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Recial Vol. XIII. N° 22 (Julio-Diciembre, 2022) ISSN 2718-658X. Carla Dameane, Bruno
Machado, Traduzindo Ñi Pu Tremen, Mis Antepasados (2008), Da Companhia Kimvn Teatro Documental: Um
Estudo Sobre a História e a Resistência Mapuche. pp. 148-160.
restringindo a transmissão oral dos conteúdos fundamentais somente aos membros oficiais ou
outros mapuches que se sobressaem como portadores da tradição religiosa; e (2) bloqueando o
acesso e a compreensão aos não-mapuche (Grebe Vicuña, 1998, p. 60)
Um período histórico bastante decisivo para os mapuche ocorreu no fim do século XIX,
quando o então Estado Chileno contraria os acordos feitos com eles pela coroa espanhola, e
sob influência de uma forte ideologia extrativista e exploratória, provoca a conhecida guerra
de Ocupação da Araucanía (1860-1883), dando início à uma intensa onda de descriminação em
torno do povo mapuche, que segue resistindo contra ações militares “anti-terroristas” que visam
suprimir os movimentos mapuche e campesino que reivindicam os direitos da comunidade.
Em decorrência desse conflito, os mapuche, com parte de suas terras usurpadas e sem muitos
direitos garantidos, acabam realizando um intenso processo de êxodo rural ao longo do século
XX, que perdura até os dias atuais. As tentativas de aculturação, junto aos demais problemas
sócio-políticos, representam as principais causas para o silenciamento e apagamento dos
costumes mapuche, sua língua, religião, métodos de subsistência e costumes em geral estão
todos ameaçados por esse intenso e histórico processo (Grebe Vicuña, 1998, p. 56).
Contudo, descendentes de mapuche nascidos em Santiago, têm colaborado com um
movimento de revitalização e preservação da história e cultura do povo mapuche através
mecanismos outros, além dos tradicionais, um exemplo desse caso é o grupo de Teatro
KIMVN, estudado neste trabalho. Através da prática do Teatro Documental, o grupo realiza
um resgate de relatos e memórias coletivas junto ao povo mapuche, onde a encenação é
mesclada ao registro histórico desses acontecimentos, posicionamentos e opiniões a fim de
preservá-los e em muitos casos ressignificar o que foi posto enquanto verdade pela
historiografia ocidentalizada, atrelada ao Estado Chileno. Cabe ainda assinalar que, ao integrar
as variadas formas de linguagem, como a música, as artes visuais e a fotografia, a companhia
KIMVN, nesta perspectiva, dialoga com meios de produção artísticos ancestrais, através do
uso de instrumentos e música mapuche e de uma performatividade cênica relacionada às
práticas culturais e rituais mapuche.
A peça Ñi pu tremen: mis antepasados é dirigida pela fundadora do Grupo de Teatro
KIMVN, que também assina a dramaturgia documental da obra. Trata-se de um texto
dramático espetacular composto por um conjunto de relatos de senhoras mapuche, tendo um
elenco total de 14 mulheres da comunidade Petu Moguelein Mawidache e do clube de idosas
Flor do Inverno, ambos da comuna de El Bosque, em Santiago do Chile. Nessa apresentação
narram-se fragmentos de história de vida enquanto um testemunho da memória de um país,
acompanhados de uma musicalidade inspirada no resgate do patrimônio imaterial do povo
Mapuche (González Seguel, 2018, p. 41).
Os relatos que podemos acessar, a partir de Ñi pu tremen Mis Antepassados são testemunhos
de enorme importância para a preservação da história e da cultura mapuche. Segundo a própria
Paula González Seguel:
El teatro documental me ha permitido mirar, resignificar y reconocer mi propia
historia en otras y en otros de la mano de los dramaturgos Marisol Vega Medina
y David Arancibia Urzúa, la música de Evelyn, más las voces de mujeres
mapuche de distintas generaciones. (2018, p. 26).