INTEGRACIÓN Y CONOCIMIENTO

N° 6

 

ISSN 2347 - 0658

Vol. 1 Año 2017

 

 

LA CALIDAD EUROPEA DE LA EDUCACIÓN EN LA LITERATURA BRASILEÑA

Mary Ane de Souza1

Universidade Federal da Grande Dourados maryanesouza@live.com

Giselle Cristina Martin Real2

Universidade Federal da Grande Dourados gisellereal@ufgd.edu.br

RECIBIDO: 26/06/201

ACEPTADO: 14/03/2017

RESUMEN

El trabajo se propone explorar la noción de calidad educativa en el diseño elaborado por el Proceso de Bolonia, de acuerdo con la literatura brasileña que estudia dicho proceso. En particular, se analizará el concepto de calidad en el sistema de evaluación de la educación superior que fue adoptado por el Proceso de Bolonia en el contexto del Espacio Europeo de Educación Superior (EESS). En este sentido, se tiene como un problema de investigación guía la siguiente pregunta: ¿Cuál es el concepto de calidad implícita del sistema de evaluación desarrollado

1Mestranda da linha de Políticas e gestão da educação do programa de Pós-Graduação da Universidade Federal da Grande Dourados – UFGD.

2Atualmente é professora adjunta da Universidade Federal da Grande Dourados, atuando na graduação e na pós- graduação stricto sensu.

en el Proceso de Bolonia, de acuerdo con la

 

literatura publicada en Brasil? Para responder a

 

esta pregunta, se utilizó como metodología de

 

investigación la investigación bibliográfica, con la

 

contribución de la base de datos de Scientific

 

Electronic Library Online (SciELO) y también el

 

análisis del documento “Criterios y Directrices

 

para la Garantía de Calidad en el Espacio

 

Europeo de Educación Superior”, desarrollado

 

por The European Association for Quality

 

Assurance in Higher Education (ENQA). Del

 

estudio se puede observar que la literatura, así

 

como el documento elaborado por la ENQA

 

sugieren que los parámetros evaluativos tienen

 

raíces positivistas y tiene un perfil tecnocrático y

 

de gestión que muestra las características

 

comerciales.

 

Palabras clave: Proceso de Bolonia. Educación

 

superior. Evaluación

 

A QUALIDADE EUROPEIA DE

 

EDUCAÇÃO NA LITERATURA

236

BRASILEIRA

 

RESUMO

 

 

O trabalho tenciona explorar a noção de

 

qualidade educativa no desenho elaborado pelo

 

Processo de Bolonha, de acordo com a literatura

 

brasileira que estuda dito processo. Em particular,

 

será analisado o conceito de qualidade no sistema

 

de avaliação da educação superior que foi

 

adotado pelo Processo de Bolonha no contexto

 

do Espaço Europeu de Educação Superior

 

(EEES). Nesse sentido, tem-se como problema

 

norteador de pesquisa a seguinte questão: Qual a

 

concepção de qualidade implícita ao sistema de

 

avaliação desenvolvido no Processo de Bolonha,

 

segundo a bibliografia divulgada no Brasil? Para

 

responder a essa questão, utilizou-se como

 

metodologia de investigação a pesquisa

 

bibliográfica, tendo como aporte a base de dados

 

Scientific Electronic Library Online3 (SciELO) e

 

também a análise do documento “Criterios y

 

Directrices para la Garantía de Calidad en el

 

Espacio Europeo de Educación Superior”

 

desenvolvido pela The European Association for

 

 

 

 

3 O site da SciELO: <http://www.scielo.br/>.

 

INTEGRACIÓN Y CONOCIMIENTO

N° 6

 

ISSN 2347 - 0658

Vol. 1 Año 2017

 

 

Quality Assurance in Higher Education (ENQA). A partir do estudo pode-se observar que a literatura, como também o documento produzido pela ENQA apontam que os parâmetros avaliativos possuem raízes positivistas e tem um perfil tecnocrático e gerencialista evidenciando as características mercantis.

Palavras-chave: Processo de Bolonha. Educação Superior. Avaliação.

THE EUROPEAN QUALITY OF EDUCATION IN BRAZILIAN LITERATURE

ABSTRACT

The work aims to bring reflections present in education literature known in Brazil that analyzes the design quality constructed by the Bologna Process, with discussions and reflections on the supranational concept of quality of higher education present in the evaluation system adopted by Process Bologna, in the context of the European Higher Education Area (EEES). In this sense, it has as a guiding research problem

the following question: What is the concept of implicit quality of the assessment system developed in the Bologna Process, according to literature published in Brazil? To answer this question, was used the bibliographical research as methodology, with the contribution the database Scientific Electronic Library Online (SciELO) and also the analysis of the document " Criterios y Directrices para la Garantía de Calidad en el Espacio Europeo de Educación Superior” developed by The European Association for Quality Assurance in Higher Education (ENQA). From the study it can be observed that literature, as well as the document produced by ENQA suggest that the evaluative parameters have positivist roots and has a technocratic and managerial profile showing the commercial characteristics.

Keywords: Bologna Process. Higher education. Evaluation.

INTRODUÇÃO

O presente trabalho apresenta discussões e reflexões sobre a concepção supranacional de qualidade na educação superior presente no sistema de avaliação adotado pelo Processo de Bolonha, no contexto do Espaço Europeu de Educação Superior (EEES).

Esse tema ganha importância para a área educacional a partir dos processos de globalização, quando ocorrem mudanças estruturais na forma de interação mundial. Para Santos (2011), “os processos de globalização mostra-nos que estamos perante um fenômeno multifacetado com dimensões econômicas, sociais, políticas, culturais, religiosas e jurídicas interligadas de modo complexo” (p. 26).

Mais profundamente, Dale (2004) entende o fenômeno da globalização como “um conjunto de dispositivos político-

econômicos para a organização da economia 237 global, conduzido pela necessidade de manter

o sistema capitalista, mais do que qualquer outro conjunto de valores” (p.436).

Especificamente para a área educacional, Oliveira (2009) aponta quatro principais consequências provocadas pelo fenômeno da globalização, que são:

a)a crescente centralidade da educação

na discussão acerca do desenvolvimento e da preparação para o trabalho, decorrente das mudanças em curso na base técnica e no processo produtivo; b) a crescente introdução de tecnologias no processo educativo, por meio de softwares educativos e pelo recurso à educação a distância; c) a implementação de reformas educativas muito similares entre si na grande maioria dos países do mundo; d) a transformação da educação em objeto do interesse do grande capital,

ocasionando uma crescente comercialização do setor. (p.740)

INTEGRACIÓN Y CONOCIMIENTO

N° 6

 

ISSN 2347 - 0658

Vol. 1 Año 2017

 

 

Apartir dessas considerações pode-se observar que a literatura mencionada aponta a educação como fator de interligação com os aspectos econômicos e, portanto, adquire contornos de centralidade, passando a compor a agenda mundial global. Com outras palavras, Dale (2009) observa que a educação, particularmente em nível superior, vista pela

perspectiva dos novos modelos supranacionais, é alçada para o centro das decisões nacionais, mas suas significações tendem a se modificarem em coerência com a lógica da economia política global.

Nesse contexto, o EESS constitui-se em modelo a ser importado por outros blocos ao se criar o Processo de Bolonha (Robertson, 2009). Este Processo constitui-se em movimento de reforma da educação superior, iniciado a partir da assinatura e publicação da Declaração de Sorbonne em 1998, e da Declaração de Bolonha, em 1999 (Siebiger, 2013), que teve como uma de suas principais metas oferecer maior projeção econômica à Europa, nitidamente em uma tentativa de competição com o crescente poderio dos Estados Unidos. Nesse sentido, Robertson (2009) informa que:

O imperativo para a Europa progredir como um projeto político e econômico de modo mais geral, e como uma economia baseada no conhecimento mais especificamente, está ligado aos Estados Unidos e ao declínio da participação da Europa na produção mundial de bens. Por esse motivo, os Estados Unidos e a UE partilham um interesse comum na expansão da economia de serviços globais – incluindo a educação superior como um mercado, como um motor para a inovação e um setor-chave no desenvolvimento de novas formas de propriedade intelectual. (p.409)

Para tanto, o Processo de Bolonha para viabilizar atratividade para o seu espaço

educacional vai projetar um sistema de garantia de qualidade ativo para que seu sistema educacional possa ser reconhecido pelo conjunto dos países europeus e de outros países. Nesse sentido, vai atribuir à avaliação, particularmente à avaliação externa, a materialidade da qualidade pretendida para o EESS. (Siebiger, 2013; Hortale, Mora, 2004). Desta maneira, o Processo de Bolonha reestrutura o sistema educacional nos níveis institucional, nacional e supranacional de forma a instituir similaridades aos processos de acreditação, certificação, supervisão e reconhecimento de critérios e títulos.

Medidas similares podem ser

observadas no caso do Mercosul4, no

 

contexto latino-americano, em que a busca

 

pela qualidade da educação ganha ênfase no

 

processo de integração regional, por meio da

 

criação de mecanismos que permitam a

 

comparabilidade, a homogeneização e a

 

mobilidade acadêmica entre os distintos

 

sistemas nacionais de educação (Moura,

238

Serikawa, 2012; Azevedo, 2008).

Embora, Azevedo (2014), Santos e Donini, (2010) mostrem que a integração no Mercosul tem sido estimulada por atores sociais dominantes no campo econômico, a necessidade de uma integração educacional foi colocada em pauta ainda no ano de 1991 como ponto fundamental para que o sucesso e o desenvolvimento do processo integrativo econômico fossem possíveis (Santiago, Ranzi, 2010).

4 O Mercosul foi institucionalizado a partir da assinatura do Tratado de Assunção, em 26 de março de 1991, com o propósito de realizar a integração das economias nacionais da região da Argentina, Brasil, Paraguai e Bolívia. Atualmente o Mercosul tem como composição: Estados Partes: Argentina, Brasil, Paraguai, Uruguai (desde 26 de março de 1991) e Venezuela (desde 12 de agosto de 2012). Estado Parte em Processo de Adesão: Bolívia (desde 7 de dezembro de 2012). Estados Associados: Chile (desde 1996), Peru (desde 2003), Colômbia, Equador (desde 2004), Guiana e Suriname (ambos desde 2013). A exemplo da UE, o bloco tem o objetivo de desenvolver a competitividade dos setores econômicos e consolidar a integração política e social, fortalecendo os vínculos para melhorar a qualidade de vida países do Bloco.

INTEGRACIÓN Y CONOCIMIENTO

N° 6

 

ISSN 2347 - 0658

Vol. 1 Año 2017

 

 

Dessa forma, assim como no bloco Europeu, como no Mercosul, a qualidade da educação está intimamente ligada aos processos de integração regional, tornando-se indispensável para a formação de espaços supranacionais (Azevedo, 2009).

Entende-se que qualidade é um conceito de difícil definição, complexo, amplo e heterogêneo, que envolve uma série de posicionamentos distintos e muitas vezes contraditórios (Demo, 2002; Dias Sobrinho, 2008; Real, 2009; Sousa, 2009; Lamarra, 2010; 2012).

Para Enguita (1997), as concepções de qualidade invocam sucessivas realidades distintas e cambiantes. Primeiramente, perpassaram a ideia de dotação e investimento em recursos materiais e humanos, quanto mais recursos mais qualidade; depois envolveu a ideia de eficácia dos processos, em que se buscava o máximo de recursos com o mínimo de custo; e mais recentemente a qualidade é medida pelos resultados obtidos pelos estudantes em avaliações estandardizadas. É importante realçar que para o autor “cada nova versão da qualidade não substitui inteiramente e de uma vez por todas as anteriores: a nova versão afasta as antigas para o lado, mas tem de conviver com elas” (pp. 98-99).

Demo (2002) mostra que há uma qualidade formal e uma qualidade política. Qualidade formal diz respeito aos instrumentos e aos métodos, de teor mensurável, no sentido de perfeição metodológica, desprendida do conteúdo que busca qualificar. Já qualidade política refere- se às finalidades e aos conteúdos da vida humana. Está preocupada com a substância e não com a forma. Para Demo (2002) “Uma não é inferior à outra; apenas, cada uma delas tem perspectiva própria” (p.3).

Para Real (2009) não há uma única qualidade, mas sim um consenso que é construído na medida em que a política educacional formulada conjuga os interesses de setores e grupos acerca dos aspectos a serem alcançados. Para a autora, verifica-se,

na educação superior, “a convivência de concepções de qualidade retratando os

interesses distintos, conformando a diversificação e diferenciação de instituições de Ensino Superior” (p.576).

Com isso, observa-se que a literatura aponta para a existência de dois eixos que se interligam na constituição dos espaços supranacionais de educação superior. O primeiro refere-se à centralidade da qualidade, materializada nas avaliações externas. O segundo aponta para a complexidade da concepção desta qualidade, que é construída na conjugação de interesses distintos pelos setores e atores envolvidos,

especialmente considerando a competitividade que permeia a constituição desses espaços, onde são conjugados os interesses supranacionais e as práticas e memórias nacionais.

Diante da complexidade da temática, o problema que norteou a pesquisa pode ser sintetizado na seguinte questão: qual a

concepção de qualidade implícita ao sistema 239 de avaliação desenvolvido no Processo de Bolonha, segundo a bibliografia divulgada no Brasil?

Esse problema é relevante na medida em que o Processo de Bolonha se constitui como estratégia que busca influenciar outros espaços, inclusive o latino-americano em que se insere o Mercosul (Dale, 2009; Robertson, 2009; Krawczyk, Sandoval, 2012; Azevedo, 2009), tanto em sua estrutura, como nos aspectos referentes aos critérios para a garantia de qualidade interna e externa, revisão cíclica e o uso de agências de acreditação.

Em linhas gerais, o presente trabalho tem como objetivo explicitar a concepção de qualidade que vem sendo construída no contexto do Processo de Bolonha revelada pela literatura da área da educação difundida no Brasil.

Para tanto, utilizou-se como metodologia de investigação a pesquisa bibliográfica, tendo como aporte a base de

INTEGRACIÓN Y CONOCIMIENTO

N° 6

 

ISSN 2347 - 0658

Vol. 1 Año 2017

 

 

dados Scientific Electronic Library Online5 - SciELO, que disponibiliza, em meio digital, acesso aberto à artigos científicos, abrangendo ampla coleção selecionada de periódicos científicos, especialmente na área da educação. Cumpre destacar que a base SciELO é utilizada pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) do Ministério da Educação brasileiro como critério para a classificação dos periódicos científicos melhores qualificados no sistema de avaliação de periódicos identificado como Qualis6. A opção pela base eletrônica se justifica por ser guia privilegiado para difundir e ampliar o conhecimento, bem como por, atualmente, constituir-se no principal instrumento de consulta a periódicos científicos (Packer, 2014).

Também, utilizou-se de análise documental, a partir de informações da The European Association for Quality Assurance in Higher Education (ENQA). Optou-se por analisar o documento “Criterios y Directrices para la Garantía de Calidad en el Espacio Europeo de Educación Superior”, por entender que esse documento explicita a concepção de qualidade construída no interior do próprio Processo de Bolonha na medida em que é utilizado como instrumento do modelo de avaliação adotado, implicando, portanto, em mecanismos indutor da qualidade pretendida. Em outras palavras, o documento analisado se constitui como o instrumento adotado pelo Processo de Bolonha para medir e induzir a qualidade esperada para a educação superior europeia. Nesse sentido, esse instrumento materializa a concepção de qualidade construída pelo Processo de Bolonha.

5 O site da SciELO: <http://www.scielo.br/>.

6Nesse sentido ver documento de avaliação de periódicos da área de educação disponível no site da CAPES no

seguinteendereçoeletrônico:< https://docs.google.com/viewer?a=v&pid=sites&srcid=Y2 FwZXMuZ292LmJyfHRyaWVuYWwtMjAxM3xneDo0Mm M5NjRjOTAzNmYwOTlm >. Acesso realizado em: 14 nov. 2015.

Este estudo parte da abordagem

 

qualitativa, que como explica Minayo (2000)

 

se preocupa em quantificar os feitos, mas os

 

valoriza e os compreende nas relações sociais,

 

com uma postura que investiga o universo de

 

seus significados. Nesse sentido, é que busca

 

contextualizar os resultados do levantamento

 

bibliográfico com a análise de documento

 

produzido no âmbito do Processo de

 

Bolonha.

 

Diante do exposto dividiu-se o

 

trabalho em três seções. A primeira apresenta

 

resultados do estudo documental, a partir de

 

pesquisa realizada junto ao site da ENQA7,

 

quando se elegeu, como material privilegiante

 

para a compreensão dessa questão, o

 

documento “Criterios y Directrices para la

 

Garantía de Calidad en El Espacio Europeo

 

de Educación Superior”. A segunda trata das

 

análises acerca dos estudos científicos

 

pertinentes à temática publicados no SciELO.

 

A terceira seção é destinada à apresentação

 

da discussão e da reflexão desses estudos. Por

240

fim, apresentam-se alguns apontamentos

 

finais.

 

CONCEPÇÃO DE QUALIDADE NO PROCESSO DE BOLONHA

Para explicitar a concepção de qualidade da educação superior construída no Processo de Bolonha, tomou-se como documento norteador o material: “Criterios y Directrices para la Garantía de Calidad en el Espacio Europeo de Educación Superior” por se constituir como o conjunto de normas, procedimentos e orientações para a garantia de qualidade no âmbito dos países participantes, elaborado pela ENQA, a ser utilizado pelas instituições de educação superior, pelas agências avaliadoras e/ou pelos organismos de acreditação.

O documento apresenta como recomendações principais:

7 Endereço para consulta: http://www.enqa.eu/

INTEGRACIÓN Y CONOCIMIENTO

N° 6

 

ISSN 2347 - 0658

Vol. 1 Año 2017

 

 

Deberán existir criterios europeos para la garantía de calidad interna y externa y para las agencias externas de garantía de calidad.

Las agencias europeas de garantía de calidad deberán someterse a una revisión cíclica en el plazo de cinco años.

La subsidiariedad tendrá un papel fundamental, llevándose a cabo revisiones a nivel nacional en la medida de lo posible.

Se creará un Registro Europeo de agencias de garantía de calidad.

• Un

Comité del

Registro

Europeo

actuará

como

responsable de la inclusión de las agencias en el registro.

• Se establecerá un Foro Consultivo Europeo para la Garantía de Calidad en la Educación Superior. (ENQA, 2005, p.5)

A partir dessas recomendações o documento pretende melhorar a coerência da garantia de qualidade em todo o EEES, com o uso de critérios e diretrizes estabelecidos em conjunto com as instituições de educação superior, que poderão utilizar elementos comuns de referência para a garantia de qualidade.

O documento é dividido em quatro partes. A primeira mostra o contexto, objetivos e princípios que norteiam o informe. A segunda parte aponta os critérios e as diretrizes europeias para a garantia de qualidade, interna, externa e das agências, no contexto do EEES. A terceira aborda o sistema de revisão por pares para as agências de garantia de qualidade. Por fim, a quarta parte apresenta as perspectivas futuras lançadas pela ENQA.

A parte1 mostra que o documento de “Criterios y Directrices para la Garantía de Calidad en el Espacio Europeo de Educación Superior” foi construído a partir do

Comunicado de Berlim, em 2003, quando os ministros dos estados signatários da Declaração de Bolonha convidaram a ENQA. Isto teve como objetivo desenvolver um conjunto de critérios, procedimentos e diretrizes para a garantia de qualidade e ainda um sistema de revisão por pares, para as agências e organismos de acreditação, levando em consideração a experiência de outras associações e redes para a garantia de qualidade. Dessa forma, o trabalho envolve uma organização complexa com grupos de interesses distintos.

A garantia de qualidade é considerada uma preocupação dentro do EEES e a ENQA justifica essa preocupação pelo fato do crescente interesse mundial pela qualidade e pelos critérios que refletem a expansão da educação superior. Assim, as propostas contidas no documento se baseiam nos seguintes princípios:

• Los intereses de los estudiantes

241

así como los de los empleadores

y

los de la sociedad en general;

 

 

la gran importancia de la autonomía institucional, matizada por el reconocimiento de que esta conlleva grandes responsabilidades;

la necesidad de que la garantía externa de calidad se ajuste a sus propósitos y de encomendar a las instituciones únicamente la carga necesaria y apropiada para el logro de sus objetivos. (ENQA, 2005, p.10).

Percebe-se que os princípios norteadores para a garantia de qualidade na Europa preocupam-se com os interesses da

sociedade, dos estudantes e dos empregadores, sendo que esses últimos se constituem como representantes do mercado, o que explicita a lógica econômica e competitiva presente na criação do Processo de Bolonha, conforme apontado por Robertson (2009). Esse aspecto denuncia a

INTEGRACIÓN Y CONOCIMIENTO

N° 6

 

ISSN 2347 - 0658

Vol. 1 Año 2017

 

 

atenção especial às questões mercadológicas que a qualidade da educação pode oferecer, o que passa a explicitar que a concepção de qualidade que vem sendo construída parte de uma visão de qualidade formal, entendida no atendimento aos interesses do mercado. O documento quando vai mencionar a autonomia institucional, trata-a de maneira adjetivada com a expressão “matizada pelo reconhecimento de que esta carrega grandes responsabilidades”, sinalizando que a adesão ao coletivo viabiliza a divisão das responsabilidades, enquanto a autonomia,

sendo individualizada, carrega a responsabilidade pela decisão tomada.

Esses fatores incidem em uma visão formal de qualidade, pois se ancoram nos princípios do utilitarismo e pragmatismo do mercado e da divisão de responsabilidades viabilizada pelas decisões coletivas, em detrimento da autonomia institucional em

virtude de sua característica de individualidade.

A segunda parte do documento apresenta os critérios europeus para a garantia de qualidade interna, externa e para as agências de garantia externa de qualidade a serem aplicados a todas as instituições de educação superior e agências. Estas estão sintetizados no quadro 1. O informe mostra que a finalidade dos critérios é fornecer uma fonte de apoio e orientação para as

instituições e agências que estão desenvolvendo os seus próprios sistemas de garantia de qualidade, bem como contribuir para um quadro de referência comum. É importante enfatizar que o documento deixa claro que “En modo alguno se pretende que estos criterios y directrices dicten la práctica o se interpreten como obligatorias o inmodificables” (ENQA, 2005, p.13).

Quadro 1: Critérios Europeus para a garantia de qualidade interna, externa e para as agências de garantía

242

externa de qualidade.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Critérios para a garantia

Critérios para a garantia de

Critérios para as agências de

 

 

 

de qualidade interna

qualidade externa

garantia externa de

 

 

 

 

 

qualidade

 

 

 

Política e procedimentos

Utilização de procedimentos de

Utilização de procedimentos de

 

 

 

 

garantia interna de qualidade

garantia externa de qualidade

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Aprovação, controle e

Desenvolvimento de processos

Classificação oficial

 

 

 

revisão periódica de

de garantia externa de

 

 

 

 

programas e títulos

qualidade

 

 

 

 

Avaliação dos estudantes

Critérios para as decisões

Atividades regulares de garantia

 

 

 

 

 

de qualidade

 

 

 

Capacitação dos docentes

Processos adequados a seu

Recursos humanos e financeiros

 

 

 

 

propósito

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Recursos de aprendizagem e

Informes

Declaração da missão

 

 

 

apoio aos estudantes

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Sistemas de informação

Procedimentos de seguimento

Independência

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Informação pública

Revisões periódicas

Critérios e processos de garantia

 

 

 

 

 

externa de qualidade

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Análises de todo o sistema

Procedimentos de

 

 

 

 

 

responsabilidade

 

 

 

 

 

 

 

 

Fonte: Quadro elaborado a partir dos dados fornecidos pela ENQA.

INTEGRACIÓN Y CONOCIMIENTO

N° 6

 

ISSN 2347 - 0658

Vol. 1 Año 2017

 

 

Para a garantia de qualidade interna são apresentados sete critérios. Destaca-se que os critérios perpassam a esfera da instituição, estudantes e docentes, com critérios que vão desde a avaliação dos estudantes até a informação pública. Como política para a garantia de qualidade, a ENQA considera importante que a instituição se comprometa com o desenvolvimento da cultura para a promoção de qualidade. Para tanto, inclui uma relação de ensino e pesquisa dentro da instituição, a estrutura do sistema de garantia de qualidade, responsabilidades das instituições em relação às unidades de garantia da qualidade, participação dos estudantes e a forma como a política é implementada, monitorada e revisada.

No que se refere à garantia de qualidade externa são oferecidos oito critérios. É interessante ressaltar que o procedimento de garantia de qualidade externa deve analisar a eficácia dos processos de garantia de qualidade interna. A ENQA também considera como critério de qualidade a participação de todos os agentes, (incluindo instituições de ensino superior), no desenvolvimento de processos de garantia externa de qualidade e ainda que os critérios, para as tomadas de decisões, sejam publicados de modo explícito, com processos adequados aos seus objetivos, resultando informes claros e de fácil acesso, apontando as próximas etapas, os procedimentos de seguimento e também as análises de todo o sistema.

Para as agências de garantia externa de qualidade, são apontados 8 critérios. As agências devem levar em consideração a utilização dos procedimentos para a garantia externa de qualidade e ter uma revisão cíclica a cada cinco anos. Também é considerado como indicador de qualidade o cumprimento dos requisitos exigidos pela legislação responsável e ainda para serem de qualidade as agências devem ser responsáveis, consolidadas e independentes. Devem

desenvolver atividades referentes à avaliação, revisão, auditoria e valorização, contando com recursos humanos e financeiros. Levando em consideração a construção de critérios que incluem uma autoavaliação, avaliação externa, informe e processos de seguimento. Todos os critérios precisam estar disponíveis na web.

Pode-se observar a incidência do documento no critério voltado para o item “informação pública”. Isto aponta a necessidade da participação da comunidade externa no contexto da avaliação, seja interna ou externa. Nesse sentido, o documento explicita que todo o processo deve ser claro e de fácil acesso, inclusive os resultados da avaliação. Estes últimos devem estar disponíveis na web; dessa maneira seria, atualmente, a forma mais visível de garantir a informação e acompanhamento público.

Esses aspectos apontam para uma concepção

 

de qualidade formal, que medida pela

 

avaliação, esteja visível e exposta para a

243

comunidade externa, inclusive para o

 

mercado, usuário do serviço educacional.

 

Também, ao definir a periodicidade

 

quinquenal dos procedimentos de avaliação,

 

o documento traduz sua função indutora às

 

instituições. As quais, a partir desse processo,

 

devem buscar a melhoria da qualidade,

 

partindo

dos

resultados

obtidos

 

periodicamente

e,

particularmente,

 

considerando a ênfase na visibilidade que se

 

intenta produzir.

A parte três mostra a proposta de um sistema de revisão por pares para as agências acreditadoras. A ENQA recomenda que todas as agências sejam submetidas a uma revisão, externa cíclica, de seus processos e atividades com intervalos de cinco anos, levando em consideração os critérios contidos na parte dois do informe. Também

éproposto o registro das agências em funcionamento, divididas em dois setores: agências com revisão por pares e agências não revisadas. A ENQA também considera importante a construção de um Fórum

INTEGRACIÓN Y CONOCIMIENTO

N° 6

 

ISSN 2347 - 0658

Vol. 1 Año 2017

 

 

consultivo para a garantia de qualidade, que deve ter como base os acordos entre ENQA, European University Association (EUA), European Association of Institutions in

Higher Education (EURASHE), e a National Unions of Students in Europe (ESIB), e em longo prazo os representantes dos agentes socioeconômicos.

Nesse sentido, pode-se observar a complexidade do processo de avaliação da qualidade no contexto supranacional, considerando a conjugação dos interesses coletivos e individuais, o que demanda

constante discussão, reflexão e monitoramento. Para tanto, optou-se pela criação de estrutura complexa que envolve vários atores, especialmente, coletivos ao processo, o que caracteriza uma preocupação formal de qualidade.

A parte quatro apresenta algumas perspectivas a partir da implementação das propostas do relatório. Mostrando que para as reais mudanças a questão do tempo será imprescindível, considerando a aceitação das instituições. Segundo o relatório, “Hay mucho trabajo por delante para llevar a cabo las recomendaciones del informe y para asegurar la cultura de calidad que éstas conllevan” (ENQA, 2005, p. 37).

De forma geral, o documento elaborado pela ENQA explicita a avaliação como o principal mecanismo de garantia de qualidade para a educação superior. Este aponta a conjugação de instrumentos (avaliação interna e externa) e de atores (avaliação por pares, por discentes e pelos

empregadores dos egressos) como características necessárias ao processo a ser desenvolvido por instituições de educação superior e pelas agências avaliadoras. Dessa maneira explicita uma concepção formal de qualidade que vem sendo construída ao longo do processo.

PARÂMETROS PARA AS ANÁLISES DOS ESTUDOS PERTINENTES À TEMÁTICA

A partir do estudo e análise do

 

documento, “Criterios y Directrices para la

 

Garantía de Calidad en el Espacio Europeo

 

de Educación Superior”, pode-se entender

 

que a construção da concepção de qualidade

 

parte de uma concepção formal de qualidade,

 

que adota uma estrutura complexa. Esta

 

envolve tanto a avaliação interna, que deve

 

ter informação pública, quanto a avaliação

 

externa, tendo como parâmetro a avaliação

 

de pares. Todo esse processo é acompanhado

 

pela sociedade e mercado, o que pode ser

 

realizado pela web.

 

De forma geral, o documento indica

 

que o processo e os resultados devem ficar

 

acessíveis para toda a sociedade e mercado.

 

Embora os critérios definidos pela ENQA

 

não estejam focados no rendimento

 

estudantil, conforme apontado por Enguita,

 

os mesmos mantém a lógica formal de

 

construção de qualidade, uma vez que

 

priorizam a divulgação dos resultados ao

 

público externo, inclusive da avaliação

244

interna a ser realizada pelas instituições. A partir dessa ênfase, pode-se afirmar que o processo de avaliação construído no âmbito do EESS se caracteriza pela regulação do sistema. Dessa forma, este passa a requerer uma nova estrutura que envolve tanto instituições, agências e avaliadores externos no âmbito nacional, quanto organismos e agências supranacionais. Isto faz com que a concepção de avaliação, como instrumento de emancipação das instituições, fique relegada a segundo plano (Alfonso, 2000).

Nesse sentido é pertinente analisar os estudos que tratam desse contexto, com foco para os trabalhos que abordam a avaliação da educação superior no Processo de Bolonha, para uma melhor compreensão desse processo e suas implicações. Desse modo, a pesquisa tem como objetivo a identificação desses estudos no âmbito educacional. A pesquisa foi realizada tendo como foco empírico a base de dados SciElo, no período que envolveu o mês de maio de 2014.

10 trabalhos,

INTEGRACIÓN Y CONOCIMIENTO

N° 6

 

ISSN 2347 - 0658

Vol. 1 Año 2017

 

 

Como parâmetros para a busca dos artigos na temática sobre o Processo de Bolonha foram adotadas as seguintes palavras-chave: “Processo de Bolonha”, “Processo de Bolonha e Avaliação”,

“Processo de Bolonha e Educação superior” e “Processo de Bolonha e Educação”. Com a busca foi possível encontrar

listados no quadro 2:

Quadro 2: Levantamento bibliográfico sobre a qualidade no Processo de Bolonha

Autor

Título do trabalho

Ano

Revista de

 

 

publicação

 

 

 

 

 

 

 

Erichsen, Hans-Uwe.

Tendências européias na graduação e

2007

Sociologias

 

 

na garantia da qualidade.

 

 

 

 

 

 

 

 

O processo de Bolonha da Europa

 

 

 

 

Robertson, Susan L.

torna-se global: modelo, mercado,

2009

Rev. Bras. Educ

 

 

mobilidade, força intelectual ou

 

 

 

 

 

 

 

 

estratégia para construção do Estado?

 

 

 

 

 

Produtivismo acadêmico e

 

 

 

 

Bianchetti, Lucídio e Valle,

decorrências às condições de

2014

Ensaio:

 

 

Ione Ribeiro

vida/trabalho de pesquisadores

aval.pol.públ.Educ

 

 

 

 

 

 

brasileiros e europeus.

 

 

 

 

Wielewicki, Hamilton de

Internacionalização da educação

 

Ensaio:

 

 

Godoy e Oliveira, Marlize

2010

 

 

superior: processo de Bolonha.

aval.pol.públ.Educ.

 

 

Rubin

 

245

 

 

 

 

A formação de formadores no

 

 

 

 

 

contexto da transnacionalização

 

 

 

 

Silva, Luciana Leandro da.

educativa: reflexões a partir da

2013

Educ. Soc.

 

 

 

aplicação do processo de Bolonha em

 

 

 

 

 

Espanha e Portugal.

 

 

 

 

Borges, Maria Creusa de

Reforma da universidade no contexto

 

 

 

 

da integração europeia: o processo de

2013

Educ. Soc

 

 

Araújo.

 

 

Bolonha e seus desdobramentos.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

O processo de Bolonha e a

 

 

 

 

Bianchetti, Lucídio.

intensificação do trabalho na

2010

Educ. Soc.

 

 

universidade: entrevista com Josep M.

 

 

 

 

 

 

 

 

Blanch.

 

 

 

 

Morgado, José Carlos.

Processo de Bolonha e ensino superior

2009

Educ. Soc.

 

 

num mundo globalizado.

 

 

 

 

 

 

Almeida Júnior, Vicente de

Algumas características das políticas

 

 

 

 

de acreditação e avaliação da

 

 

 

 

Paula e Catani, Afrânio

2009

Avaliação

 

 

educação superior da

 

 

Mendes

 

 

 

 

Colômbia: interfaces com o Brasil.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

O processo de Bolonha, a avaliação da

 

 

 

 

Lima, Licínio C., Azevedo,

educação superior e algumas

2008

Avaliação

 

 

Mário Luiz Neves de e

considerações sobre a Universidade

 

 

 

 

 

 

Catani, Afrânio Mendes

Nova.

 

 

 

 

Fonte: Quadro construído pelas

autoras, tendo como fonte de consulta a base

de dados Scielo.

 

 

INTEGRACIÓN Y CONOCIMIENTO

N° 6

 

ISSN 2347 - 0658

Vol. 1 Año 2017

 

 

Nota-se que a produção referente ao Processo de Bolonha no SciELO é escassa, compreendendo apenas 10 trabalhos publicados entre os anos de 2007 a 2013. Os trabalhos de Robertson (2009); Morgado (2006) e Wielewicki; Oliveira (2010) tratam

dos contextos da globalização e internacionalização e suas implicações ao Processo de Bolonha. Nessa direção, Borges (2013), mostra os desdobramentos do Processo de Bolonha dentro da Universidade, enquanto Bianchetti (2010) e Bianchetti e Valle (2014) analisam as repercussões do acordo para a universidade no que se refere ao produtivismo acadêmico e sobre os trabalhos dos professores. Já Silva (2013) avalia a formação de professores no contexto da transnacionalização da educação na Europa. Também foi localizado o trabalho

de Almeida Jr e Catani (2009) que apresentam algumas características das políticas de acreditação e de avaliação da educação superior da Colômbia e suas

interfaces com o Brasil. O Processo de Bolonha é visto nesse trabalho como modelo

para as políticas educacionais no Mercosul. Destaca-se que apenas dois trabalhos

(Erichsen, 2007 e Lima Azevedo e Catani, 2008) estudam a avaliação, acreditação e concepções de qualidade no contexto do Processo de Bolonha. Nesse sentido, a estudo bibliográfico repousou-se nesses dois estudos. A partir disso, a seção seguinte mostrará as reflexões trazidas por esses autores sobre o espaço da educação superior em seus aspectos de qualidade construídos com o Processo de Bolonha.

REFLEXÕES SOBRE A CONCEPÇÃO DE QUALIDADE NO PROCESSO DE BOLONHA: O QUE A LITERATURA DIZ

O trabalho de Lima, Azevedo e Catani (2008) analisa o Processo de Bolonha, que se constitui em uma política educacional supranacional, comum aos estados-membros

da União Europeia, com vista à construção de um “espaço europeu de educação superior”. Também analisa as recentes transformações na educação superior no Brasil, em que o projeto da chamada “Universidade Nova” e o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das

Universidades Federais (REUNI) constituem-se nas manifestações mais claras do reordenamento desse nível de ensino.

Para Lima, Azevedo e Catani (2008) o Processo de Bolonha atribui grande importância para as questões relativas à garantia de qualidade. E por isso destacam a criação de um “sistema europeu de qualidade” que se subordinam a essas agências nacionais de avaliação e acreditação. “Tais agências poderão intervir em termos de avaliação, numa lógica de „melhoria da qualidade, e também em termos de acreditação, nesse caso mais numa „lógica de controle”. (Lima, Azevedo e Catani 2008, p.

17).

 

 

246

Os autores enfatizam que a

 

orientação dominante na avaliação é a do tipo

positivista,

competitiva,

devido

às

características mercantis que têm sido atribuídas à educação superior, em um contexto de globalização. O atual paradigma de universidade vem sendo substituído por um paradigma empresarial, nesse sentido a liberdade acadêmica é um obstáculo para a nova lógica da universidade. Nesse contexto de globalização e mercantilização da

educação podem-se compreender as propostas tecnocráticas e gerencialistas “no sentido de transformar as universidades em fundações de direito privado, dotadas de estruturas tipicamente empresariais, de que é exemplo recente, para o caso português, o relatório sobre o ensino superior elaborado pela OCDE (2006)” (Lima, Azevedo e Catani 2008, p.17).

Lima, Azevedo e Catani (2008), mostram que esse processo é uma defesa do modelo gerencialista para as universidades, “procurando transferir o governo das

INTEGRACIÓN Y CONOCIMIENTO

N° 6

 

ISSN 2347 - 0658

Vol. 1 Año 2017

 

 

instituições para uma tecno-estrutura gestionária e para o mercado” (p. 18). Nesse modelo a autonomia institucional e a liberdade acadêmica podem ser caracterizadas como técnicas de gestão subordinadas a um novo paradigma de educação, o que resulta uma concepção de avaliação de tipo tecnocrático e gerencial, externa e quantitativa, estandardizada, centrada na comparação e deixando de lado a autoavaliação e o autogoverno.

O trabalho de Erichsen (2007) debate as transformações dos sistemas de educação superior na Europa, a partir do Processo de Bolonha. Para isso são apresentados os comunicados assinados pelos ministros de educação europeus que aderiram à proposta, uma discussão sobre a avaliação e a acreditação como meios de desenvolvimento e garantia da qualidade na educação superior. Também trata da questão da educação continuada como um desafio para as instituições de educação superior e uma oportunidade para ampliação do acesso.

O autor mostra que o credenciamento, assim como a avaliação, são reconhecidos como mecanismo equivalentes na garantia da qualidade. Mas explica que a decisão referente ao credenciamento fundamenta-se em um exame de qualidade. Quanto à avaliação, tem o objetivo de melhorar a qualidade, entendida como um meio do automonitoramento, servindo para a prestação de contas da instituição, sendo parte desse processo.

O que importa em ambos os procedimentos é a qualidade no sistema de ensino superior. Por outro lado, existem diferenças a serem consideradas também em uma fase evolutiva futura. Assim, o destinatário de uma decisão de credenciamento não é, a partir do objetivo desse processo, primacialmente o requerente; importa, muito pelo contrário, informar uma parcela da opinião pública.

Diferentemente, o destinatário do relatório de avaliação é a instituição avaliada, que o “interioriza“ em larga escala e procede à sua interpretação para fins de automonitoramento. (Erichsen, 2007, pp. 39-40)

A tendência suposta por Erichsen (2007) é a de que no contexto do Processo de Bolonha a responsabilidade pela qualidade seja retirada do Estado e delegada a órgãos independentes do Estado e das instituições de ensino superior. Sendo assim, o credenciamento é um mecanismo de aumento da autonomia das instituições e também para o desenvolvimento de um sistema capaz de atender a demanda com o mínimo de qualidade “O credenciamento é o necessário outro lado da medalha de um aumento da autonomia das instituições de ensino superior, da sua inclusão em um sistema global direcionado para o

atendimento da demanda e comprometido

247

com um determinado nível de qualidade”

 

(Erichsen, 2007, p. 40).

 

 

 

 

Nesse sentido, a cooperação entre as

 

agências nacionalmente reconhecidas é muito

 

importante para que seja possível o

 

reconhecimento recíproco de decisões de

 

credenciamento e também padrões nacionais

 

de garantia de qualidade com a finalidade do

 

reconhecimento

dos

programas,

das

 

conclusões e instituições credenciadas no

 

respectivo plano nacional.

 

 

 

De forma geral, os trabalhos mostram

 

que a garantia da qualidade passa a ter um

 

valor central de orientação na União

 

Europeia a partir do Processo de Bolonha

 

(Erichsen, 2007; Lima, Azevedo e Catani,

 

2008), mas que suas concepções são

 

marcadas pelo paradigma dominante de

 

avaliação contábil e gerencial, baseada em

 

uma

epistemologia

positivista

(Lima,

 

Azevedo e Catani, 2008) que passou por um

 

processo no qual a responsabilidade pela qualidade foi retirada do Estado e delegada a órgãos independentes (Erichsen, 2007).

INTEGRACIÓN Y CONOCIMIENTO

N° 6

 

ISSN 2347 - 0658

Vol. 1 Año 2017

 

 

Erichsen (2007) ainda pronuncia que o credenciamento poderia servir como um mecanismo de aumento da autonomia das instituições e uma chave para o desenvolvimento de um sistema global de educação. Essas características apontadas nos trabalhos explicitam a importância da qualidade da educação superior para a constituição do EESS. No entanto, explicitam certa dubiedade dos usos da avaliação nesse contexto, pois embora intrinsecamente seja observável a adoção de uma concepção de qualidade seguindo a lógica da globalização, e, portanto com parâmetros mercantis; por outro lado, há possibilidades de concretizar a qualidade pretendida, de forma descentralizada e chegar

àmodificação da regulação para processos de emancipação das instituições.

APONTAMENTOS FINAIS

A implementação do processo de integração das universidades, que se concretizou na Declaração de Bolonha, exigiu a integração de todos os sistemas nacionais de ensino superior da União Europeia para formar um sistema educativo, tendo como principal objetivo aumentar a competitividade internacional da Europa. Isso gerou importantes debates nas esferas política e acadêmica, sobre a expansão e a qualidade da educação.

Foi então, em 2005, que os ministros decidiram adotar as propostas da European Association for Quality Assurance in Higher Education (ENQA, 2005) relativas aos “standards” e às orientações a que deverão passar a obedecer as avaliações promovidas pelas agências nacionais e internacionais, que vão integrar um registro europeu de agências de garantia da qualidade, exigindo a meta- avaliação e a meta-acreditação das próprias agências. (Lima, Azevedo e Catani, 2008). Nesse sentido é possível observar a influência social, econômica e educacional desse processo.

O estudo de Lima, Azevedo e Catani (2008), mostra que os parâmetros avaliativos possuem raízes positivistas e tem um perfil tecnocrático e gerencialista evidenciando as características mercantis em que se encontra o paradigma educacional, no qual a autonomia, a autoavaliação e o autogoverno são deixados de lado. Essas considerações podem ser evidenciadas no documento “Criterios y Directrices para la Garantía de Calidad en el Espacio Europeo de Educación Superior”. Nesse documento, embora se enfatize, em seus objetivos, a importância da economia institucional e da autoavaliação, apresenta, por outro lado, a supremacia dos mecanismos de avaliação externa com foco no mercado. Nesse sentido, considera-se como atores do processo de avaliação tanto os segmentos acadêmicos, docentes e discentes, como a avaliação das organizações que recebem os egressos da universidade, o que no limite reforça o sentido

mercadológico esperado para as 248 universidades.

A concepção ligada à competição de mercado (Enguita, 1997) pode ser evidenciada nos princípios do informe da ENQA (2005), quando diz que devem ser levando em consideração “los intereses de los estudiantes así como los de los empleadores y los de la sociedad en general” (p.10). Assim como também explicitam Lima, Azevedo e Catani (2008) quando mostra que no contexto do Processo de Bolonha “Os diferentes modos de

regulação centralizada revelam-se, paradoxalmente, indispensáveis à orientação econômica dominante e à adoção de mecanismos de desregulação e liberalização típicos do funcionamento dos mercados competitivos” (p. 13).

Além disso, a ENQA também explicita como princípio “la gran importancia de la autonomía institucional” como enfatizado por Erichcen (2007), porém a autonomia deve ser “matizada por el reconocimiento de que esta conlleva grandes

INTEGRACIÓN Y CONOCIMIENTO

N° 6

 

ISSN 2347 - 0658

Vol. 1 Año 2017

 

 

responsabilidades” (p.10) o que evidencia uma concepção marcada pela eficácia dos processos (Enguita, 1997).

Quanto à proposta de um sistema de revisão por pares para as agências destaca-se a construção de um Fórum consultivo para a garantia de qualidade, com a inclusão de agentes socioeconômicos. O que revela mais uma vez a preocupação com a construção de um “modelo institucional de feição gerencialista para as universidades, inspirado na atividade empresarial, procurando transferir o governo das instituições para uma tecno-estrutura gestionária e para o mercado” (Lima, Azevedo e Catano, p. 18).

Por outro lado, Erichsen (2007) explicita que há possibilidades de avanços para uma concepção mais emancipatória da avaliação, dependendo dos usos que se possa fazer no contexto institucional e das interligações entre os espaços, local e supranacional.

Diante desses fatos, e tendo em vista que o Mercosul tem o Processo de Bolonha como modelo para a consolidação de seu espaço educacional, sugere-se que sejam

realizados novos e mais estudos, considerando o limite do presente trabalho, que focou na literatura difundida no Brasil sobre as análises acerca do processo de construção da qualidade no EESS. Particularmente, indica-se a necessidade de se analisar os instrumentos de avaliação produzidos no contexto do Mercosul, especialmente o instrumento de avaliação identificado como Sistema de Acreditação Regional de Cursos de Graduação – Sistema ARCU-SUL de forma a identificar possíveis influências e efeitos desse instrumento adotado no contexto do Processo de Bolonha na construção da concepção de qualidade que se está em curso.

REFERÊNCIAS

Alfonso, A. J. (2000). Avaliação educacional: regulação e emancipação. 2. ed. São Paulo: Cortez.

Azevedo, M. L. N. de. (2008). A formação de espaços regionais de educação superior: um olhar meridional – para o MERCOSUL. Avaliação, 13 (3), 875-879.

Azevedo, M. L. N. de. (2009). O Mercosul e a educação superior: qual integração? Atos de pesquisa em educação, 4 (3), 303-320, set./dez.

Azevedo, M. L. N. de. (2014). A Integração Regional, a Estratégia Europeia de Desenvolvimento e algumas comparações

com o Mercosul. Revista Latinoamericana de Educación Comparada, (5), 29-40.

Dale, R. (2004). Globalização e educação: demonstrando a existência de uma “cultura educacional mundial comum” ou localizando uma “agenda globalmente estruturada para a educação”? Educação e Sociedade, Campinas,

25(87), 423-460.

249

Dale, R. (2009). Os diferentes

papéis,

 

propósitos e resultados dos

modelos

nacionais e regionais de educação. Educação e Soiedade, Campinas, 30(108), 867-890.

Demo (2002). Avaliação Qualitativa. 7 ed. Caminas, SP: Autores Associados.

Dias Sobrinho, (2008). Calidad, Pertinencia y Responsabilidad Social de la Universidad Latinoamericana y Caribeña. In: Gazzola, A. L; Didriksson, A. (Org.). Tendencias de la Educación Superior en América Latina y el Caribe. 1. ed. Caracas: IESALC-UNESCO, 1, 87-112.

Enguita, M. F. (1997). O discurso da qualidade e a qualidade do discurso. In: Gentili, P; Silva, T. T da (orgs.). Neoliberalismo, Qualidade Total e Educação: visões críticas (93- 110). 5. Petrópolis: Vozes.

ENQA (2014). Criterios y Directrices para

laGarantía

de CalidadenelEspacioEuropeo de

Educación

Superior.

Helsínquia:

EuropeanAssociation for

QualityAssurance

in HigherEducation. Disponível em: <http://www.enqa.eu/indirme/esg/ESG%2

INTEGRACIÓN Y CONOCIMIENTO

N° 6

 

ISSN 2347 - 0658

Vol. 1 Año 2017

 

 

0version%20ESP.pdf> Acesso em: 22 mar. 2014.

Erichsen, H. (2007). Tendências européias na graduação e na garantia da qualidade. Sociologias, Porto Alegre, ano 9(17), 22-49, jan./jun.

Hortale, V. A; Mora, J. (2004). Tendências das reformas da Educação superior na Europa no contexto do Processo de Bolonha. Educação e Sociedade, Campinas, 25(88), 937-960, Especial.

Krawczyk, N; Sandoval, S. A. M. (2012). O

Processo de Regionalização das Universidades do Mercosul: um estudo exploratório de regulação supranacional e nacional. Educação e Realidade. Porto Alegre, 37(2), 647-668.

Lamarra, N. F. (2010). La convergência de la educación superior en América Latina y su articulación com los espacios europeo e ibero-americano. Posibilidades y límites. Avaliação, Campinas; Sorocaba, SP, 15(2), 9- 44.

Lamarra, N. F. (2012). Universidad y Calidad en América Latina en perspectiva comparada. Interrogantes y desafios. Avaliação, Campinas; Sorocaba, SP, 17(3) 661-688.

Lima, L.C; Azevedo, M. Luiz N. de; Catani, A. M. (2008). O processo de Bolonha, a avaliação da educação superior e algumas considerações sobre a Universidade Nova. Avaliação, Campinas; Sorocaba, SP, 13(1), 7- 36.

Minayo, M .C. S. (2000). O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 7. ed. São Paulo: Hucitec; Rio de Janeiro: Abrasco. Moura, L.B. de A. M; Serikawa, L. Ka. dos A. (2012). O MEXA e a integração regional do Mercosul. In: Congresso Internacional Interdisciplinar em Sociais e Humanidades, 2012, Niterói. Anais... 2012, pp. 1-22. Oliveira, R. P. de. (2009) A transformação da educação em mercadoria no Brasil. Educação e Sociedade. Campinas, 30(108), 739-760.

Packer (2014). SciELO – 15 Anos de Acesso Aberto: um estudo analítico sobre Acesso Aberto e comunicação científica. Paris:

UNESCO, 188 p. Disponível em:

<

 

http://scielo.org/local/File/livro.pdf

>.

 

Acesso em: 12 dez. 2015.

 

 

 

 

Real, G.C. M. (2009). Avaliação e qualidade

 

no Ensino Superior: os impactos do período

 

1995-2002. Educação e Pesquisa, São Paulo,

 

35(3), 573-584.

 

 

 

 

 

 

Robertson, S. L. (2009). O processo

de

 

Bolonha da Europa torna-se global: modelo,

 

mercado, mobilidade, força intelectual ou

 

estratégia para construção do Estado? Revista

 

Brasileira de Educação. Trad.: GOMES, Alfredo

 

Macedo; KAY, Roderick Somerville, 14(42),

 

407-600.

 

 

 

 

 

 

 

Santiago, L. A. da S. S; Ranzi, S. M. F. (2013).

 

As propostas do Setor Educacional do

 

Mercosul para o ensino de História. Práxis

 

Educativa, Ponta Grossa, 8(2), 443-463.

 

 

Santos, B. de S. (Org.) (2011). A Globalização e

 

as ciências sociais. São Paulo: Cortez.

 

 

 

Santos, M. R. S. dos; Donini, A. M. C. de.

 

(2010).

Políticas

de

integração

e

 

internacionalização da educação superior no

250

Mercosul

educativo.

In:

X

Coloquio

 

Internacional sobre Gestión Universitaria

em

 

América de Sur, 2010,

Mar del Plata. Anais...

 

2010, p. 1-15.

 

 

 

 

 

 

Siebiger, R. H. (2013) O processo de Bolonha e a

 

universidade brasileira: aproximações a partir da

 

análise de documentos referenciais. 2013. 252

 

f. Dissertação (Mestrado em Políticas e

 

Gestão

da

Educação)–Faculdade

de

 

Educação, Universidade Federal da Grande

 

Dourados, Dourados.

 

 

 

 

 

Sousa, J. V. de. (2009). Qualidade

na

 

educação superior: lugar e sentido na relação

 

público-privado. Caderno Cedes,

Campinas,

 

29(78), 242-256.

 

 

 

 

 

 

INTEGRACIÓN Y CONOCIMIENTO

N° 6

 

ISSN 2347 - 0658

Vol. 1 Año 2017

 

 

251