do apoio de políticas educacionais e sistemas de ensino.
Palavras-chave: Ensino de ciências; Laboratório didático; Ensino médio; Ensino técnico.
Abstract
What did the organization process, by teachers and members of school management, reveal from a Science laboratory to a
technical school? What possibilities and challenges were shown to the participants in the search to promote experimental activities
for high school students in a school where the existing laboratories are of a technical nature? Qualitative in nature, the research
was carried out in one of the technical schools in the state of São Paulo, Brazil, and had the participation of teachers who taught
the subjects of Physics, Biology, Chemistry, Mathematics, a pedagogical coordinator teacher and the school director. Through a
questionnaire, audio recording and documents, the research revealed that it is still necessary to face the challenge of overcoming
the need for a physical space to carry out the experimental activities; that these continue to play a motivating role for the classes
and that these conceptions are strongly related to teacher education and experience; that there are possibilities for the
development of experimental Science activities in technical schools from the integration of the managerial, pedagogical and
teaching nucleus, regardless of the support of educational policies and teaching systems.
Keywords: Science teaching; Didactic laboratory; High school; Technical education and teaching.
Laboratório de ciências em uma escola técnica
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I. INTRODUÇÃO
Na escola técnica, o ensino médio pode ser oferecido separadamente ou integrado a um curso profissionalizante e
quando se fala em laboratório este fica articulado, praticamente, aos espaços de formação profissional. Ou seja,
prevalece a concepção do laboratório como espaço de preparação profissional e do estudante como obtendo uma
formação estritamente técnica. É muito comum encontrar leituras e boletins de escolas técnicas que emitem notícias
ou informes dos cursos profissionalizantes e sua capacidade de formação amparados no discurso de formação de
profissionais técnicos para trabalharem na empresa que forneceu o laboratório.
Segundo De Hollanda Cavalcanti e Queiroz (2018), o ensino médio no Brasil sempre viveu um dilema entre a
formação técnica, profissional (a formação para o trabalho) e a generalista (humanista, propedêutica). Para os
autores, esta oposição ainda não foi superada, mesmo diante do conhecimento de que a técnica (e embutida nela à
ciência) não se opõe ao humanismo.
Essa discussão se amplia ao pensar sobre a concepção de atividades experimentais, do trabalho prático, que baliza
os laboratórios das escolas técnicas e sua relação com a formação do estudante do ensino médio ou do ensino médio
integrado ao técnico. Há que se ter distinção entre a atividade prática que se realizada em um laboratório de formação
profissional técnica e o laboratório de Ciências? Qual é a relevância de atividades práticas experimentais para o ensino
de Ciências, para as disciplinas de natureza científica, para estudantes que cursam ao mesmo tempo o ensino médio
integrado ao técnico? Segundo Hodson (1994), o trabalho experimental deve estimular o desenvolvimento conceitual
fazendo com que os estudantes explorem, elaborem e supervisionem suas ideias, comparando-as com a ideia
científica, pois assim essas ideias terão papel importante no desenvolvimento cognitivo. Segundo Suart e
Marcondes (2009, p. 51),
se uma aula experimental for organizada de forma a colocar o aluno diante de uma situação problema, e estiver direcionada
para a sua resolução, poderá contribuir para o aluno raciocinar logicamente sobre a situação e apresentar argumentos na
tentativa de analisar os dados e apresentar uma conclusão plausível. Se o estudante tiver a oportunidade de acompanhar
e interpretar as etapas da investigação, ele possivelmente será capaz de elaborar hipóteses, testá-las e discuti-las,
aprendendo sobre os fenômenos estudados e os conceitos que os explicam, alcançando os objetivos de uma aula
experimental, a qual privilegia o desenvolvimento de habilidades cognitivas e o raciocínio lógico.
Ainda, pesquisas mostram que os estudantes desenvolvem melhor sua compreensão conceitual e aprendem mais
acerca da natureza das ciências quando participam de investigações científicas, por oportunizarem espaços de apoio
para reflexão ((Hodson, 1994; Axt, 1991; Porto, Ramos, Goulart, 2009). De acordo com Porto, Ramos e Goulart (2009),
sendo o ensino de Ciências um dos pilares para a educação não se pode separar formação científica de formação para
a cidadania. Embora os conhecimentos científicos aconteçam de diversas formas e em ambientes diversos é na escola
que os conceitos científicos são normalmente introduzidos e sistematizados (Porto; Ramos; Goulart, 2009 apud
Oliveira, 2018).
Para Barolli (1998), o laboratório de ciências possibilita uma leitura das especificidades dos estudantes no trabalho
em grupo. Essa dinâmica interativa influencia a maneira com que o conhecimento fluirá num laboratório didático.
Para Leite (2000), por meio das atividades laboratoriais os alunos chegam a desenvolver aspectos e características
essenciais em sua formação como: desenvolvimento do raciocínio crítico, motivação, aprendizagem dos conceitos,
das técnicas, da metodologia científica, criatividade e muitas outras. Outra questão levantada pela autora é o reforço
na conceituação dos temas abordados durante as atividades laboratoriais, e como esses momentos são importantes
para a construção e trabalho com as concepções alternativas existentes nos alunos previamente aos trabalhos
desenvolvidos.
Na pesquisa realizada por Bueno et al. (2004), os professores ao serem questionados sobre a função e a
importância da experimentação na Ciência ressaltam que existem três tipos básicos: as de cunho epistemológico, que
assumem que a experimentação serve para comprovar a teoria revelando a visão tradicional de ciências; as de cunho
cognitivo, que supõem que as atividades experimentais podem facilitar a compreensão do conteúdo; e as de cunho
moto-vocacional, que acreditam que as aulas práticas ajudam a despertar a curiosidade ou o interesse pelo estudo.
Para Gonçalves e Galliazzi (2004) a experimentação ainda possui uma visão simplista em virtude de poucas
discussões, compreendida e desenvolvida como forma de demonstrar teorias estabelecidas. Nesse sentido, os autores
destacam que é preciso superar as visões simplistas sobre a natureza da Ciência se pretendemos enriquecer o
conhecimento dos participantes da Licenciatura em Ciências sobre experimentação”, que expressa as concepções que
influenciam o modo de compreensão dos estudantes. Diante desta problemática, Gonçalves e Galiazzi (2004)
defendem que
se a natureza da Ciência e das atividades experimentais como ações pedagógicas precisam ser problematizadas na
formação permanente de professores de Ciências, a relação entre teoria e experimentação também caminha na mesma
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direção, pois predomina entre os formadores uma visão simplista e dicotômica das duas atividades. Esse aspecto, a
separação entre teoria e prática, precisa ser criticado, pois os experimentos não são realizados em um “vácuo teórico” como
propunham os empiristas-indutivistas ao defender a observação como fonte de todo o conhecimento. (Gonçalves e
Galiazzi, 2004, p. 239)
Nesse sentido, uma atividade experimental não deve ser compreendida como a mera aplicação prática dos
conceitos que são abordados em sala. No ensino de Física o contato com experimentos é muito importante, uma vez
que eles possibilitam, por meio de metodologia investigativa, que os alunos compreendam melhor os conceitos e
teorias que foram tratados durante as aulas teóricas (Barolli, 1998).
Para Laburú (2006), o ponto central de estudos por meio de experimento é a motivação dos alunos a aprenderem
o ensino de Ciências, com aulas interessantes, traduzindo toda relação do aluno a aprender o saber ensinado, do saber
do sujeito com o mundo, consigo mesmo e com o outro.
De acordo com Borges (2002), os professores de ciências, independente dos níveis de ensino, em geral, acreditam
que a sua melhoria passa pela introdução de aulas práticas no currículo. No entanto, quando se analise as condições
para que tais atividades sejam desenvolvidas, o autor ressalta que:
várias escolas dispõem de alguns equipamentos e laboratórios que, no entanto, por várias razões, nunca são utilizados,
dentre às quais cabe mencionar o fato de não existirem atividades preparadas para o uso do professor; falta de recursos
para compra de componentes e materiais de reposição; falta de tempo do professor para planejar a realização de atividades
como parte do seu programa de ensino; laboratório fechado e sem manutenção. [...] Muitos professores até se dispõem a
enfrentar isso, improvisando aulas práticas e demonstrações com materiais caseiros, mas acabam se cansando dessa tarefa
inglória, especialmente em vista dos parcos resultados que alcançam. (Borges et al., 2002, p. 294)
Contudo, como afirma Borges (2002) “É um equívoco corriqueiro” confundir atividades práticas com a necessidade
de um ambiente com equipamentos especiais para a realização de trabalhos experimentais, uma vez que podem ser
desenvolvidas em qualquer sala de aula, sem a necessidade de instrumentos ou aparelhos sofisticados.
Dessa forma, é inadmissível não aceitar a importância do laboratório de ciências, das atividades práticas
experimentais e seu papel na formação do aluno, mas ao mesmo tempo, também, a evidência da complexidade que
está ao entorno destas na prática pedagógica do professor, nas suas diferentes concepções e na estrutura escolar
como um todo. Tal complexidade acaba se estendendo quando se pensa neste laboratório de ciências no âmbito da
escola técnica.
Diante do exposto, quando se fala em ensino médio integrado ao curso técnico, o que acaba prevalecendo são os
laboratórios profissionais, ou seja, as disciplinas de núcleo comum do currículo dos cursos profissionalizantes, as de
natureza básica, quase não são lembradas, bem como os laboratórios de ciências. Nesse sentido, o que revelou o
processo de organização, por professores e membros da gestão escolar, de um laboratório de Ciências uma escola
técnica? Que possibilidades e desafios mostraram-se aos participantes diante da busca por promover atividades
experimentais a alunos do ensino médio de uma escola em que os laboratórios já existentes são de natureza técnica?
II. ATIVIDADES EXPERIMENTAIS E LABORATÓRIO DE CIÊNCIAS
O interesse dos pesquisadores ao longo dos anos acerca do estudo das atividades experimentais e o laboratório de
Ciências no processo de ensino e aprendizagem tem revelado aspectos importantes e que mostram o quanto ainda
precisamos compreender sobre essa temática. Suart e Marcondes (2009) lembram que com o advento do
construtivismo, últimos 30 anos, a participação do aluno como construtor do conhecimento e o professor como
mediador e facilitador, a experimentação se tornou investigativa possibilitando um avanço para o aprendizado
tornando o aluno mais ativo, promovendo a oportunidade de discutir, elaborar hipóteses, aprender com a teoria dos
fenômenos estudados, fazendo com que viesse a desenvolver suas habilidades cognitivas e raciocínio lógico. Ainda, o
ambiente mais informal do laboratório, se comparado com a sala de aula, contribui para interações mais construtivas
entre os alunos e estes com o professor criando um ambiente de aprendizagem mais positivo (Hofstein e Lunetta,
2004 apud Stuart, Marcondes, 2009).
Nesse sentido, Borges (2002) salienta que os professores acreditam que com a inserção de algumas atividades
práticas poderá haver uma melhora no ensino. Reforça, ainda, que, mesmo havendo escolas que dispõem de um
espaço de laboratório, elas não o utilizam por diversos motivos, dentre eles por não existirem atividades prontas
para o seu uso e a dificuldade em conseguirem recursos para a compra de materiais. Ou seja, ter um espaço físico de
laboratório não quer dizer que será utilizado e nem que será utilizado de forma a promover competências e
habilidades em torno de dimensões epistemológicas e cognitivas.
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Alves Filho (2000) ao discorrer sobre o Laboratório Didático, enfatiza suas funções, prioridade no método
experimental no processo de ensino e aprendizagem, a importância para o fazer e o aprender, a maneira como essa
valorização do laboratório se perdeu ao longo do tempo e como resgatá-la. Destaca que, desde o ensino médio ao
universitário, iniciando na década de 1970 até a de 1980, o laboratório é visto como a solução de problemas, por
muitos autores. No artigo, discorrem, ainda, sobre como atividades experimentais investigativas promovem situações
atípicas, as quais assombram a previsão perfeita que deveriam trazer antes da concretização do ato de pesquisar.
A motivação também é posta em discussão pelos autores, os quais explicam que muitos discursos de motivação
pelas atividades experimentais foram sustentados pelo empirismo-indutivismo, em que a aprendizagem “ocorria pela
descoberta, através da repetição de um experimento” (Gonçalves e Galiazzi, 2004, p.243). Assim, uma das críticas
elencadas pelos autores é o pequeno número de alunos que segue profissões científicas. O trabalho também
apresenta uma discussão sobre o discurso de professores de Ciências sobre a ausência da experimentação em sala de
aula, elencando considerações como a precariedade de infraestrutura devido à falta de materiais e espaço físico
adequado. Ou seja, os resultados evidenciam uma concepção muito comum entre os professores de Ciências, a
necessidade de espaço físico específico para a realização de atividades experimentais.
III. METODOLOGIA DA PESQUISA
Esta pesquisa insere-se no âmbito das denominadas pesquisas sociais, as quais, segundo Flick (2013), abordam
questões de maneira sistemática, acima de tudo empíricas, com levantamento de dados utilizando determinados
métodos; podendo os resultados serem generalizados além da situação, exemplos estudados possibilitando
explanações e descrições do fenômeno estudado.
A pesquisa foi realizada no contexto de uma escola técnica de ensino médio integrado ao ensino técnico no interior
do estado de São Paulo, Brasil. Esta escola faz parte de uma autarquia do Governo do Estado de São Paulo, vinculada
à Secretaria de Desenvolvimento Econômico, e que espresente em 368 municípios, perfazendo um total de 223
Escolas Técnicas e 73 Faculdades de Tecnologia estaduais, com mais de 322 mil alunos em cursos técnicos de nível
médio e superior tecnológicos. Este sistema de ensino, desde a sua criação, esteve voltado para atender à necessidade
de mão de obra local e regional, o qual sempre coadunou com a principal finalidade das escolas técnicas, uma
educação direcionada para o mundo do trabalho.
A escola técnica em que a pesquisa foi realizada oferece dois (02) dos 33 cursos técnicos integrados ao ensino
médio do estado de São Paulo. Em 2012, a modalidade integrada ficou conhecida como Ensino Técnico Integrado ao
Médio em Informática (ETIM) e a escola passou a oferecer: ensino médio; Habilitação Profissional de Técnico em
Administração, em Informática, em Logística, em Nutrição e Dietética, em Contabilidade; Habilitação Profissional
técnica de nível médio de Técnico em Informática para Internet e Ensino Técnico Integrado ao Médio em Informática.
Sendo de natureza técnica, os laboratórios oferecidos sempre atuaram em função da formação profissional
oferecida. No entanto, com o oferecimento do ensino médio e o desejo do diretor da escola em ter um espaço para o
desenvolvimento de atividades experimentais, que proporcionasse aos estudantes construírem uma melhor
articulação entre teoria e prática, que possibilitasse uma formação científica, que os despertasse para pensar a relação
entre a Ciência e as questões sociais fez com que, no ano de 2018, fosse iniciada, pela primeira vez, a experiência de
organizar o laboratório de Ciências na escola. Essa primeira experiência ocorreu de forma multidisciplinar, sendo as
atividades experimentais desenvolvidas no âmbito das disciplinas ainda de maneira muito isolada. Já no ano de 2019,
o laboratório foi novamente repensado por professores e gestores a partir do desenvolvimento de projetos
interdisciplinares. Participaram do projeto do laboratório de Ciências a professora de Química (P1), o professor de
Biologia (P2), o professor de Física (P3), a professora de nutrição, que atuou durante um período na coordenação
pedagógica (P4), a professora de matemática, que substituiu a coordenadora pedagógica anterior (P5) e o diretor da
escola (P6). Todos estes foram considerados participantes nesta pesquisa por estarem diretamente ligados ao
laboratório de Ciências e ao desenvolvimento de atividades experimentais.
A pesquisa foi inicialmente pensada para fazer uso de entrevista semiestruturada como instrumento de registro
de dados. Contudo, com o advento da pandemia provocada pela covid-19, as perguntas foram encaminhadas aos
participantes, após uma reunião on-line via aplicativo do Google meet, que entenderam ser melhor responderem
dentro de um prazo estipulado e posterior devolução. Dessa forma, a entrevista acabou sendo alterada para
questionário e, além das respostas ao questionário, os dados também foram constituídos por meio de documentos e
gravação em áudio de reunião realizada no início da pesquisa sobre a organização do laboratório de Ciências.
Os dados foram organizados e sistematizados por meio da Análise de Conteúdo, segundo Moraes (1999). Essa
forma de sistematizar os dados tem sido muito utilizada em abordagens qualitativas fazendo uso da indução e a
intuição como estratégias para que sejam atingidos níveis de compreensão em que se propõe o aprofundamento do
que é investigado.
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É uma ferramenta, um guia prático para a ação, sempre renovada em função dos problemas cada vez mais diversificados
que se propõe a investigar. Pode-se considerá-la como um único instrumento, mas marcado por uma grande variedade de
formas e adaptável a um campo de aplicação muito vasto, qual seja a comunicação. [...] é uma técnica para ler e interpretar
o conteúdo de toda classe de documentos, que analisados adequadamente nos abrem as portas ao conhecimento de
aspectos e fenômenos da vida social de outro modo inacessíveis. (Moraes, 1999, p. 8)
O referencial orienta a organização dos dados partindo da realização de cinco etapas, que são: 1. Preparação das
informações; 2. Unitarização ou transformação do conteúdo em unidades; 3. Categorização ou classificação das
unidades em categorias; 4. Descrição; 5. Interpretação. Após as etapas de preparação e unitarização foi possível
realizar o processo de codificação por meio da criação de códigos que pudessem auxiliar a reconhecer os elementos,
indicadores que dialogassem com o que é buscado nesta pesquisa, ou seja, compreender as possibilidades e os
desafios revelados pelos professores e gestores acerca do desenvolvimento de atividades experimentais a partir da
implantação de um laboratório de Ciências em uma escola técnica. Desse modo, as categorias que foram emergindo
dos dados procurando trazer à tona aspectos importantes que dialogassem com o problema de pesquisa, foram: 1.
Sobre ter um laboratório de ciências em uma escola técnica; 2. Relação entre a necessidade de estrutura física e a
realização de atividades experimentais; 3. Atividades experimentais e a prática pedagógica do professor; 4. Formação
do professor para atuação em atividades experimentais.
Por uma questão de espaço, será aqui apresentado e discutido os dados referentes a transcrição da gravação de
áudio da reunião realizada para pensar a organização do laboratório de Ciências. Os participantes da reunião foram:
P2; a pesquisadora, P3, P1 e P4. As etapas de descrição e interpretação abordarão as categorias 1 e 2 de um total de
cinco categorias organizadas na pesquisa.
IV. ANÁLISE DOS DADOS
A. Sobre ter um laboratório de ciências em uma escola técnica
Como explicitado anteriormente, as escolas técnicas possuem laboratórios de formação profissional articulados aos
cursos de formação técnica. No entanto, a partir do oferecimento do ensino médio e do ensino técnico integrado ao
ensino médio e considerando a formação do aluno do ensino médio, é possível verificar que a ideia de criação de um
laboratório didático de ciências partiu da gestão da escola, por meio do diretor e da coordenação pedagógica.
P5: É um projeto que foi um sonho da maioria da equipe gestora e dos professores. [...] começou-se com um trabalho (2018)
que foi denominado como um projeto de laboratório multidisciplinar. [...] E para esse ano (2019) estamos com uma
proposta de continuidade desse laboratório multidisciplinar, mas com uma inovação que é um desafio para maioria das
escolas, que é de promover a interdisciplinaridade entre seus componentes da área de ciências. [...] É uma novidade, mas
também é um sonho [...] nós conseguimos que todos comprassem a ideia aqui e fica muito mais fácil e gostosa de
trabalhar. […] o aluno se encantou por esse espaço, ele se encantou por coisas pequenas que foram desenvolvidas para ele,
foi muito, então isso eu tiro uma aprendizagem que a gente pode muito mais, porque se foi proporcionado muito pouco e
para eles foi muito, significa que a gente tem um grande caminho a percorrer.
Importante destacar as palavras “sonho” e “desafio” sendo colocadas ao mesmo tempo e como condição de
implantação não pela escola técnica, mas por outras escolas de outras naturezas também. De acordo com dados
do Anuário Brasileiro da Educação 2020 (Todos pela educação, 2020), no Ensino médio apenas 48% das escolas
possuem laboratórios. Ainda, o que se mostra como “sonho” e “desafio” é a realização de atividades experimentais
de forma interdisciplinar, o que envolve pensar a articulação entre os conhecimentos disciplinares, mas acima de tudo
entre os professores, o que fica evidente no trecho “nós conseguimos que todos comprassem a ideia aqui e fica
muito mais fácil e gostoso de trabalhar”, “a gente tem um grande caminho a percorrer”, o que caracteriza também a
preocupação da gestora quanto a ter que implantar algo na escola sem a participação e aceitação dos professores, o
que não seria fácil e não seria “gostoso”. Outra escuta possível a partir da fala da coordenadora aos professores é que
não se precisa de muito para ter o espaço e desenvolver as atividades, visto que os alunos se encantam “por coisas
pequenas”, o muito pouco “para eles foi muito”.
A coordenadora pedagógica, P5, realça a relação do espaço e dos materiais para o início das atividades. P2, no
entanto, relaciona a atividade experimental como uma nova forma de estudar, além da sala de aula. Mas ir além da
sala de aula não significa ir para outro espaço de sala da escola, como um laboratório? P2 dá a entender, que não
necessariamente seria ter o laboratório para se fazer atividades experimentais.
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B. Relação entre a necessidade de estrutura física e a realização de atividades experimentais
A discussão sobre a necessidade de ter um espaço físico equipado e adequado para a realização de atividades
experimentais, um laboratório, tem sido objeto de investigação ao longo dos estudos sobre essa temática.
Pesquisadores têm identificado nos diferentes discursos que há vários problemas encontrados para a implantação de
um laboratório de ciências, entre eles ter os materiais de consumo, equipamentos e a estrutura física adequada (Axt,
1991; Zanon, Uhmann, 2000; Gonçalvez, Galiazzi, 2004).
Segundo Amaral (1997), na década de 90, por meio de reflexão e revisão reconhece o contexto do laboratório de
ciências como sendo epistemológico e pedagógico e isso faz com que se reflita sobre o laboratório de ciências não
somente como sendo uma questão de estrutura física e organizacional. Para Gonçalvez e Galiazzi (2004), o aluno não
é um cientista e, dessa forma, é preciso pensar sobre o quanto se torna relevante um espaço físico e estruturado para
o desenvolvimento das atividades experimentais face ao objetivo de proporcionar a discussão sobre ciência, teoria e
prática, o papel do experimento na formação dos alunos, etc. Essa concepção é corroborada por Oliveira (2018, p.
111) ao trazer que “para as escolas que não têm laboratório de ciências, o ideal é selecionar atividades experimentais
para serem trabalhadas na sala de aula”.
P5: Essa escola havia uma estrutura, houve um laboratório muito tempo atrás e houve esse desejo de reativar o
espaço que tem um significado na vida do aluno, a questão do protagonismo do aluno. Então nós conseguimos reestruturar
o ambiente. [...] No primeiro momento, para gente construir uma proposta significativa para os alunos, trabalhar temas do
cotidiano, que possam ser trazidos para sala de aula e sendo enriquecido nesse espaço com a utilização desses professores.
[…] Para isso temos a professora P1 [Professora de Química] que vai ficar responsável por esse espaço, né, em termos de
organização, manutenção e monitoramento, juntamente comigo dessas ações […] nós vamos estruturar isso para ser
trabalhado com a teoria em sala de aula, com a prática no laboratório e a prática fora, no espaço exterior. Para gente
desenvolver isso, lembrando assim a gente precisa organizar tudo isso e como temos um espaço que não é tão grande, nós
vamos precisar dividir, onde de 40 alunos, 20 vão desenvolver alguma prática relacionada à proposta.
P2: mais esse projeto que vamos dar continuidade e vai acontecer, podem ser auxiliados através na parte de biologia, por
exemplo nós temos microscópios, [...] num ambiente que graças a Deus a escola tem, concorda P1?
P1: Concordo plenamente.
No discurso da coordenadora pedagógica, P5, a escola possui um espaço de laboratório e que este precisa ser
reativado” e que este tem um significado na vida do aluno, a questão do protagonismo do aluno. É muito
importante verificar que o laboratório e, por conseguinte, a realização de atividades experimentais são importantes e
significativas para os alunos, pois, como ressalta Galvão e Assis (2019, p. 16) tal prática contribui para o
desenvolvimento de habilidades cognitivas pelos alunos, pois há a inserção dos mesmos em um ambiente com
características próximas às da cultura científica”.
A importância dada a organização da estrutura física, do espaço, é reforçada pela designação da professora de
Química (P1) como sendo a responsável, inclusive pelo monitoramento” juntamente com a coordenadora. Também
pela preocupação com a organização dos alunos no espaço ao trazer: a gente precisa organizar tudo isso e como
temos um espaço que não é tão grande, nós vamos precisar dividir”. P2 e P1 concordam com a relevância do espaço
físico e chegam a destacar, P2, alguns equipamentos que este possui, como o “microscópio”.
Mas ao mesmo tempo que há essa valorização do espaço físico, é extremamente importante verificar que este se
amplia para o exterior da escola, possibilitando a prática dialogando com o cotidiano, o contexto dos alunos. De
acordo com Reginaldo, Sheid e Güllich (2012) as atividades práticas podem possibilitar a aprendizagem, indo além do
conteúdo presente nos livros didáticos, pois, neste, a ciência se resume a conceitos e teorias, impossibilitando a
contextualização e a identificação do conteúdo no universo do aluno tendendo a ser esquecido.
V. CONCLUSÕES
Esta pesquisa foi motivada diante da preocupação de uma das autoras que leciona em uma escola técnica a mais de
30 anos e que vivenciava as atividades experimentais e o laboratório apenas nas componentes curriculares de
natureza técnica.
Os dados mostram que, mesmo que as pesquisas revelem que atividades experimentais não necessitam
especificamente de um espaço específico para serem realizadas, há a concepção da necessidade de um espaço físico
para a realização das atividades experimentais podendo, estas, serem ampliadas para a realização em ambientes
externos à escola, ao ar livre integrando ambiente de convivência dos alunos.
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Mesmo sabendo que uma quantidade significativa de escolas de educação básica não possui laboratório de
Ciências, essa realidade se mostra ainda mais difícil em escolas de natureza técnica, devido a sua natureza com foco
na formação técnica. Isso se revela para os participantes como um “sonho”, que é possível mediante a participação e
colaboração de todos, quanto um desafio, uma vez que fica implícito que não basta ter um espaço, como é possível
verificar por meio do termo reativada”. O espaço sempre esteve ali, mas o que faz com seja utilizado, esteja ativo?
Será que o fato de ter vindo como uma iniciativa da equipe gestora, de início, fez toda a diferença? Se não tivesse o
espaço, o laboratório teria sido pensado como sendo possível na escola técnica?
A atividade experimental assume uma função motivadora para as aulas de Ciências em que a formação do
professor ainda é um desafio para a concretização de aulas experimentais em função de sua formação inicial e da
concepção que orienta sua prática pedagógica, o que pode ser verificado no trecho nós vamos estruturar isso para
ser trabalhado com a teoria em sala de aula, com a prática no laboratório e a prática fora”, o que pode revelar
desafios.
A pesquisa indica possibilidades à medida que reforça a importância da integração do núcleo gestor, pedagógico
e docente para este fim; sem que para isso se deposite esperanças em diretorias de ensino, políticas públicas, que são
imprescindíveis, mas que podem ou não ser concretizadas.
AGRADECIMENTOS
Agradecemos ao Programa de Pós-Graduação em Educação para a Ciência pelo apoio à pesquisa realizada por meio
do Projeto n.º 1029/2020 AUXPE - Processo 8881.593352/2020-01 - PROAP/2020.
REFERÊNCIAS
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Borges, A. T. (2002). Novos rumos para o laboratório escolar de ciências. Caderno Brasileiro de Ensino de Física, 19(3),
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