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REFLETINDO SOBRE AS RAZÕES DA DIVERSIFICAÇÃO INSTITUCIONAL DAS UNIVERSIDADES ESTATAIS BRASILEIRAS
João dos Reis Silva Júnior1
Daniel Schugurensky2
Resumo
O artigo busca compreender o processo de diversificação institucional das universidades estatais brasileiras como parte do processo de expansão da educação superior brasileira. A hipótese trabalhada consiste em que ambos os processos são a expressão da reforma do Estado Brasileiro em curso desde a década de 1990 que foi exigida em razão da aderência do Brasil ao processo de globalização, considerando, especialmente as históricas desigualdades regionais do país e seu novo lugar na economia mundial.
Resumen
El artículo busca entender el proceso de diversificación institucional de las universidades estatales de Brasil como parte de la expansión del proceso de la educación superior brasileña. La hipótesis es que ambos procesos son la expresión de la reforma del Estado brasileño en marcha desde la década de 1990 que era necesaria debido a la adhesión de Brasil al proceso de globalización, teniendo en cuenta especialmente las históricas desigualdades regionales del país y su nuevo lugar en la economía mundial. Palabras clave: Diversificación Institucional; La expansión de la Universidad Estatal; La reproducción social.
Abstract
The article seeks to understand the process of institutional diversification of Brazilian state universities as part of the expansion process of Brazilian higher education. The hypothesis is that both processes are the expression of the Brazilian state reform under way since the 1990s that was required due to the adherence of Brazil to the globalization process, considering especially the historical regional inequalities in the country and its new place in the world economy.
Keywords: Institutional Diversification; Expansion of State University; Social reproduction.
1Professor do Departamento de Educação e do Programa de
2Professor na School of Social Transformation e na School of Public Affairs/Arizona State University. Email: dschugur@asu.edu
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Introdução
O trânsito da década de 1980 para a de 1990 é um marco histórico de lento e profundo processo de mudanças estruturais na cultura institucional da universidade estatal no país. Este processo é consequência de escolhas e decisões de natureza econômica e políticas tomadas de forma deliberada; e conscientemente assumidas pelos governos dos três últimos presidentes do Brasil no período de 1995 a 2013; e que produziu peculiar diversificação na forma de existência das universidades estatais brasileiras. Sobre as raízes desse processo é possível propor algumas hipóteses e demarcar, de forma nítida, alguns períodos que o compuseram ao longo do tempo.
Este período pode ser dividido em três etapas segundo suas especificidades quanto aos
elementos que foram delineando a diversificação institucional, bem como suas razões econômicas e políticas. Ao assumir esta subdivisão deste longo período em três momentos que foram mostrando a tendência das mudanças dessa instituição republicana, antevemos a diversificação e seus motivos.
A primeira se constituiu na demanda econômica imposta ao país em face de sua aderência à globalização gerada pelo predomínio do capital financeiro. Ela se expressa e exige a reforma do aparelho do Estado e da universidade estatal brasileira. São reformas institucionais da universidade estatal liderada pelo Ministério da Administração Federal e da Reforma do Estado (MARE), em que os policymakers brasileiros produziram a institucionalidade para o exigido alinhamento do país ao movimento realizado no nível mundial. Nesse momento histórico o capitalismo experimentava a transição do
regime de acumulação monopolista para o de Predominância Financeira, tendo provocado significativa ruptura na história recente do país.
A reforma do aparelho do Estado é o resultado da mudança dos fundamentos econômicos brasileiros e marco institucional de
mudança das instituições republicanas brasileiras. Herança marcada pelo projeto de país buscado desde o golpe militar de 1964 e realizado com eficiência por Fernando Henrique Cardoso (FHC).
Desta matriz da reforma estatal, outras decorreram que alcançaram, mas não de modo imediato, as mais diversas instâncias, órgãos estatais e instituições republicanas em geral e, em particular, a instituição universitária estatal. Dentre os traços característicos dessa cultura institucional universitária,
caso Europeu a acentuação ocorreu especialmente com o Processo de Bolonha. Mas, que consistia em processo consolidado no Canadá e nos Estados Unidos da América. Esta segunda fase
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Lula fizera a opção de acentuar a continuidade do projeto institucionalizado por FHC em vez de buscar outro caminho em que a ruptura tivesse algum lugar.
Todavia, ainda na gestão de Lula, é possível apontar um terceiro momento desse processo de mudanças na universidade estatal, marcado pela emergência de programas com forte potência de mudança institucional. Este conjunto tem como principais pilares o Programa de Apoio ao Plano de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI), a Educação a Distância (EAD), a Universidade Aberta do Brasil (UAB), a continuidade da expansão da
Quanto à
Este movimento
opostos e complementares: a qualificação em massa no âmbito de graduação (exceto as áreas de ciência, tecnologia, engenharia e matemática)
ede
com raros momentos mais significativos como, por exemplo, o REUNI3.
3 Em reportagem do jornal Folha de S. Paulo (Terceira fase de expansão da rede federal inclui quatro universidades, 47 campi universitários e 208 institutos de educação, ciência e tecnologia), a presidente Dilma Rousseff anunciava que “A interiorização do desenvolvimento econômico e social é o principal norteador da terceira fase de expansão da rede de ensino e pesquisa federal, que deverá abrir 250 mil vagas de ingresso nas universidades federais e de 600 mil matrículas nos institutos federais de educação, ciência e tecnologia, em 2014. Além de democratizar o acesso ao
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De acordo com os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2009 (PNAD, 2010), com referência à relação entre escolarização e renda familiar, as Regiões Norte e Nordeste apresentam os piores índices em termos de defasagem educacional de alunos pobres, com idades entre 15 e 24 anos – em termos percentuais, o total de alunos que cursam o ensino médio na Região Norte atinge a 45%, enquanto que na Região Nordeste, 41%. Estes índices, quando comparados à Região Sudeste, com aproximadamente 60,5% para a mesma faixa etária, indicam a desigualdade entre os estados da federação brasileira que se encontram distantes ou próximos dos centros econômico-
conhecimento, os projetos estão integrados aos Arranjos Produtivos Locais e aos grandes investimentos industriais e de infraestrutura, de modo a qualificar profissionais e desenvolver tecnologias necessárias ao progresso com distribuição de renda”.
No final dos anos 1980 e início dos 1990 era possível afirmar, com algum grau de idealização, que o centro da cultura da universidade estatal
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dada às históricas diferenças regionais do país, como é produzida uma rica diversificação institucional. Tais mudanças reproduzem as perversas diferenças regionais. A real diferenciação institucional encontra sua base na história específica do Brasil, reproduz esta especificidade e se apresenta muito variada e com vocação regional. No âmbito político, as universidades federais (UFs) e seu processo de diversificação
Na sequência de nossa exposição busca- se mostrar de que forma
A expansão da educação superior brasileira
Segundo a Sinopse Estatística da Educação Superior (2011),
das IES públicas
4 Período em que se viu anômala aceleração no setor das instituições federais desde a implantação do REUNI, da EAD e a UAB.
ao início da ditadura
Tal processo acentua ainda mais a diversificação institucional da educação superior brasileira.
“(...)
No início da gestão de Lula, a turbulência econômica e os ruídos da mudança
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de governo colocaram no centro das atenções da administração petista as políticas econômicas, e o crescimento das instituições em geral sofreu redução de aproximadamente 39%. Contudo, a menor expansão do número de instituições
As Universidades Federais
Os indicadores relacionados à expansão do número de instituições estatais federais e outros tipos institucionais neste campo alcançam um percentual próximo de 55%, enquanto suas matrículas cresceram 70% no período
“relativos ao aumento dos corpos docente e
5 Os dados aqui apresentados são referentes ao período em questão, porém a tendência por eles mostrada permaneceu e outras medidas semelhantes as que levaram a esta curva foram tomadas, destaco no governo de Dilma Rousseff o programa de criação dos Institutos Federais de Ciência, Educação e Tecnologia que, com vocação regional,
reforçam o significado dessa expansão que, como já se verificou, apesar de significativa,
Esta curva apresenta a mesma característica desde 1995, quando FHC tornou- se o presidente. Isto nos permite a comparação entre seus governos e os de Lula.
Durante os oito anos em que FHC esteve na presidência, o número de universidades e matrículas
instituições republicanas, portanto das universidades estatais. Durante os anos de Lula há uma tendência de atendimento das demandas sociais na forma de políticas focais e ações
afirmativas. Porém, a aderência à predominância financeira se mantém com Lula, o REUNI é criado por esta medida compensatória, o trabalho docente é intensificado e precarizado ainda mais. (Cf. Sguissardi; Silva Jr, 2009, Silva Jr, 2011 e Silva Jr, 2014)
Assim se pode explicar esta aparente positividade da política de expansão do ex- presidente Lula. Neste momento há uma estratégia de manutenção dos compromissos com a mudança estrutural operada durante a presidência de FHC e a busca de trazer à cena política a grande maioria da sociedade brasileira
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que se encontrava abaixo da linha da pobreza.6 Os créditos políticos e ideológicos são muito bons para Lula e o Partido dos Trabalhadores. Neste momento as IFs jogaram um papel fundamental.
Tendências da
Os rumos da
6 A continuidade do projeto para o país produzido durante o governo de FHC já se anuncia mesmo antes de Lula assumir a presidência do país, ainda na condição de presidente eleito. Matias Spektor, em trabalho de 2014, com consistente base empírica mostra em seu livro 18 dias – quando Lula e FHC se uniram para conquistar o apoio de Bush o esforço conjunto de toda esfera diplomática do governo de FHC e todos que iriam compor esta mesma área no governo Lula para buscar credibilidade do país diante da desconfiança demonstrada pelo
Castro, estabeleceu um grupo esquerdista, antiglobalizante, chamado Fórum São Paulo”. Em acréscimo Henry Hyde presidente da Comissão de Relações exteriores da Câmara dos Deputados dos Estados Unidos acentuou a ameaça: “Há uma chance real de que Fidel Castro, Hugo Chávez e Lula da Silva possam constituir um eixo do mal nas Américas”. O resultado desse esforço foi a reunião realizada na Casa Branca entre George W. Bush, Fernando Henrique Cardoso e Lula da Silva. De pronto Lula obteve o apoio de Bush e se comprometeu em continuar com o modelo econômico produzido e institucionalizado durante os oito anos de governo de FHC, que se acabavam, deixando, contudo, a herança para Lula.
aplicada voltada para a inovação como centro viria modificar toda a cultura da universidade e as diversas dimensões institucionais, além de contribuir para o estabelecimento do ranking das universidades, estabelecer a concorrência entre elas e neste processo
Estas direções podem ser vistas como política de Estado no Plano Nacional para a
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agregação de valor ao capital financeiro e a governabilidade possível em razão da produção de nova sociabilidade para o que a educação, particularmente a superior, é central.
Este Plano vem a ser a adoção de uma política de Estado que visa a criação, por meio de políticas públicas na forma de planos e programas com vistas à integração, de um Plano Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, interligado a um Programa Nacional de
E, por outro lado, num ótimo destino para o investimento externo direto (IED), além de excelente praça bursátil. A outra face deste movimento consiste no novo lugar econômico e social da universidade estatal e suas novas funções nestas esferas.
A análise fundamentada do PNPG
O social é tratado ao longo do plano como algo que diz respeito diretamente à sociedade; no entanto, quando analisado com minudência,
diminuição do fosso entre o nível cultural dos vários segmentos que integram a população brasileira é também ponto da referida pauta, contrastando com as metas de um país que pretende alçar um melhor posicionamento no mercado mundial de capitais para
eda
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) há muito vem mostrando o aumento da expectativa de vida do brasileiro. Tendência histórica boa, porém de difícil gestão e entendimento. E, portanto, um largo campo de investigação necessária para a formulação de políticas segundo o novo projeto de país inaugurado durante a presidência de FHC. Por isso é possível destacar os programas na área da saúde, pois com o aumento da expectativa de vida é importante manter uma população ativamente produtiva:
“Atenção às atuais gerações de crianças e jovens, particularmente nas áreas de saúde e educação em ações voltadas para o ensino básico e superior com a participação da PG, pois dependerá dessas gerações o desempenho da economia brasileira nas próximas décadas, como membros da população em idade ativa, em um contexto de rápido crescimento, em termos absolutos e relativos, e de forte aumento da população idosa.” (Brasil, 2010, p.294)
A investigação aplicada e a necessária inovação exigida pelo novo modelo econômico consistem no núcleo do programa e fornecem o paradigma para a mudança da universidade
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estatal. Este núcleo opera e guia o conjunto dos objetivos em torno do SNPG – daí o papel de destaque à
“O núcleo da
O sistema de avaliação ou de regulação da
tecnologia, matemática e engenharia, predominantemente orientados pela economia. Desta forma, os mestres, doutores que se formam passam a ser formados segundo um
homogêneo método de produção do conhecimento.
OPNPG
“No topo do sistema estão as universidades humboldtianas, conhecidas por patrocinarem a união indissolúvel do ensino e da pesquisa, com a
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extremo, a necessidade de formar quadros e técnicos altamente especializados para os setores público e privado. Em consequência, será preciso criar mais de um sistema de avaliação e depurar diferentes critérios de teor acadêmico e não acadêmico, ajustados para as diferentes situações e necessidades, como no mestrado profissional.” (Brasil, 2010, p.128)
Épossível observar a indicação de mudanças no sistema de avaliação da pós- graduação que tenham critérios diferenciados, levando em consideração a natureza dos programas: acadêmicos ou aplicados. Mudança desta envergadura exigiria a adoção de outros critérios em face do atual sistema de avaliação da CAPES, vigente a partir de 1997, que recai sobre a combinação de indicadores acadêmicos (produção de livros, papers, dissertações, teses, etc.), baseados em aspectos quantitativos (Brasil, 2011, p.126), não comportando mais a complexidade que a
Ao lado da expansão já analisada, a internacionalização da educação superior aparece como a outra dimensão deste mesmo processo. Em razão da necessidade das instituições acadêmicas de peso nos Estados Unidos da América e na Europa de estar no processo de venda de seus serviços dada a delicada situação econômica de tais instituições7. Mas, não só. Também em razão da
7 A Lei
necessidade de elevar e reformular o intelecto social dos países emergentes. Estas economias centrais, vale lembrar, fazem dos emergentes uma plataforma de produção de valor para a dominância de seu capital financeiro. Por hipótese isso poderia explicar o grande aumento da mobilidade acadêmica mundial de alunos de graduação, de
laboratórios nas universidades estatais brasileiras, produzindo sua pauta de pesquisa e acentuando a diversificação institucional. (Brasil, 2010,
A internacionalização via cooperação internacional tem sua maior expressão no programa do governo federal “Ciência sem Fronteiras8”, para promover a consolidação, expansão e internacionalização da ciência, tecnologia e inovação da competitividade brasileira por meio do intercâmbio e da
título em qualquer patente emitida para essas invenções. Antes deste ato, o governo manteve a posse de todas as patentes concedidas usando dinheiro do governo. O governo também manteve o direito de licenciar as invenções para o setor privado, o que fez de forma não exclusiva. (Levenson, 2005) (Tradução livre do original em inglês feita pelo autor).
8 Em 25/01/2011 o presidente Barack Obama anunciou, em discurso do Estado, a importância da relação bilateral
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mobilidade internacional entre alunos de graduação e
O que se pode dizer sobre a pós- graduação neste espaço: a mostra como principal agente institucional de mudança nas universidades brasileiras. Vale destacar que, já em 2009, Sguissardi; Silva Júnior apresentavam, neste livro a tese de que a reforma universitária brasileira teria na
Buscando entender a expansão no contexto da mundialização económica
Esse movimento de expansão da educação superior, nos termos expostos anteriormente, pode ser explicado não apenas com base no processo econômico, mas também
no político e no social. No regime de acumulação com a predominância financeira, o capital monetário parece adquirir autonomia absoluta em relação à produção real do valor (primeiro ciclo de movimentação do capital).
A predominância financeira poderia ser assim explicada: a economia produtora de riqueza com base no tempo de trabalho humano
uma dívida. Este investimento ou endividamento movimenta a economia real, que produzirá com base nos recursos naturais e no tempo de trabalho humano, o lucro real, que pagaria o capital fictício e mais o lucro operacional.
Não é difícil deduzir como são importantes a ciência e as instituições que a produzem e, notadamente, a educação, com o trabalho dos professores na docência em todos os níveis. No âmbito da produção científica, os professores pesquisadores das universidades públicas têm sua pesquisa pautada de fora da universidade e conforme um fazer científico próximo da economia. Neste movimento a universidade é permeada pelo tempo econômico e não o da produção de conhecimento.
Este processo produziu mudanças estruturais nas universidades públicas e privadas, impulsionando, de forma mercantil e
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mundializada a expansão da educação superior brasileira.
Nesse contexto a educação se torna um espaço social estratégico para a produção do valor, financiada pelo fundo público (sua privatização/mercantilização internacionalizad a) e focada na profissionalização, em razão da infinitésima diferença entre ciência, tecnologia e inovações tecnológicas que se elaboram quase em tempo real no mundo todo. A reengenharia – as novas formas de organização e do trabalho –
Capital financeiro, Reforma do Estado e a expansão da educação superior no Brasil
O início da consolidação da predominância da valorização financeira pode
ser considerado na década de 1980 que assistiu o processo de mundialização do IED, que experimenta então significativo aumento. No entanto, para além dos aspectos quantitativos do IED na economia mundial, são seus aspectos qualitativos os que mais nos interessam aqui. Para Chesnais (1996), citando Henri Bourguinat, são quatro as principais razões desse movimento:
“Em primeiro lugar, diferentemente do comércio exterior, o IED „não tem uma natureza de liquidez imediata [...] ou diferida [...]‟. Não se reduz a uma transação pontual. Pelo contrário, sua segunda característica é introduzir uma „dimensão intertemporal‟ de grande importância, pois a „decisão de implantação dá origem a fluxos (produção, comércio, repatriação de lucros) que se estendem, necessariamente, por vários longos períodos‟. A terceira particularidade é „implicar transferências de direitos patrimoniais e, portanto, de poder econômico, sem medida comum à simples exportação‟. Finalmente, diz Bourguinat, „existe um componente estratégico evidente na decisão de investimento da companhia‟. (...) „Não somente seu horizonte é sensivelmente mais amplo, como também as motivações subjacentes são muito mais ricas (...) a ideia de penetração, seja para depois esvaziar os concorrentes locais, seja para ‘sugar’ as tecnologias locais, [e a produção de conhecimento em lugares que extrapolam a sede do grupo industrial] faz parte desse aspecto estratégico do investimento direto e, geralmente, está inserido num processo complexo de tentar antecipar as ações e reações dos concorrentes”. (Chesnais, 1996, p. 54, grifos do autor em itálico e nossos em negrito).
A predominância financeira afeta as relações entre os ciclos de movimentação do
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capital, impondo formas diversas de organização e introdução de grupos predominantemente industriais (GPIs)9 em novo lugar na economia mundial. A função financeira
Na predominância financeira, o ciclo do capital portador de juros é dominante e possui dupla dimensão; econômica e jurídica. Tal ciclo exerce uma compressão sobre os demais, colocando em intensa movimentação o capital em funções (circulação de mercadorias) que, por sua vez, impõem a intensificação do trabalho no âmbito do ciclo de produção real de valor e em todos os setores que a ele se vinculam (Harvey, 1994).
9 Os grupos predominantemente industriais consistem num “conjunto formado por uma
Nesse contexto de mundialização da economia, tendo como estratégia central a necessidade da produção do capital produtivo, mas, sobretudo, as novas formas de obtenção de
estruturas corporativas, novas formas organizativas e de gestão, assentadas em nova base produtiva, possibilitadas, nesse último caso, pelas atuais tecnologias produzidas no âmbito da terceira revolução tecnológica. Portanto, impõe ao Estado o desenho de políticas para pesquisa e formação de mão de obra nas universidades, tarefa hercúlea depois da adesão brasileira aos imperativos da acumulação financeira desde pelo menos o início da década de 1990. (PAULANI, 2008) Afirma Chesnais (1996) que há a emergência de um novo estilo de empresa, em cujo centro
Este movimento produzirá profundos processos de mudanças na esfera educacional, particularmente na educação superior. Assim, a expansão nesse domínio e sua respectiva cultura institucional são afetadas pela mundialização e financeirização do processo de acumulação de capital, implicando mudanças nos princípios expressos em seus pressupostos formativos.
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reducionista, predominantemente profissional izante, realizada através de uma lógica privatista (ou mercantilizada) voltada ao mercado. (Cf. Silva Júnior; Spears, 2012)
O início deste processo demanda a institucionalização que se realizou no início dos anos 1990, quando Fernando Henrique Cardoso assume cargos relevantes no aparelho de Estado, bem como no primeiro período aqui delineado sob a presidência de FHC.
Segundo Paulani e Oliveira (2007) haveria uma histórica mudança no binômio
“O conceito de periferia depende da existência do
Consequentemente, a reforma do aparelho estatal, iniciada no Brasil em 1995, carrega consigo esta racionalidade, cuja matriz, aqui referida, foi trazida pela predominância
financeira. Tem origem um novo paradigma, em que as políticas se orientam pela mesma matriz teórica, política e ideológica do Estado já reformado. Esta concepção embasou as reformas das demais instituições republicanas, especificamente, no caso em tela, a reforma da universidade estatal brasileira. Aqui se busca justificar que se tomou como campo privilegiado de análise o conjunto de universidades federais por ser ele o setor educacional público institucionalmente mais próximo (e suscetível) às políticas derivadas de um Estado que se tornou instrumento de produção num país cuja nação se desnacionalizou. Contudo, ainda que com mediações, dadas as alterações ocorridas na CAPES, no CNPq e na Financiadora de Estudos e Projetos - FINEP, tais mudanças tendem a se realizar na universidade estatal brasileira como um todo.
Conclusão
A análise das razões que levaram à recente expansão e diversificação da educação superior no Brasil é notório desafio. Considerar a educação, tomando como referência as especificidades da história brasileira que se expressa, entre outros fatores, nas agudas diferenças regionais, propicia base para uma análise mais precisa do presente movimento educacional, em especial quanto à suposta qualificação em massa realizada pelos vários programas focais aqui mencionados.
As cisões educacionais apontadas neste texto acabam por referendar uma divisão de classes bastante rígida no que se refere à formação na educação superior, que poderia assim ser caracterizada: às classes dominantes, uma educação voltada à pesquisa aplicada e ao
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saber científico empirista; às classes subalternas, uma educação de cunho profissional, atendendo às demandas imediatas do mercado de trabalho. Particularmente quanto
àformação dos trabalhadores, a certificação acaba por exemplificar iniciativas para tal fim.
O Programa Universidade para Todos (ProUni), o REUNI, os mestrados e doutorados profissionalizantes, o Programa de Financia mento Estudantil (FIES) para este tipo de pós- graduação, a tentativa de transferir a educação superior para o âmbito do Ministério da Ciência
e Tecnologia (MCT), atendem às recomendações de organismos internacionais e às reivindicações empresariais quanto à qualificação de trabalhadores para o exercício de suas funções em um cenário de constantes transformações tecnológicas na produção industrial, motivadas pela mercantilização do conhecimento e pela busca do aumento das inovações e dos ganhos financeiros.
As políticas compensatórias ganharam ênfase, legitimadas pelo alto índice de analfabetos funcionais e pela escolaridade brasileira historicamente baixa.
legitimou discursos com aparência transformadora, mas cuja essência é profundamente conservadora. Essa política compensatória exige indagações básicas, envolvendo a efetividade do entendimento do desemprego como um fenômeno conjuntural: tais políticas conseguirão enfrentar os aspectos estruturais do desemprego através da qualificação profissional e da evolução das condições gerais de produção real do valor? Como equacionar a precarização da formação e
do exercício da profissão dos professores na educação superior?
A primeira indicação sugere que o capital fictício posto em ação de forma internacionalizada submete a economia brasileira, de grande potencial interno de acumulação e, portanto, de atrativo interesse econômico, fazendo do país uma excelente praça bursátil. A educação superior, como espaço estratégico da construção social, não haveria de ficar incólume aos desdobramentos deste processo e sua diversificação, como parte da expansão orientada pela economia se faz com intensidade e acentua e reproduz as diferenças regionais.
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