Epidemias, protagonismos e direitos específicos de saúde: a criação do Distrito Sanitário Yanomami e a Política de Saúde Indígena no Brasil (1991-2021)

Epidemics, protagonism and health specific rights: the creation of the Yanomami Special Health District and the Indigenous Health Policy in Brazil (1991-2021)

Epidemias, protagonismos y derechos específicos de salud: la creación del Distrito Sanitario Yanomami y la política de salud indígena en Brasil (1991-2021)

Adriana Romano Athila

https://orcid.org/0000-0001-7441-380X

Fundação Oswaldo Cruz

adrianarathila@gmail.com

Fecha de envío: 16 de julio de 2021. Fecha de dictamen: 8 de noviembre de 2021. Fecha de aceptación: 8 de noviembre de 2021.

Resumo

São reconhecidas as condições historicamente desiguais de povos indígenas, em múltiplos determinantes sociais, graus de reconhecimento e acesso a direitos específicos, com especial impacto sobre sua saúde. Estudos contemporâneos evidenciam uma consistente replicação de desigualdades nas condições de vida e saúde de indígenas, quando comparados a não indígenas, na América Latina como em países de diferentes continentes. Através de uma análise sociopolítica e histórica, calcada na etnografia de documentos produzidos sobretudo em meio ao curso das epidemias que exterminariam cerca de 15% da população Yanomami da Amazônia brasileira, na década de 80, e de seu caráter impulsionador da criação formal do Primeiro Distrito Sanitário Indígena do país, abordo parte do longo percurso de mobilizações indígenas e indigenistas em torno da construção de uma Política Nacional de Atenção à Saúde de Povos Indígenas. É quando uma gestão das epidemias e violações de direitos humanos, operada por uma rede transdisciplinar e transnacional atua contrariamente à invisibilidade deste segmento populacional, produzindo dados específicos sobre sua saúde e território, gerando efeitos legais inéditos no aparato do Estado brasileiro. Por outro lado, ao destacar o caráter fundamental e recomendável da participação de indígenas na formulação e implementação de políticas de saúde, contrasto o sólido percurso da política de saúde indígena ao pouco diálogo entre Estado, Povos indígenas e ações de saúde específicas no Brasil, diante da corrente Pandemia de Covid-19.

Abstract

The historically unequal conditions of indigenous peoples are recognized in multiple social determinants, degrees of recognition and access to specific rights, with special impact on their health. Contemporary studies show a consistent replication of inequalities in the living and health conditions of indigenous peoples, when compared to non-indigenous peoples, in Latin America and in countries from different continents. Through a sociopolitical and historical analysis, based on the ethnography of documents produced mainly in the midst of the course of epidemics that would exterminate about 15% of the Yanomami population in the Brazilian Amazon in the 1980s, and its driving character in the formal creation of the country's First Indigenous Health District, I approach the long path of indigenous and indigenist mobilizations around the construction of a National Health Care Policy for Indigenous Peoples in Brazil. It is when a management of epidemics and human rights violations, operated by a transdisciplinary and transnational network acts contrary to the invisibility of this population segment, producing specific data on their health and territory and generating unprecedented legal effects in the Brazilian State apparatus. On the other hand, by highlighting the fundamental and recommendable character of indigenous peoples' participation in the formulation and implementation of health policies, I contrast the solid path of indigenous health policy with the little dialogue between the State, Indigenous Peoples and specific health actions in Brazil, given the current Covid-19 pandemic.

Resumen

Se reconocen las condiciones históricamente desiguales de los pueblos indígenas en sus diversas determinaciones sociales, grados de reconocimiento y acceso a derechos específicos, con especial impacto sobre su salud. Estudios contemporáneos evidencian la reproducción de desigualdades en las condiciones de vida y salud de los indígenas, especialmente si se comparan con los no indígenas, tanto en América Latina como en países de diferentes continentes. A través de un análisis socio-político e histórico, basado en una etnografía de documentos producidos sobre todo durante las epidemias que exterminaron aproximadamente al 15% de la población Yanomami en la Amazonia brasileña, en la década de 1980, y su carácter impulsor de la creación formal del Primer Distrito Sanitario Indígena del país, abordo la larga trayectoria de las movilizaciones indígenas e indigenistas que hicieron posible la elaboración de una Política Nacional de Salud para los Pueblos Indígenas. Es cuando un manejo de las epidemias y de violaciones de derechos humanos, por parte de una red transdisciplinaria y transnacional, actúa en contra de la invisibilidad de ese segmento de la población, elaborando datos específicos acerca de su salud y su territorio, y genera efectos inéditos en el aparato jurídico estatal brasileño. Por otra parte, al destacar el carácter esencial y recomendable de la participación de los indígenas en la formulación e implementación de políticas de salud, contrasto la sólida trayectoria de la política nacional de salud indígena con el poco diálogo que se ha registrado entre el Estado y los pueblos indígenas sobre las acciones específicas de salud ante la pandemia de Covid-19 en Brasil.

Palavras-clave: Saúde Indígena; Direitos de Saúde de Minorias; Pesquisa Qualitativa; Covid-19; Yanomami.

Keywords: Indigenous Health; Health Rights of Minorities; Qualitative Research; Covid-19; Yanomami.

Palabras clave: Salud Indígena; Derechos de Salud de Minorías; Investigación Cualitativa; Covid-19; Yanomami.

Introdução

São reconhecidas as condições historicamente desiguais de povos indígenas, em múltiplos determinantes sociais, graus de reconhecimento étnico, linguístico-cultural, territorial e de acesso a direitos específicos, com especial impacto sobre sua saúde e bem-estar (King, Smith & Gracey, 2009). Sistematicamente marginalizados em seus próprios Estados-nação (Stephens, Nettleton, Porter, Willis & Clark, 2005), sua ampla diversidade cultural, de modalidades de existência e trajetórias sociohistóricas, não têm impedido a replicação global de iniquidades nas condições de vida e saúde de indígenas. Elas são sistematicamente piores quando comparadas àquelas de não indígenas, em países da América Latina e outros continentes, com categorias diversas de renda e povos nativos entre sua população (Montenegro & Stephens, 2006; The Lancet, 2009; Anderson, Robson, Connolly, Al-Yaman, Bjertness, King, Tynan, Madden, Bang, Coimbra Jr. et al., 2016).

Apenas tardiamente a “Declaração de Direitos de Povos Indígenas” (2007) reconhece tanto a necessidade de proteção de seus direitos específicos, quanto de esforços dos Estados-nação para assegurar seus direitos ao acesso, participação e gestão de programas e políticas sanitárias, em paralelo ao exercício de suas práticas de saúde e medicinas (UN, 2007). Neste sentido, a participação e autodeterminação de povos indígenas têm sido consideradas essenciais à reversão das desigualdades engendradas pelos processos de colonização (Gracey & King, 2009).

Neste artigo qualifico algumas configurações participativas envolvendo povos indígenas, organizações indígenas e indigenistas voltadas à produção de dados epidemiológicos e sociodemográficos específicos e de ações de saúde culturalmente sensíveis. O contexto histórico e sociopolítico é aquele pregresso à criação do primeiro Distrito Sanitário Indígena do Brasil, o Distrito Sanitário Yanomami (DSY), em 1991. É quando também acontece o reconhecimento de um território contínuo para os Yanomami em solo brasileiro, após mais de duas décadas de tentativas governamentais de retalhar, degradar e, assim, expropriar suas áreas de ocupação originária (Albert, 1992).

No decorrer do percurso, saliento aspectos translocais das mobilizações indígenas e indigenistas em torno da construção de ações de saúde específicas e da vindoura Política Nacional de Atenção à Saúde de Povos Indígenas (PNASPI) no Brasil, em 2002, indo de encontro a trabalhos recentes que têm revigorado o interesse e qualificado este protagonismo através de abordagens multidisciplinares (FUNASA, 2002; Pontes, Cardoso, Bastos & Santos, 2021; Pontes, Machado & Santos, 2021; Pontes & Santos, 2020). Este vultoso movimento é constituído por forças difusas, catalisadas em um momento de emergência epidêmica e condições degradadas de existência dos Yanomami e outros povos indígenas no país (Athila, 2021). Envolve lideranças, povos e indígenas em aldeias, comunidades e cidades, articulados a agentes de diversas disciplinas e instituições, com estatutos e modalidades de organização política heterogêneos.

Quando o DSY emerge, esta rede híbrida já vinha, há algum tempo, atuando contrariamente à invisibilidade de indígenas no país, inclusive do ponto de vista da produção de dados específicos sobre sua população, território e saúde, indissociável de determinantes amplos e de sua existência em áreas física e sanitariamente resguardadas (Guimarães & Santos, 2021). Como argumentarei através do caso dos Yanomami da Amazônia brasileira, eventos epidêmicos agudos e violações de direitos vários, por outro lado, acirram aquelas modalidades de participação (Bernstein, 2017), gerando efeitos no aparato jurídico do Estado brasileiro. Acontece a inédita adoção de uma política de saúde específica a um grupo étnico-populacional, por um país que apenas recentemente reconhecera formalmente o caráter multiétnico de sua população (Carneiro da Cunha, 2018).

Ao analisar a situação epidêmica e a vigorosa participação de indígenas neste capítulo inaugural da construção da política de saúde indígena brasileira, finalizo com um breve exercício diacrônico-comparativo, diante das respostas dos Estados-nação frente à pandemia de Covid-19. Elas têm, invariavelmente, deixado povos indígenas para trás, em diversas regiões do mundo (Curtise & Choo, 2020) e brutalmente revelado desigualdades (The Lancet, 2021), contrariando a ilusão falsa e perigosa de que seus efeitos estivessem atingindo a todos, indiscriminadamente (Fassin, 2020).

Em contrapartida, especialmente no Brasil, a pandemia tem revelado respostas indígenas vultosas, em e entre aldeias, comunidades e coletivos regionais e panregionais (Athila et al., 2021a). Sua natureza desafia a fixidez da lógica espacial e identitária dos Estados-Nacionais, mais articulando do que contrastando indígenas em espaços rurais, urbanos e periurbanos.

Sem contemplar circunstâncias históricas, socioculturais e político-econômicas dessa situação, esta topografia pouco diz sobre as dinâmicas populacionais de indígenas, especialmente na América Latina (IIDH, 2007; del Popolo, 2008). Para o caso brasileiro, a urbanidade ou ruralidade têm funcionado menos como delimitadores espaciais e mais como idioma utilizado por indígenas para organizar, falar e pensar seus trânsitos e modos de existência multisituados e que, portanto, podem coexistir, seja entre, seja dentro de aldeias, comunidades e cidades (Azevedo, 2011).

Dentro desta diversidade, respostas e mobilizações indígenas à Covid-19 são acompanhadas por uma expressão judicial sem precedentes (Eloy, 2020). A representação responde também ao recrudescimento de um projeto de país que desconsidera um conjunto de direitos constitucionais específicos, participativamente conquistados na década de 80 (The Lancet, 2019). Entre eles, aqueles territoriais e de saúde de povos indígenas, aqui analisados em sua longa trajetória, tendo como mote o primeiro Distrito de Saúde Indígena criado no Brasil, seu caráter exemplar para a posterior criação de outros distritos e para a construção de uma política nacional de saúde culturalmente específica (Athila, 2021).

A pretensão é contribuir ao debate internacional sobre os efeitos da participação de indígenas na preservação e efetivação de seus já conquistados direitos na América Latina e em outros países com povos nativos, como para a formulação e implementação de políticas e programas consoantes a suas próprias noções sobre saúde e na direção da reversão de iniquidades globais (Ferdinand, Lambert, Trad, Pedrana, Paradies & Kelaher, 2020; Anderson et al., 2016). Diante do contexto pandêmico, esta tarefa tem infelizmente se demonstrado urgente (Charlier & Varison, 2020).

Quando está em curso a desconfiguração daquele corpo de direitos, pareceu importante rememorar analiticamente o protagonismo de indígenas na história pregressa da política de saúde indígena brasileira. O esforço é também embalado pelo desejo, talvez utópico, de que as mobilizações e a participação social, acompanhadas pela produção de dados e ações paralelos de enfrentamento, com interface jurídica, sejam novamente capazes de gerar efeitos desejáveis nas práticas de gestão governamentais, como demonstro ter sido o caso do Distrito Yanomami.

No limite, que possam evitar o que projetos coletivos de ação (APIB, 2020a), recomendações de instituições governamentais protetivas de direitos e denúncias em fóruns latinoamericanos e mundiais dedicados à proteção de direitos humanos têm qualificado como risco real de genocídio e o genocídio em curso de povos indígenas no país (APIB, 2020b). Ao lado de outros povos indígenas brasileiros, os Yanomami, como argumento, continuam a ocupar parte importante neste cenário de disputas e resistência (Valente, 2020; Chade, 2021; APIB, 2021).

Metodologia

Contrastando-as com reflexões sobre alguns impactos da Covid-19 entre indígenas no Brasil, este artigo emprega análises históricas e sociopolíticas para abordar a formulação de uma política pública de saúde culturalmente sensível no país. O período considerado é sobretudo aquele da transição militar-ditatorial para a democracia brasileira, no final da década de 1980.

O estudo é parte de um projeto mais amplo, composto por pesquisadores de diversas instituições do país (Pontes & Santos, 2020)[1]. Tendo influenciado diretamente a análise, sem estarem diretamente referidas, está um conjunto de entrevistas de lideranças indígenas, acadêmicos e atores de campos multidisciplinares, envolvidos nas discussões sobre a formulação de uma política nacional de saúde indígena. Elas foram conduzidas e analisadas, em diferentes momentos e sob diferentes aspectos, pelos diferentes pesquisadores[2].

Utilizando a abordagem analítica sociohistórica, empregada por estudos sobre a emergência e consolidação do campo da saúde pública no Brasil (Lima, 2007; Vieira-da-Silva & Pinell, 2014), o papel dos diferentes atores foi analisado em conjunto com o levantamento e análise polifônica de documentos e outras fontes alternativas disponíveis sobre o período. Foram utilizados jornais, informativos de entidades e associações relacionadas aos movimentos indígena, indigenista e sanitário, ou mesmo sessões da Câmara e do Senado, onde o tema das epidemias, dos Yanomami e de uma série de agentes e situações sociopolíticas do país encontram eco.

Diferentes apropriações sobre “epidemias”, “projetos de nação” e suas relações com uma dada conceituação de indianidade e povos indígenas, onde os Yanomami têm centralidade em um disputado imaginário nacional e internacional, foram tomadas como categorias metodológicas para acessar diferentes percepções, aproximações e distanciamentos relevantes à compreensão da heterogeneidade de agentes e condições sociopolíticas de materialização do Distrito Sanitário Yanomami (Dent & Santos, 2017). Ao remeter o contexto pandêmico à diacronia destas articulações, é possível compreender as renitências na relação de exclusão e oclusão entre Povos Indígenas, Estado brasileiro, a atenção à saúde de um segmento etnicamente específico da população e sua respectiva política pública, reincidente na replicação de desigualdades, a despeito do panorama regulatório do país (Madi Dias, 2021).

(In)visibilidade, participação e saúde: o Distrito Sanitário Yanomami e a trajetória política de saúde indígena no Brasil

Estudos de escala global apontam a correlação entre o reconhecimento de povos indígenas nas Constituições de Estados-nação, a existência de um corpus jurídico específico, o estímulo a sua participação nas políticas públicas e a proteção de direitos indígenas (Ferdinand et al., 2020). De país a país, pode haver diferentes arranjos e incompatibilidades entre as diretrizes multiétnicas de suas Constituições Nacionais, sua adesão a pactuações internacionais, a política indigenista adotada e, finalmente, a implementação destas proposições nas políticas públicas destinadas a indígenas (Ferdinand et al., 2020). A dimensão prática das políticas públicas e da política indigenista pode desconsiderar inteiramente diretrizes juridicamente instituídas.

Nas últimas décadas, as Constituições Nacionais de parte significativa dos países com povos indígenas na composição de sua população passam a reconhecê-los e a seus direitos fundamentais (DPLF & OXFAM, 2015). A América Latina é considerada como a mais representativa região relativamente à existência de direitos específicos de povos indígenas, onde praticamente todos os países reconhecem povos indígenas em seus dispositivos constitucionais e supra-constitucionais (Ferdinand et al., 2020).

No Brasil, a partir de 1988, as diretrizes de “equidade social” e o “multiculturalismo” passam a nortear a formulação de políticas públicas, atingindo diretamente povos indígenas do país (Souza Lima, 2005). Outro importante marco regulatório foi a Convenção 169, da Organização Internacional do Trabalho (1989), determinando que autoridades governamentais reconheçam as noções indígenas sobre sua saúde, assegurando sua participação no planejamento, administração e avaliação dos serviços de saúde, nos moldes de seus artigos 25 e 33 (OIT, 2011).

No início da década de 80, o alcance internacional de organizações não governamentais é ampliado, gerando efeitos locais relativos a princípios e mecanismos de garantia de direitos humanos, parte da Declaração Universal de 1948 (Hunt, 2009). Mas, ao lado ou por entre uma diversidade de organizações indigenistas, é a ampla mobilização de povos e organizações indígenas que resulta na elaboração e inclusão de um Capítulo específico na nova Constituição Federal (CF) brasileira, em 1988: “Dos Índios” (Carneiro da Cunha, 2018).

Outra importante diretriz constitucional é o entendimento da saúde como um direito universal da população e dever do Estado para com seus cidadãos, originando o sistema público do país, denominado “Sistema Único de Saúde” (SUS) (Paim, Travassos, Almeida, Bahia & Macinko, 2011). Estas conquistas fornecem os fundamentos legais e conceituais para o acesso universal porém culturalmente diferenciado de indígenas a políticas públicas, como aquelas de saúde (Pontes & Santos, 2020; Santos, Cardoso, Garnelo, Coimbra Jr & Chaves, 2008).

A Constituição sucede imediatamente o regime militar-ditatorial brasileiro, onde a transitoriedade de indígenas sustentada pela política indigenista estimulou demógrafos e antropólogos a projetarem sua extinção enquanto segmento populacional diferenciado (McSweeney & Arps, 2005; Pagliaro, Azevedo & Santos, 2005). Em um país onde pouco se sabia sobre o número ou sua exata localização, a expectativa era solidamente alimentada por epidemias e mortes causadas no decorrer das invasões de regiões ocupadas por indígenas, com objetivo de explorar recursos e desenvolver o interior do país (Davis, 1978; Ramos, 1993).

Documentos do período descrevem sobretudo a Amazônia brasileira como um vazio demográfico a ser ocupado e tornado rentável (DNPM, 1975). Em contrapartida, o curso dos vultosos empreendimentos de infraestrutura e colonização continuamente se deparam com povos indígenas, muitos dos quais desconhecidos até então.

Em sentido contrário àquela projeção, um crescente ativismo político faz emergir e consolidar os primeiros movimentos indígenas organizados e com expressão nacional (Albert, 1997). Eles nascem de diversas formas e em diversas regiões, articulados em torno de direitos, sobretudo territoriais, e em estreita relação com uma rede de instituições e organizações multidisciplinares de cunho indigenista (Pontes & Santos, 2020). Através de métodos pouco convencionais e envolvendo missionários, pesquisadores e indígenas de norte a sul do país, são desenvolvidas iniciativas de localização e contagem de indígenas paralelas ao Estado, reunindo evidências demográficas de seu crescimento populacional, modos de vida e áreas de ocupação (Santos, Guimarães, Simoni, Da Silva, De Oliveira Antunes, De Souza Damasco, Colman & Azevedo, 2019).

O Distrito Sanitário Yanomami (DSY) é estritamente relacionado a este contexto, por um lado, de invasões e epidemias e, por outro, de mobilizações para tornar visíveis e quantificáveis vidas, adoecimentos e mortes de indígenas no Brasil, contrariando esforços do Estado brasileiro na direção de sua transitoriedade. Ele é criado em 1991, em meio a epidemias descritas como pandemias (Ramos, 1991), principalmente de malária, atingindo centenas de comunidades da família linguística Yanomami, nos estados do Amazonas e Roraima, compreendendo a fronteira do Brasil com a Venezuela. Em paralelo à criação do DSY, a Terra Indígena Yanomami é formalmente reconhecida, neste primeiro exemplo de associação entre uma minoria populacional, ações específicas de saúde e um território étnico singular no país (Athila, 2021).

Com seu território continuamente ameaçado e privados de um programa de saúde permanente, o ápice dos efeitos sanitários, epidêmicos e sociológicos ficou conhecido por “invasão garimpeira”, à qual os Yanomami foram submetidos em sua forma aguda, entre 1987 e 1989. É quando aquela rede transdisciplinar e multi-institucional, de caráter transnacional, envolvida em ações de saúde e território, se dedica a produzir dados e denunciar o comprometimento de sua saúde, vida cotidiana, ritual e condições de vida.

A convergência entre atores e circunstâncias sociopolíticas gera efeitos inéditos na política de saúde indígena brasileira. A instituição do Distrito inaugura a longa trajetória da saúde indígena diante do aparato jurídico-formal do Estado brasileiro: de 1991, quando o Distrito é criado por uma Portaria Interministerial, ao ano de 1999, quando a chamada “Lei Arouca” inaugura as bases legais do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena (SasiSUS) (Pontes, Machado, Santos & Arouca, 2019).

A organização do SasiSUS contrasta com aquela adotada pelo SUS, submetido à lógica dos diferentes municípios das unidades federativas brasileiras, os estados. Suas diretrizes, em uma conquista do movimento indígena, determinam que, no lugar dos municípios, são as especificidades dos povos atendidos as responsáveis por delinear os modos de atenção e mecanismos de controle social, através de 34 Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs) (Athila et al., 2021a).

Idealmente, os DSEIs contemplam características territoriais e etnoculturais respectivas ao povo ou povos atendidos por eles, podendo compreender diferentes municípios e mesmo estados brasileiros. Malgrado o subsistema deva providenciar a atenção primária diretamente em aldeias e comunidades, sua competência formal é atender indígenas, individual ou coletivamente, em todo o território nacional, sendo também responsável por articular otimamente seu atendimento a maiores graus de complexidade, no âmbito do SUS (Brasil, 1999). Em 2010, é também criada uma Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI), dentro do Ministério da Saúde, com a competência de desenvolver ações de saúde consoantes à PNASPI.

Segundo os escassos dados públicos do sistema oficial de informação sobre a saúde de indígenas no Brasil, o Sistema de Informação da Atenção à Saúde Indígena (SIASI), apenas indígenas em Terras Indígenas formalmente reconhecidas pelo Estado brasileiro, são atendidos pelo Subsistema. Isto determina que um contingente importante de indígenas em áreas não regularizadas e cidades deverá ser atendido de maneira indiferenciada pelo SUS, a depender das possibilidades de acesso (IBGE, 2012). Quando realizado, este atendimento não gera registro sobre cor/etnia nos sistemas públicos de informação, impossibilitando o monitoramento de suas condições específicas de saúde e inferências sociodemográficas (APIB, 2020a).

Dentro de um país que chega aos anos 2000 sem que o Censo fosse especificamente construído para capturar características de indígenas, como já acontecia há algum tempo na América Latina (Pereira, Santos, Welch, Souza & Coimbra Jr, 2009), a área de saúde é aquela mais renitente em reverter a tendência mundial de que sistemas de dados sobre indígenas sejam mais precários do que aqueles disponíveis sobre não indígenas. Até pelo menos 2005, pouco se sabia também sobre sua sociodemografia (Pagliaro et al., 2005).

O Censo de 2010 é o primeiro a incluir informações sobre a identificação étnica e linguística daqueles autodeclarados ou que se consideram indígenas, seja vivendo dentro de territórios em diferentes situações de reconhecimento pelo Estado, seja em contextos urbanos, trazendo contrastes numéricos e modalidades de “visibilidade” significativos. São disponibilizados dados sobre uma série de indicadores, como aqueles educacionais ou de condições sanitárias e moradias.

É possível saber que no Brasil ao menos 817 mil pessoas, em Terras Indígenas e cidades, se identificaram e/ou declararam indígenas —cerca de 0,4% da população brasileira—, pertencendo a 305 etnias e falando 274 línguas nativas (IBGE, 2012). Como acontece a qualquer segmento populacional, a visibilidade —não apenas demográfica, mas em diversas áreas—, idealmente cada vez mais qualificada, é condição para a elaboração de políticas públicas específicas e adequadas a sanear os padecimentos de povos indígenas no país e alhures (Anderson et al., 2016).

Dentro deste panorama sociodemográfico e depois de quase duas décadas de funcionamento do SasiSUS, persistem as expressivas iniquidades na saúde de indígenas (Coimbra Jr, Santos, Welch, Cardoso, Souza, Garnelo, Rassi, Follér & Horta, 2013). A visibilidade, sendo ao mesmo tempo possibilidade e resultado de participação efetiva de povos e organizações indígenas nos rumos específicos de sua saúde, é reconhecida como um motor de transformação dentro do quadro maior da saúde coletiva e de seu bem-estar.

A constituição de redes nacionais inclusivas, articuladas em escala global, desponta como instrumento privilegiado à governança em saúde e ao desenvolvimento de sistemas de dados indígenas atuando contrariamente a contextos nacionais usualmente desfavoráveis (Anderson et al., 2016). Este é o fio condutor entre uma abordagem sociopolítica sobre a criação do DSY e o que acontece a direitos indígenas durante a pandemia, quando a constituição de redes e a produção coletiva de dados específicos reforçam a ideia de soberania de dados indígenas (Mulligan, Rayner & Nnorom, 2020), em um contexto marcado tanto por efeitos pandêmicos etnicamente desiguais quanto pela ausência de dados étnico-raciais (Fassin, 2020; Zavaleta, 2020; Fellows et al., 2021).

A criação do Distrito Sanitário Yanomami

A criação do Distrito Sanitário Yanomami, em 1991, remete a diferentes campos disciplinares, modalidades de organização e representação política, projetos de nação, financiamentos, controvérsias científicas e/ou da opinião pública, em arenas regionais, nacionais e internacionais, atributos peculiarmente articulados sob a égide dos Yanomami, e não de outro povo indígena brasileiro. Ela ilumina algo acerca da história das ideias e práticas que trariam transformações significativas ao campo da saúde de povos indígenas do país, como da saúde coletiva, como tenho sugerido até aqui.

As mobilizações associadas à área da saúde encontram-se em um momento de transformação de paradigmas, com expressão mundial. A saúde passa a remeter a concepções e determinantes amplos, aproximando-se de experiências delineadas pela participação comunitária nas ações de saúde (WHO, 1978; Langdon & Cardoso, 2015).

No contexto brasileiro, é também em 1978 que o Estado tenta emplacar um decreto sobre a emancipação de indígenas aculturados, a guisa de expropriação de terras, gerando uma importante e inédita mobilização contrária, com expressão midiática (Kopenawa & Albert, 2010). A mobilização associava o movimento indígena emergente a setores intelectuais multidisciplinares —incluindo a saúde coletiva—, unidos contrariamente à ditadura militar instaurada no país há mais de uma década.

Em meio a esta ebulição, Claudia Andujar —fotógrafa engajada que trabalhava desde 1974 entre os Yanomami—, o antropólogo Bruce Albert e o missionário da Ordem Consolata, Carlo Zacquini, criam formalmente a Comissão pela Criação do Parque Indígena Yanomami (CCPY) (Kopenawa & Albert, 2010). A CCPY, à qual a antropóloga Alcida Ramos e Davi Kopenawa se juntariam por volta de 1983, teria protagonismo nas ações de saúde e território entre os Yanomami, em diferentes foruns transnacionais.

Bem antes disso, a contiguidade entre saúde e território, inclusive do ponto de vista de uma epidemiologia de povos indígenas, aparece como atributo estrutural das condições de criação do Distrito Sanitário Yanomami, atravessando o período militar-ditatorial até a chamada “redemocratização” do país. A CCPY começa a atuar em um determinado contexto sociopolítico já sugerido, como também a partir de ações prévias em saúde e território, algumas das quais com preocupação de adequar o atendimento às especificidades socioculturais Yanomami, como veremos a seguir.

Dentro das mencionadas preocupações do Estado brasileiro em povoar e desenvolver economicamente a Amazônia, na década de 70, um mapeamento público realizado pelo Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) coloca o cerne do território Yanomami em evidência. Sem mencionar nominalmente os Yanomami, a publicação de seus resultados provoca imediata e crescente invasão de seu território, representando um ponto de não retorno com relação à degradação das condições de existência e gravidade das epidemias na região.

Se invisíveis no mapeamento do Estado, os Yanomami, ao contrário, tinham peculiaridades que os destacavam no cenário local e internacional. Elas impulsionam a longa trajetória que compreende a criação do primeiro distrito sanitário indígena do Brasil ali, entre eles, e não entre outros povos indígenas que existem no Brasil.

Seus primeiros contatos com a biomedicina acontecem entre o fim da década de 50 e início da década de 60, com a chegada de missionários da MEVA (Missão Evangélica da Amazônia), da ordem da Consolata e dos Salesianos (FNS, 1991). A presença missionária deflagra uma epidemia de sarampo, que varreu grande parte do território Yanomami, tanto no Brasil quanto na Venezuela, em 1967-1968, como conta a história inaugural da “saúde” Yanomami, de acordo com o primeiro relatório de saúde, produzido alguns meses após a criação do DSY (FNS, 1991).

Neste momento, também a doença e a epidemia incluiam os Yanomami e outros povos indígenas latinoamericanos nas pesquisas dos cientistas James Neel e Francisco Salzano, dentro do International Biological Program (Neel & Salzano, 1964). Considerados virgin soil populations, povos como os Yanomami eram laboratórios preferenciais para testes —de vacinas a hipóteses sobre a evolução humana— na iminência de corrupção, justamente pelo avanço de projetos de desenvolvimento e ocupação da amazônia (Dent & Santos, 2017).

Reforçada pela perspectiva internacional, esta imagem dos Yanomami, enquanto tipicamente primitivos e no devir de corrupção de seu modo de vida, tem força em articular tanto iniciativas exterminatórias quanto preservacionistas dentro e fora do país. Por um lado, endossava a premência em reconhecer seu território e estabelecer um programa específico de saúde. Por outro lado, notadamente da perspectiva do governo militar-ditatorial brasileiro, por serem transfronteiços e desfrutarem de alguma projeção internacional, os Yanomami podiam ser descritos como uma outra “nação”, a ameaçar a soberania e a segurança nacional do país.

A segurança nacional e também a urgência em “desenvolver”, colonizar o interior do país e “ocupar” suas fronteiras —inclusive militarmente— levam à construção da estrada Perimetral Norte, na década de 70, ao longo do território Yanomami. O impacto epidemiológico e de suas condições de existência foram sem precedentes. Maquinários e peões são abruptamente introduzidos sem aviso ou qualquer controle sanitário, ao mesmo tempo em que empreendimentos de “colonização” eram estabelecidos dentro ou muito próximos de algumas de suas aldeias, áreas comunitárias ou de trânsito para atividades de subsistência e visitações.

As doenças vão se instalando neste acidentado curso, estimuladas ora pela ação, ora pela omissão calculada por setores do Estado, personagens políticos e instituições de diversos níveis da federação (do Pateo, 2014). À medida em que marcos jurídicos e pactos em defesa de povos e direitos indígenas vão sendo formulados, portarias, projetos de leis e ações do Estado, no sentido contrário, tramitavam ou se instauravam.

Neste cenário de devastação e contradições que rondam a conquista de direitos indígenas no Brasil, acontecem as primeiras ações de saúde com sentido interdisciplinar e culturalmente específico entre os Yanomami. A Fundação Nacional do Índio (FUNAI), órgão do Estado então responsável pelas ações de saúde entre povos indígenas, aprova o Plano Yanoama (1975), desenvolvido pelos antropólogos Kenneth Taylor e Alcida Ramos, da Universidade de Brasília (UNB), com experiência pregressa entre os indígenas (Taylor & Ramos, 1979).

O objetivo era controlar os efeitos dos contatos interétnicos e epidemiológicos do empreendimento. Posteriormente, assistir mais sistematicamente a saúde Yanomami e demarcar seu território.

Tanto quanto gerar novos dados, o Plano tinha a preocupação em reunir as dispersas informações epidemiológicas e sociodemográficas, mas também mapear as histórias de vida dos indígenas e de suas adoentadas e impactadas comunidades ao longo do traçado da estrada e para além dela. O resultado era a visibilidade do trajeto das epidemias pelas redes intercomunitárias e sub-regiões por onde transitavam seus diferentes sub-grupos linguísticos e o destino trágico de indígenas e algumas de suas aldeias fatalmente atingidas.

Não havia como avaliar os efeitos dos empreendimentos sobre a saúde Yanomami ou propor ações de saúde adequadas, sem antes compreender a geopolítica através da qual os diversos sub-grupos transitavam e se relacionavam ou recusavam relação, intercomunitariamente, mas também com os brancos. Isto incluía exportar a geopolítica das inimizades Yanomami também para aqueles que os atendiam até então, como funcionários da FUNAI e missionários, responsáveis por ações pontuais de saúde, entre aqueles localizados nas cercanias de postos e missões, sem registros sistemáticos.

Os antropólogos registram os efeitos nocivos da hospitalização na cidade mais próxima, em locais com estrutura precária, em tudo inadequados aos modos Yanomami de cuidar, comer e dormir em suas redes. Era preciso evitar a situação e atendê-los em suas próprias comunidades, como também dominar seus modos de ser e viver, noções de doença, contágio, e as línguas dos diversos sub-grupos.

Tendo como coordenador um estrangeiro em zona de fronteira, o Plano Yanoama encerra suas atividades cerca de um ano após seu início, por razões de segurança nacional.

Mineradoras e um grande número de garimpeiros continuam a invadir o território Yanomami, causando o primeiro pico de endemia do estado, com drástica redução populacional de algumas aldeias (do Pateo, 2014). Em paralelo a isso, o governo federal, através da FUNAI, fragmenta seu território tradicional em 21 áreas descontínuas; nele instaura uma colônia penal agrícola, que atua também como vetor de contágio.

Entre os anos de 1980 e 1981, subsidiária deste contexto epidemiológico e sociopolítico, a recém-criada Comissão pela Criação do Parque Yanomami começa a mobilizar recursos humanos e financeiros para, em paralelo à luta pela criação de um parque, realizar um atendimento de saúde mais sistemático aos Yanomami.

Trata-se de uma longa e heterogênea história da qual me concentro nas redes articuladas pela CCPY e nos episódios relativos à participação indígena nos destinos de sua saúde e território. Eles redundariam, assinalo, na criação do Primeiro Distrito e, mais que isso, em um primeiro passo para a adoção institucional de noções de saúde sensíveis às especificidades socioculturais de povos indígenas no Brasil.

Eram diversos os agentes envolvidos nas ações e saúde, atuando em paralelo ou conjuntamente ao longo do tempo, como missionários de diferentes designações e suas áreas pontuais de atendimento, organizações da sociedade civil, como a Médecins du Monde (MDM), e mesmo a FUNAI, com destaque para seu convênio formal com a CCPY (Athila, 2021). A Comissão era, contudo, a principal articuladora informal daquelas organizações, procurando também dar tom culturalmente sensível às ações de saúde.

A importância da produção de dados sociodemográficos, epidemiológicos e o interesse nas línguas e medicinas nativas, de certa forma, já haviam sido sinalizados alguns anos antes, pelo Plano Yanoama. A CCPY leva adiante o que viria a ser um programa de saúde culturalmente sensível, com poder de articulação local e transnacional notável, parte dele proveniente das singularidades Yanomami.

Como explorei aqui, seu modo pristino e ameaçado de vida já figurava no imaginário alimentado por debates científicos internacionais. As fotos de Claudia Andujar potencializam e são potencializadas por este imaginário: retratos da vida ritual e cotidiana Yanomami, incluindo suas controvertidas experiências com a exploração de ouro em seus territórios e a construção da estrada —que restou inacabada— povoam relatórios de saúde, documentos, publicações, exposições e manifestos em favor da urgência em demarcar um parque e adotar um programa de saúde adequado aos indígenas.

Sob esta bandeira, médicos, sanitaristas de diversas instituições, como a Escola Paulista de Medicina e a Fundação Oswaldo Cruz são recrutados pela CCPY, ao sabor mais de seu engajamento e de relações interpessoais do que propriamente institucionais. Neste momento de ameaça a territórios e vidas indígenas, começa a se consolidar a primeira organização indígena brasileira de caráter nacional, a União das Nações Indígenas (UNI), contando com o apoio do Conselho Indigenista Missionário (CIMI).

Precisamente de 1985 em diante, a UNI estabelece conexão direta com os Yanomami. A organização é ator-chave de diversos episódios importantes a uma compreensão analítica sobre o DSY, com destaque à participação dos indígenas nos rumos das ações e da política de saúde e território do período. Juntos, UNI e CCPY promovem, em 1986, a Primeira Assembleia Yanomami, acontecida dentro da área indígena e reunindo os Yanomami de diversas sub-regiões, Davi Kopenawa, Ailton Krenak (pela UNI), representantes de instituições públicas, um senador da República e também artistas (CCPY, 1986).

No Brasil, o núcleo de cultura da UNI mantinha um programa de rádio, veiculado pela rádio da Universidade de São Paulo (USP) e apresentado por Ailton Krenak, o Programa de Índio[3]. Os Yanomami, a partir da cidade de Boa Vista ou de comunicação articulada ao rádio de suas aldeias, participaram de vários destes programas. Como outros povos indígenas do Brasil, denunciavam situações em área, estabelecendo um elo entre contextos locais, uma grande capital e outras regiões do país. Médicos e antropólogos responsáveis pelas ações de saúde da CCPY também participaram de uma série de programas.

Ao nível internacional, a participação de lideranças indígenas, como Ailton Krenak e Davi Kopenawa, acontece diretamente junto a representantes do World Bank e da Organização Mundial da Saúde. Apoiados por aquela rede multidisciplinar, denunciam a financiadores e órgãos protetivos os efeitos nocivos dos projetos “desenvolvimentistas” sobre a vida, a saúde e os territórios de povos indígenas no Brasil, dos quais os Yanomami são exemplares.

Ao nível nacional, acontecem a 8ª Conferência Nacional de Saúde, que delineia as bases do que seria o Sistema Único de Saúde, e na qual é determinada a realização da Primeira Conferência Nacional de Proteção à Saúde do Índio, ambas acontecendo em 1986. A equipe de campo da CCPY contribui também com ideias acerca do atendimento de indígenas isolados e de recente contato com a sociedade nacional, como consideravam ser os Yanomami (Selau, Oliveira, Menegolla, Zacquini & Verdun, 1988).

A UNI participa diretamente da organização das mesas e cobre o evento através de um programa de rádio, veiculado nacionalmente, através da emissora de uma grande universidade pública do país, a Universidade de São Paulo (USP). Muitas lideranças participam das discussões sobre o que seria um modelo de saúde para indígenas, como Raoni.

Na Primeira Conferência, de acordo com aspirações do movimento indígena e de organizações não governamentais (ONGs), determina-se que a saúde indígena deveria sair da competência da FUNAI e ser executada por um órgão do Ministério da Saúde (UNI, 1988). As ideias sobre especificidade cultural, saúde e território ganham corpo, acirrando a convergência entre movimentos indígenas e o ideário da reforma sanitária (Pontes et al., 2019).

A CCPY, como um organismo híbrido, mas com um centro culturalmente atento, digamos assim, é ventilada pela participação de um movimento indígena florescente e cada vez mais organizado, sendo responsável pelo levantamento de dados epidemiológicos, sociodemográficos, antropológicos e ações de saúde culturalmente específicas, entre os Yanomami. Seu Programa Interdisciplinar de Saúde associava a biomedicina a práticas de saúde nativas e à socialidade Yanomami, tanto nos modos de organizar o serviço, dividido por diferentes agentes que com eles se relacionavam há tempos, quanto no teor marcadamente intercultural das ações de saúde e atenção[4].

Seguindo as contradições entre conquista de direitos específicos e as práticas do Estado, entre 1987 e 1988, ano da promulgação da Constituição Federal, há uma série de tentativas de desfiguração direitos indígenas no país. Em 1987, a invasão garimpeira se intensifica entre os Yanomami, com consequências trágicas. As equipes de saúde sob o comando da CCPY, contando com membros de organizações da sociedade civil, universidades e outras instituições de saúde, e membros de missões religiosas, sobretudo católicas, todos envolvidos em ações de saúde, são expulsos da área, novamente sob a motivação de ameaçarem a segurança nacional.

Este conjunto de episódios trágicos, por outro lado, gera a denúncia na Comissão dos Direitos Humanos do Conselho Econômico e Social da Organização das Nações Unidas (ONU). Ela é preenchida com os números e imagens dos Yanomami adoecidos, mas também com o imaginário pregresso do qual faziam parte, na medida em que, sem ganhar a mesma visibilidade, outros povos padeciam também.

Ainda em 1987, os Yanomami são invadidos por uma profusão de voos diários e pistas de pouso clandestinas, ocorrem massacres em algumas regiões, com milhares de garimpeiros, comércios e outros empreendimentos funcionando dentro de suas terras. Na esteira de decretos presidenciais para desqualificação étnica de indígenas e desconfigurar seus direitos territoriais, o presidente da FUNAI, em lugar de resguardar direitos indígenas, assina um convênio com o órgão governamental para exploração de minérios dentro de áreas indígenas. Os Yanomami ficam ilhados, em meio a Parques e Florestas Nacionais criados para que pudessem ser economicamente explorados, em pleno território de circulação Yanomami (Albert, 1992).

No mesmo ano em que Davi Kopenawa ganha o Prêmio Global 500, das Nações Unidas, o genocídio orquestrado entre garimpeiros, empresários, militares, e políticos de várias esferas é registrado pela comitiva da Ação Pela Cidadania, em 1989 (APC, 1989). Segue-se a ela uma série de denúncias, artigos científicos e de divulgação. São estimados cerca de 40.000 garimpeiros em território Yanomami.

Os Yanomami e diversas regiões de seu território estavam devastados. A expulsão de equipes de saúde e a permissividade do Estado com o garimpo são descritas como uma estratégia de genocídio (Moreira, 1991): fome, malária, simultaneamente a outras doenças, todas acentuadas pela desnutrição, mortalidade infantil, envenenamento por mercúrio. Algumas aldeias estavam completamente desestruturadas (Confalonieri, 1990).

Cálculos baseados em dados produzidos ao longo de mais de uma década de ações de saúde, passando pela atuação de missionários, pelo Plano Yanoama e pelas redes formadas pela CCPY, permitiam dizer que ao menos 14% da população fora possivelmente dizimada entre 1987 e 1989 (FNS, 1991). A despeito disso, ainda em 1989, a demarcação das terras Yanomami em ilhas é rapidamente homologada e são criadas três reservas garimpeiras entre elas, dentro das Florestas Nacionais, estabelecidas no ano anterior.

Os anos seguintes seriam cruciais, do ponto de vista das políticas de saúde coletiva e indígena. Em 1990, diante de pressões nacionais e internacionais, é instituído o “Plano Emergencial de Atenção à Saúde Yanomami” (PEASY) e, dentro dele, o “Distrito Sanitário Yanomami”, posto em prática ainda antes de que ele estivesse formalmente criado.

O PEASY visava o atendimento emergencial e um diagnóstico sobre a situação de saúde, preenchendo o vácuo de informações do período sem atendimento regular ou informações epidemiológicas. As estimativas alarmantes se sucediam.

Uma comparação entre dados epidemiológicos disponíveis para antes e depois da abrupta interrupção de atendimento oportunamente destacavam que os indígenas haviam ficado sem atendimento. Estas informações existiam porque eram subsidiárias das iniciativas daquela rede participativa, pregressamente estabelecida.

Impedida de estar em área, a rede produzia estudos epidemiológicos com os indígenas na cidade de Boa Vista, no estado de Roraima, onde a FUNAI mantinha a “Casa do Índio” para hospedar doentes (Pithan, Confalonieri & Morgado, 1991). Quantos tinham morrido e adoecido, por faixas etárias, por quais doenças estavam acometidos, por vezes simultaneamente, de quais comunidades ou regiões eram provenientes, em geral, aquelas mais próximas ao garimpo: estes dados alimentavam denúncias, como a comoção e a pressão transnacionais.

Os números e imagens do genocídio Yanomami por epidemias, agravadas por degradadas condições de vida, considerando também sua projeção nos debates interdisciplinares transnacionais desde a década de 60, internacionalizam-se. Transformam-se em uma questão diplomática para o país (Porantim, 1990).

O Brasil é denunciado junto à Comissão de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA). As redes acionadas nesta querela diplomática e tendo como objetivo impedir o genocídio Yanomami são impressionantes.

Em 1990, o Sistema Único de Saúde brasileiro é criado formalmente. São instituídas as Conferências, Conselhos de Saúde e Instâncias de Controle Social. Tem início a desintrusão de garimpeiros, que eram ainda cerca de 7.000, em 1991.

Em fevereiro de 1991, um Decreto brasileiro cria os distritos sanitários de natureza especial, rascunhando juridicamente sua especificidade por diferentes áreas e comunidades indígenas do país. A competência dos cuidados em saúde é formalmente transferida da FUNAI a um órgão específico da saúde, o Ministério da Saúde, como havia sido acordado na Primeira Conferência Nacional de Saúde Indígena (UNI, 1988).

Em abril de 1991, o DSY é então constituído, através de portaria interministerial, que também aprova o projeto de saúde Yanomami’, a ser operado pelo Distrito Sanitário Yanomami (DSY). Logo em seguida, a área Yanomami sofre uma primeira interdição, em nome da preservação da integridade dos índios e de seus territórios. O Conselho Nacional de Saúde cria as Comissões Intersetoriais Nacionais, dentre as quais a “Comissão Intersetorial de Saúde do Índio” (a CISI), com composição híbrida, permitindo o acompanhamento das ações por setores do Estado e da sociedade civil (Benevides, Portillo & do Nascimento, 2014).

Durante a Eco-92 e sob a vigilância internacional, é anunciada a demarcação da TI Yanomami, interditada um ano antes.

Entre 1991 e 1999, quando o SasiSUS e os demais Distritos Sanitários Especiais Indígenas seriam finalmente regulamentados, a experiência do DSY alimenta discussões nacionais sobre a atenção diferenciada à saúde de indígenas, bem com estimula a constituição ou consolidação de outros distritos ao longo do país. Destes processos sociopolíticos de longa duração, com destaque para mobilizações indígenas e indigenistas, deflagrados por crises epidêmicas agudas, decorre o Primeiro Distrito, anunciando a competência formal do Estado brasileiro no atendimento específico de saúde a uma minoria populacional.

Considerações finais: onde aterra a Covid-19?

Em quais circunstâncias sociopolíticas chega a Covid-19?

Em 2019, ignorando o longo percurso participativo da construção do Subsistema e da conquista de um conjunto de direitos indígenas, o governo brasileiro resgata o discurso de assimilar indígenas à sociedade nacional, abrindo suas terras a projetos de exploração de minérios e outros recursos. Dedica-se a desconstruir a PNASPI, entre outros direitos conquistados (The Lancet, 2019). A proposta é reinserir a atenção ao nível do município. Como propunha para os indígenas, o Subsistema seria assimilado por uma Secretaria de Atenção Primária.

O governo recua na proposição após vultosas mobilizações nacionais de indígenas, em março de 2019, com a participação dos Yanomami e outros povos da região, na cidade de Boa Vista. A 6ª Conferência Nacional de Saúde Indígena, fórum mobilização, discussão e controle social, inicialmente prevista para maio de 2019, é seguidas vezes adiada pelo Estado.

Os Yanomami, especificamente, vêm sendo alvo de discursos muito semelhantes àqueles sustentados por setores militares e empresariado de mineração, na década de 80, como explorei aqui. São ditos poucos índios para muitas terras, atrapalhando o desenvolvimento do país. O então Presidente brasileiro, em 2019, teve na reparação do que considerou ser um erro demarcatório —ou seja, na reversão da demarcação da Terra Indígena Yanomami— uma das plataformas de seu governo[5].

Neste quadro sociopolítico desfavorável e de desconfiguração de direitos indígenas, instaura-se a pandemia de Covid-19. Ela atinge rapida e tragicamente diversos aspectos da vida de povos indígenas do país (Santos, Pontes & Coimbra Jr, 2020).

Em meio à crise sanitária, as ações e omissões do Governo não apenas ignoram a história pregressa sobre a conquista participativa do Subsistema, abordada metodologicamente através da criação do DSY. Elas também desconsideram as demandas e a participação de povos e movimento indígena na elaboração, execução e monitoramento de planos de enfrentamento à pandemia. Uma das questões centrais é a própria subnotificação de casos e óbitos, dado que os sistemas públicos de registro quando há atendimento, invisibilizam sobretudo indígenas em zonas urbanas, periurbanas e em Terras Indígenas ainda não formalmente reconhecidas.

Quando conseguem acesso a unidades indiferenciadas do SUS, indígenas são usualmente marcados como “pardos” nos sistemas de informação. Ao mesmo tempo, o SIASI permanece vedado à consulta pública, não permitindo uma gestão e avaliação adequadas por parte de indígenas ou mesmo análises científicas específicas, durante a pandemia. A chamada “invisibilidade demográfica e epidemiológica” de povos indígenas, conforme qualificada nos anos 2000 (Coimbra Jr & Santos, 2000), parece persistir em detrimento do favorável panorama regulatório, sob diferentes aspectos da política de Saúde.

Em 2020, o movimento indígena organizado e com expressão nacional, novamente articulado a uma ampla rede transnacional multidisciplinar e multi-institucional, somado a inúmeras iniciativas locais (Athila et al., 2021a), tem revertido esta situação. São deflagradas ações próprias de registro e monitoramento de infecções e óbitos através de redes híbridas e que têm tido reconhecimento amplo, desde a grande mídia ao Supremo Tribunal Federal (STF), instância máxima do judiciário brasileiro.

Em junho de 2020, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) e alguns partidos políticos brasileiros tiveram a Arguição por Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF nº 709) contra Governo, acolhida pelo STF, diante das insuficiências do executivo no combate à pandemia entre os indígenas e do risco real de genocídio (APIB, 2020b). É a primeira vez que uma organização indígena ingressa como parte reconhecida em um processo junto àquele tribunal.

O documento registra que agentes do Estado, paradoxalmente à revelia de controle sanitário, foram os primeiros transmissores da Covid-19 em áreas indígenas, através principalmente de profissionais de saúde. Dentre as medidas demandadas, estão a adoção de um plano efetivo e participativo de enfrentamento à pandemia entre indígenas, em toda e qualquer situação domiciliar, e a desintrusão, entre outras, da TI Yanomami, novamente invadida por cerca de 20.000 garimpeiros.

Intimada pelo STF, a Procuradoria Geral da República tenta desqualificar a ADPF, questionando a legitimidade de seus proponentes —notadamente a APIB— e a ineficiência do Estado em diversos aspectos. Sem acolhida, em julho se estabelece uma medida cautelar determinando diversas ações, entre as quais a elaboração de um plano efetivo de enfrentamento à pandemia entre povos indígenas. Até 2021, a União apresentou quatro versões do Plano, apenas parcialmente homologado e, ainda, uma quinta versão, rejeitada e considerada desconexa, pelo STF.

Poucas medidas foram efetivamente tomadas, com destaque para a renitência do governo federal em atender indígenas em terras indígenas não homologadas e indígenas em situação urbana. Uma etnografia dos documentos oficiais produzidos no âmbito da ADPF e pelo Ministério da Saúde brasileiro revela a permanência desta recusa. Ela atinge a imunização de indígenas que, através da ADPF, com o endosso de medidas de órgãos como o Ministério Público Federal, conquistou a inclusão de todos os indígenas no primeiro grupo prioritário de vacinação (Athila et al., 2021b).

Mas o Estado insiste em discriminá-los. Quais indígenas, quantos e onde? Notadamente aqueles em contextos urbanos e em áreas rurais não regularizadas ou não formalmente reconhecidas —tendo em conta a insuficiência desta definição, conforme abordei anteriormente— têm ficado à revelia do processo de imunização, entre outras ações de saúde ou com impacto sobre ela.

As exceções praticadas pela SESAI chegam a integrar um sistema de dados paralelo, que leva a marca da ADPF, dado que seu atendimento se restringiria ao período da pandemia. Um documento ressalta que, em qualquer hipótese, podem ser incluídos no cadastro indígenas que não estejam em Terras Indígenas (SESAI, 2020).

Muitos trabalhos tratam sobre as especificidades e vulnerabilizações múltiplas de indígenas, em terras indígenas e em outros espaços, acirradas na pandemia. Se em diferentes situações domiciliares, indígenas são consistentemente mais vulnerabilizados, seja em termos de contágio, mortalidade ou letalidade após admissão hospitalar e sua variação condicional às disparidades regionais do sistema de saúde, público e privado (Pontes, Cardoso, Bastos y Santos, 2021; Ranzani, Bastos, Gelli, Marchesi, Baião, Hamacher & Bozza, 2021; Hallal, Hartwig, Horta, Silveira, Struchiner, Vidaletti, Neumann, Pellanda, Dellagostin, Burattini, Victora, Menezes, Barros, Barros, & Victora, 2020). Isto inclui da distribuição desigual de estabelecimentos dedicados ao atendimento de média e alta complexidade, à disponibilidade de profissionais treinados, atingindo especialmente a região norte do país e, nacionalmente, indígenas (Pontes, Cardoso, Bastos y Santos, 2021; Ranzani et al., 2021; Hallal et al., 2020).

Se indígenas têm as piores taxas de mortalidade e intervalo de tempo de mortalidade desde a admissão em hospitais (Ranzani et al., 2021), isto demonstra falhas da atenção primária e de sua articulação com maiores níveis de complexidade de atendimento, determinando acesso tardio e em piores condições para os indígenas. Dentro do SasiSus, assinalo, ambas são competências da SESAI. Fora dele, é preciso considerar que o próprio acesso ao SUS é marcado por discriminação étnico-racial, acompanhada por alta mortalidade hospitalar (Constante, Marinho & Bastos, 2021).

Enquanto isso, até o dia 15 de julho de 2021, o monitoramento participativo dava conta de que eram 163 os povos indígenas atingidos pela Covid-19 no Brasil, com 1.130 mortes[6]. Omissões, como também ações do Estado têm atingido a população como um todo, embora diferencialmente. Mais de um ano após a chegada da Covid-19, tendo o Brasil ultrapassado o número de meio milhão de mortes, uma rede multidisciplinar de pesquisa em direitos humanos e sanitários evidenciou que, ao longo de 2020, em lugar de combater o vírus, o governo federal utilizou a ordem jurídica para ora implementar estratégias formais de sua propagação, ora para obliterar repostas mais efetivas à pandemia, editando nada mais do que 3.049 normas federais em um ou outro sentido (Asano, Ventura, Aith & Ribeiro, 2021).

Novamente invadidos por milhares de garimpeiros, vetores potenciais de doenças e degradação ambiental e sociológica, ao terem seis indígenas mortos pela Covid-19, três mortos sem informação e duas mortes suspeitas por garimpeiros[7], os Yanomami e Ye’kwana tiveram sua denúncia contra o governo brasileiro acolhida pela CIDH (Comissão Interamericana de Direitos Humanos), vinculada à OEA (Organização dos Estados Americanos), no sentido de assegurar sua saúde durante a pandemia (Valente, 2020). Desde o início da pandemia uma rede multidisciplinar e multi-institucional, associada à Hutukara Associação Yanomami (HAY) e outras organizações de abrangência regional, realiza um monitoramento paralelo de casos de Covid-19 e outras doenças, como a malária, na Terra Indígena Yanomami (PROYANOMAMI & ISA, 2020).

Mais do que discutido e aprimorado, o SasiSUS vem sendo meio e alvo de desfigurações e ações exterminatórias entre povos indígenas brasileiros e o Estado. Este processo, agravado na pandemia, encontra um movimento indígena vultoso e nacionalmente posicionado contrariamente às modificações que significariam o retorno a uma forma de atendimento não específica e não participativa, além de historicamente ineficiente.

Ao longo da trajetória da construção da política nacional de atenção à saúde indígena e suas tentativas de desconstrução, potencializadas no contexto da Covid-19, ações e omissões do poder público desconsideram e contrariam as mobilizações e demandas dos movimentos indígenas. Epidemias, desfigurações de direitos e tentativas de invisibilização encontram, uma vez mais, a mobilização de amplas redes indígenas e indigenistas, voltadas, entre outras ações, à produção de dados-denúncia. A expectativa é a de que haja efeitos jurídicos e práticos no Estado brasileiro, até o momento, pouco significativos.

Referências bibliográficas

ALBERT, Bruce. (1992). “Indian lands, environmental policy and military geopolitics in the development of the braziliam Amazon: the case of the Yanomami”. Development and Change, 23, 35-70.

ALBERT, Bruce. (1997). “Territorialité, ethnopolitique et développement: à propros du mouviment indien em Amazonie brésilienne XX”. Cahier des Ameriques Latines, 23, 177-210.

ANDERSON, Ian; ROBSON, Bridget; CONNOLLY, Michele; AL-YAMAN, Fadwa; BJERTNESS, Espen; KING, Alexandra; TYNAN, Michael; MADDEN, Richard; BANG, Abhey; COIMBRA JR, Carlos E. A.; et al. (2016). “Indigenous and tribal peoples’ health: The Lancet – Lowitja Institute Global Collaboration”. The Lancet, 388, 131-157.

APC (AÇÃO PELA CIDADANIA). (1989). Roraima: o aviso da morte. Relatório sobre a viagem da Comissão da Ação pela Cidadania ao Estado de Roraima, entre 9 e 12 de junho de 1989. São Paulo: CCPY, Cedi, Cimi.

APIB (ARTICULAÇÃO DOS POVOS INDÍGENAS DO BRASIL). (2020a). Nossa Luta é Pela Vida: Covid-19 e Povos Indígenas, o enfrentamento das violências durante a pandemia. Brasília.

APIB (ARTICULAÇÃO DOS POVOS INDÍGENAS DO BRASIL). (2020b). Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 709). Memorial do Arguente, apresentado ao Superior Tribunal Federal (STF). Brasília: Autor. Disponível em: https://ds.saudeindigena.icict.fiocruz.br/bitstream/bvs/3395/1/CP7_02120.pdf [consulta: 05/08/2020].

APIB (ARTICULAÇÃO DOS POVOS INDÍGENAS DO BRASIL). (2021). “APIB leva para Comissão Interamericana denúncias para evitar novo massacre aos povos Munduruku, Yanomami e Guajajara”. Notícia APIB, 1 de julho. Disponível em: https://apiboficial.org/2021/07/01/apib-leva-para-comissao-interamericana-denuncias-para-evitar-novo-massacre-aos-povos-munduruku-yanomami-e-guajajara/?fbclid=IwAR27qEe3vO8jMEwNJxSYyRT3d_V9Orax_brUDQvq8YXWCz4PG9KGfnVIB_o [consulta: 02/07/2021].

ASANO, Camila; VENTURA, Deisy de F. L.; AITH, Rossana R. R.; & RIBEIRO, T. B. (2021). “Mapeamento e análise das normas jurídicas de resposta à Covid-19 no Brasil”. Direitos na Pandemia, Boletim n° 10, 2-56.

ATHILA, Adriana R. (2021). A emergência do Distrito Sanitário Yanomami: uma análise sociopolítica. Em Ana Lúcia de Moura Pontes, Felipe Rangel de Souza Machado & Ricardo Ventura Santos (orgs.), A Política Antes da Política de Saúde Indígena, pp. 231-276. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz.

ATHILA, Adriana; KLEIN, Tatiane; MORAIS, Odilon; PIMENTEL, Spensy; HORTA, Amanda; MARQUES, Bruno; OLIVAR, José Miguel; & PRATES, Maria Paula. (2021a). “Análise situacional da pesquisa Respostas Indígenas à Covid-19 no Brasil: arranjos sociais e saúde global”. Plataforma de Antropologia e Respostas Indígenas à Covid-19, vol 1, edição especial. Disponível em: http://www.pari-c.org/artigo/11 [consulta: 15/03/2021].

ATHILA, Adriana; MACIEL, Anderson J.; DOS SANTOS, Ivana; OLIVEIRA, Cauê S.; & BRIZOLA, Laura C. (2021b). A história por trás da foto: nota de pesquisa sobre a conversa com Vanda Witoto. Plataforma de Antropologia e Respostas Indígenas à Covid-19, 1-8. Disponível em: http://www.pari-c.org/artigo/56 [consulta: 01/10/2021].

AZEVEDO, Marta M. (2011). “O Censo 2010 e os povos indígenas”. Em Beto Ricardo & Fanny Ricardo (orgs.), Povos Indígenas no Brasil 1996-2000, pp. 1-7 São Paulo: Instituto Socioambiental. Disponível em: https://pib.socioambiental.org/pt/O_Censo_2010_e_os_Povos_Ind%C3%ADgenas [consulta: 05/05/2021].

BERNSTEIN, Alissa. (2017). “Personal and political histories in the designing of health reform policy in Bolivia”. Social Science & Medicine, 177, 231-8.

BRASIL. (1999). Lei nº 9.836, que institui o Subsistema de Atenção à Saúde Indígena. 23 de setembro. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9836.htm [consulta: 20/10/2021].

BENEVIDES, Luciana; PORTILLO, Jorge A. C.; & DO NASCIMENTO, Wanderson. F. (2014). “A atenção à saúde dos povos indígenas do Brasil: das missões ao subsistema”. Tempus, Actas de Saúde Coletiva, 8-1, 29-39.

CARNEIRO DA CUNHA, Manuela M. (2018). “Índios na Constituição. Dossiê 30 anos da Constituição brasileira”. Novos Estudos Cebrap, 37-3, 429-443. Disponível em: http://novosestudos.com.br/wp-content/uploads/2018/12/05_cunha_112_428a443_2_baixa.pdf [consulta: 23/10/2021].

CCPY (COMISSÃO PELA CRIAÇÃO DO PARQUE YANOMAMI). (1986). Boletim Urihi, 4. Disponível em: www.proyanomami.org.br/v0904/index.asp?pag=htm&url=/apy/urihi/boletim_04.htm [consulta: 17/07/2021].

CHADE, Jamil. (2021). “Pela 1ª vez, Brasil é citado por assessora da ONU sobre genocídio”. Notícia Uol, 28 de junho. Disponível em: https://noticias.uol.com.br/colunas/jamil-chade/2021/06/28/pela-1a-vez-brasil-e-citado-por-assessora-da-onu-sobre-genocidio.htm [consulta: 30/07/2021].

CHARLIER, Philippe & VARISON, Leandro. (2020). “Is Covid-19 being used as a weapon against Indigenous Peoples in Brazil? Peoples in Brazil?”. The Lancet Correspondence, 396, 1069-1070. Disponível em: https://www.thelancet.com/journals/lancet/article/PIIS0140-6736(20)32068-7/fulltext [consulta: 20/10/2020].

COIMBRA JR, Carlos. E. A. & SANTOS, Ricardo V. (2000). “Saúde, minorias e desigualdade: algumas teias de inter-relações, com ênfase nos povos indígenas no Brasil”. Ciência e Saúde Coletiva, 5-1, 125-132.

COIMBRA JR., C. E. A.; SANTOS, Ricardo V.; WELCH, James R.; CARDOSO, Andrey M.; SOUZA, Miriam C., GARNELO, Luíza; RASSI, Elias; FOLLÉR, Maj-Lis; & HORTA, Bernardo L. (2013). “The First National Survey of Indigenous People's Health and Nutrition in Brazil: Rationale, methodology, and overview of results”. BMC Public Health, 13-52, 1-19.

CONFALONIERI, Ulisses E. C. (1990). Relatório de Saúde dos Yanomami. Em Marcio Santilli & Ulisses Confalonieri (orgs.), Ação Pela Cidadania (APC). Yanomami: a todos os povos da terra, 2º Relatório da Ação pela Cidadania sobre o caso Yanomami, referente aos acontecimentos do período junho de 1989 a maio de 1990, pp. 29-37. São Paulo: CCPY, Cedi, CIMI, NDI.

CONSTANTE, Helena M; MARINHO, Gerson L.; & BASTOS, João L. (2021). “The door is open, but not everyone may enter: racial inequities in healthcare access across three Brazilian surveys”. Ciência & Saúde Coletiva, 26-09, 3981-3990. Disponível em: https://www.scielosp.org/article/csc/2021.v26n9/3981-3990/ [consulta: 1/10/2021].

CURTISE, Kaitlin & CHOO, Esther. (2020). “The penumbra: indigenous populations: left behind in the Covid-19 response. Perspectives. The Lancet, 395, 1753.

DAVIS, Shelton H. (1978). Vítimas do Milagre: O Desenvolvimento e os Índios no Brasil. Rio de Janeiro: Zahar.

DEL POPOLO, Fabiana. (2008). Los pueblos indígenas y afrodescendentes en las fuentes de datos: experiencias en América Latina. Santiago: Cepal – Naciones Unidas.

DENT, Rosana & SANTOS, Ricardo V. (2017). “An unusual and fast disappearing opportunity: infectious disease, indigenous populations, and new biomedical knowledge in Amazonia, 1960-1970”. Perspectives on Science, 25-5, 585-605.

DNPM (Departamento Nacional da Produção Mineral, Brasil). (1975). Projeto Radar da Amazônia (Radam), Programa de Integração Nacional. v. 7 e 8. Brasília: Ministério das Minas e Energia, Departamento Nacional da Produção Mineral.

DO PATEO, Rogério D. (2014). Relatório sobre a Violação de Direitos Humanos na TIY – 1960-1988. Brasília: Comissão da Verdade.

DPFL (DUE PROCESS OF LAW FOUNDATION) & OXFAM. (2015). Executive Summary: Right to Free, Prior, and Informed Consultation and Consent in Latin America Progress and challenges in Bolivia, Brazil, Chile, Colombia, Guatemala, and Peru. Washington D. C.: Autor.

ELOY, Luís H. (2020). ADPF 709 no Supremo: povos indígenas e o direito de existir! Disponível em: https://apiboficial.org/2020/08/01/adpf-709-no-supremo-povos-indigenas-e-o-direito-de-existir/ [consulta: 16/07/2020].

FASSIN, Didier. (2020). “L'illusion dangereuse de l'égalité devant l'épidémie”. Collège de France, 16 de abril. Disponível em: https://www.college-de-france.fr/site/didier-fassin/L-illusion-dangereuse-de-legalite-devant-lepidemie.htm [consulta: 23/04/2020].

FELLOWS, Marta; PAYE, Valéria; ALENCAR, Ane; NICÁCIO, Mário, CASTRO, Isabel; COELHO, Maria E.; SILVA, Camila V. J.; BANDEIRA, Matheus; LOURIVAL, Reinaldo & BASTA, Paulo C. (2021). Under-Reporting of Covid-19 Cases Among Indigenous Peoples in Brazil: A New Expression of Old Inequalities. Frontiers in Psychiatry, 12. Disponível em: https://www.frontiersin.org/articles/10.3389/fpsyt.2021.638359/full [consulta: 15/05/2021].

FERDINAND, Angeline; LAMBERT, Michele; TRAD, Leni; PEDRANA, Leo; PARADIES, Yin & KELAHER, Margareth. (2020). “Indigenous engagement in health: lessons from Brazil, Chile, Australia and New Zealand”. International Journal for Equity in Health, 19:47.

FUNASA (FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAÚDE). (2002). Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas. Brasília: Autor.

FNS (FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAÚDE). (1991). Primeiro relatório do Distrito Sanitário Yanomami: avaliação das atividades e diagnóstico de saúde. (Por Ivone A. Menegolla, Maria Stella de C. Lobo, Oneron A. Pithan, István van Deursen Varga, Alcida R. Ramos). Mimeo.

GRACEY, Michael & KING, Malcom. (2009). “Indigenous health part 1: the underlying causes of the health gap.” The Lancet, 374, 65-75.

GUIMARÃES, Bruno N. & SANTOS, Ricardo V. (2021). Estatísticas de Resistência e os Horizontes da Saúde Indígena na Ditadura Militar. Em Ana Lúcia de Moura Pontes, Felipe Rangel de Souza Machado & Ricardo Ventura Santos (orgs.), A Política Antes da Política de Saúde Indígena, pp. 99-129. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz.

HALLAL, Pedro C.; HARTWIG, Fernando P.; HORTA, Bernardo L.; SILVEIRA, Mariângela F.; STRUCHINER, Cláudio J.; VIDALETTI, Luís P.; NEUMANN, Nelson A.; PELLANDA, Lucia C.; DELLAGOSTIN, Odir A.; BURATTINI, Marcelo N.; VICTORA, Gabriel D.; MENEZES, Ana M. B.; BARROS, Fernando C.; BARROS, Aluísio J. D.; & VICTORA, Cesar G. (2020). “Sars-Cov-2 antibody prevalence in Brazil: results from two successive nationwide serological household surveys”. The Lancet Global Health, 8-11, 1390-1398. Disponível em: https://www.thelancet.com/journals/langlo/article/PIIS2214-109X(20)30387-9/fulltext [consulta: 10/11/2020].

HUNT, Lynn. (2009). A Invenção dos Direitos Humanos: uma História. São Paulo: Companhia das Letras.

IBGE (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA). (2012). Censo Demográfico 2010: Características Gerais dos Indígenas. Resultados do Universo. Rio de Janeiro: Autor.

IIDH (INSTITUTO INTERAMERICANO DE DERECHOS HUMANOS). (2007). Migraciones indígenas en las Américas. San José: IIDH.

KING, Malcom; SMITH, Alexandra; & GRACEY, Michael. (2009). “Indigenous health part 2: the underlying causes of the health gap.” The Lancet, 374, 76-85.

KOPENAWA, Davi & ALBERT, Bruce. (2010). La Chute du Ciel: Paroles d’un Chaman Yanomami. Paris: Plon.

LANGDON, Esther Jean & CARDOSO, Marina (orgs.). (2015) Saúde Indígena: Políticas Comparadas na América Latina. Florianópolis: Editora UFSC.

LIMA, Nísia T. (2007). “Public health and social ideas in modern Brazil”. American Journal of Public Health, 97, 1209-1215.

MADI DIAS, Diego. (2021). “À luz da diferença: responsabilidade, alteridade e a «lógica do cuidado»”. Revista USP, 128, 77-95.

MCSWEENEY, Kendra & ARPS, Shahna A. (2005). “A «Demographic turnaround»: The rapid growth of Indigenous populations in Lowland Latin America”. Latin American Research Review, 40-1, 3-29.

MONTENEGRO, Raul & STEPHENS, Carolyn. (2006). “Indigenous health in Latin America and the Caribbean”. The Lancet, 367, 1859-69.

MOREIRA, Memélia. (1991). A estratégia do Genocídio Yanomami. Em C. A. R. Ricardo (Org.), Povos Indígenas no Brasil, pp. 162. São Paulo: ISA.

MULLIGAN, Kate; RAYNER, Jennifer; & NNOROM, Onye. (2020). “Race-based health data urgently needed during the coronavirus pandemic”. The Conversation, April 30. Disponível em: https://theconversation.com/race-based-health-data-urgently-needed-during-the-coronavirus-pandemic-136822 [consulta: 15/06/2020].

NEEL, James V. & SALZANO, Francisco M. (1964). “A prospectus for genetix studies for the american Indian”. Cold Spring Harbor Symposia on Quantitative Biology, 29, 85-98.

OIT (ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO). (2011). Convenção n° 169 sobre povos indígenas e tribais e Resolução referente à ação da OIT. Brasília: Autor.

PAGLIARO, Heloísa; AZEVEDO, Marta M. & SANTOS, Ricardo V. (2005). Demografia dos povos indígenas no Brasil: um panorama crítico. Em Heloísa Pagliaro, Marta Azevedo & Ricardo Ventura Santos (orgs.), Demografia dos Povos Indígenas no Brasil, pp. 11-32. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz e Associação Brasileira de Estudos Populacionais/ABEP.

PAIM, Jaimilson; TRAVASSOS, Claudia; ALMEIDA, Célia; BAHIA, Lígia; & MACINKO, James. (2011). “The Brazilian health system: History, advances, and challenges”. The Lancet, 377, 1778-1797.

PEREIRA, Nilza O. M.; SANTOS, Ricardo V.; WELCH, James R.; SOUZA, Luciene G.; & COIMBRA JR, Carlos E. A. (2009). “Demography, territory, and identity of indigenous peoples in Brazil: The Xavante Indians and the 2000 Brazilian National census”. Human Organization, 68, 66-180.

PITHAN, Oneron A.; CONFALONIERI, Ulisses E. C.; & MORGADO, Anastácio F. (1991). “A situação de saúde dos índios Yanomámi: diagnóstico a partir da Casa do Índio de Boa Vista, Roraima, 1987-1989”. Cadernos de Saúde Pública, 7-4, 563-580.

PONTES, Ana L. M.; CARDOSO, Andrey M.; BASTOS, Leonardo S.; & SANTOS, Ricardo V. (2021). Pandemia de Covid-19 e os povos indígenas no Brasil: cenários sociopolíticos e epidemiológicos. Em Gustavo Corrêa Matta, Sergio Rego, Ester Paiva Souto & Jean Segata (orgs.), Os impactos sociais da Covid-19 no Brasil: populações vulnerabilizadas e respostas à pandemia [on line], pp. 123-136. Rio de Janeiro: Observatório Covid 19 – Editora Fiocruz.

PONTES, Ana L. de M.; MACHADO, Felipe; SANTOS, Ricardo V.; & AROUCA, C. (2019). “Diálogos entre indigenismo e reforma sanitária: bases discursivas da criação do subsistema de saúde indígena”. Saúde em Debate, 43, 146-159.

PONTES, Ana L. de M.; MACHADO, Felipe R. de S.; & SANTOS, Ricardo V. (orgs.). (2021). A Política Antes da Política de Saúde Indígena. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz.

PONTES, Ana L. de M. & SANTOS, Ricardo V. (2020). “Health reform and Indigenous health policy in Brazil: contexts, actors and discourses”. Health Policy and Planning, 35, 107-114. Disponível em: https://portal.fiocruz.br/en/documento/health-reform-and-indigenous-health-policy-brazil-contexts-actors-and-discourses [consulta: 7/01/2021].

PORANTIM. (1990). Boletim Periódico do Conselho Indigenista Missionário (CIMI), jul.-set. Brasília: CIMI.

PROYANOMI & ISA (INSTITUTO SOCIOAMBIENTAL). (2020). Xawara: rastros da Covid-19 e a omissão do Estado. São Paulo: Autor.

RAMOS, Alcida R. (1991). “Auaris Revisitado”. Série Antropologia, 117, 2-31.

RAMOS, Alcida R. (1993). “O papel político das epidemias: o caso Yanomami”. Série Antropologia, 153, 2-21.

RANZANI, Otavio T.; BASTOS, Leonardo S. L.; GELLI, João Gabriel M.; MARCHESI, Janaina F.; BAIÃO, Fernanda; HAMACHER, Silvio; & BOZZA, Fernando A. (2021). “Characterisation of the first 250 000 hospital admissions for Covid-19 in Brazil: a retrospective analysis of nationwide data”. The Lancet Respiratory Medicine, 9-4, 407-418. Disponível em: https://www.thelancet.com/journals/lanres/article/PIIS2213-2600(20)30560-9/fulltext [consulta: 20/01/2021].

SANTOS, Ricardo V.; CARDOSO, Andrey M.; GARNELO, Luíza; COIMBRA JR., Carlos E. A.; & CHAVES, Maria de Betania G. (2008). Saúde dos povos indígenas e políticas públicas no Brasil. Em Lígia Giovanella, Sarah Escorel, Lenaura Lobato, J Noronha, AI Carvalho (orgs.), Políticas e Sistema de Saúde no Brasil, pp. 1035-1056. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz.

SANTOS, Ricardo V.; GUIMARÃES, Bruno N.; SIMONI, Alessandra T.; DA SILVA, Leandro O.; DE OLIVEIRA ANTUNES, Marta; DE SOUZA DAMASCO, Fernando; COLMAN, Rosa; & AZEVEDO, Marta M. do A. (2019). “The identification of the Indigenous population in Brazil’s official statistics, with an emphasis on demographic censuses”. Statistical Journal of the IAOS, 35-1, 29-46.

SANTOS, Ricardo V.; PONTES, Ana L. M.; & COIMBRA JR, Carlos E. A. (2020). “Um «fato social total»: Covid-19 e povos indígenas no Brasil”. Cadernos de Saúde Pública, 36-10, 1-5.

SELAU, Maria G.; OLIVEIRA, Maria A., MENEGOLLA, Ivone A.; ZACQUINI, Carlo; & VERDUN, Ricardo. (1988). “Uma política diferenciada de saúde para populações isoladas e/ou recém-contatadas. Os Yanomami no Brasil”. Saúde em Debate, edição especial, 52-59.

SESAI (SECRETARIA ESPECIAL DE SAÚDE INDÍGENA). (2020). Ofício Circular nº 66, 29 de setembro. Brasília: Autor.

SOUZA LIMA, Antônio Carlos. (2005). Indigenism in Brazil: The internacional migration of State politics. Em Benoît L’Estoile, Frederico Neiburg & Lígia Sigaud (orgs.), Empires, Nations and Natives. Anthropology and State-Making, pp. 197-222. Durham: Duke University Press.

STEPHENS, Carolyn; NETTLETON, Clive; PORTER, John; WILLIS, Ruth; & CLARK, Stephanie. (2005). Indigenous peoples’ health —why are they behind everyone, everywhere? The Lancet, 366, 10-13.

TAYLOR, Keneth I. & RAMOS, Alcida R. (eds.). (1979). The Yanoama in Brazil, 1979. Copenhagen: IWGIA.

THE LANCET. (2009). “Where are we now with Indigenous health?”. Editorial. The Lancet, 374, 2.

THE LANCET. (2019). “Bolsonaro threatens survival of Brazil’s Indigenous population”. Editorial. The Lancet, 394, 444.

THE LANCET. (2021). “Health as a foundation for society”. Editorial. The Lancet, 397, 1.

UN (UNITED NATIONS). (2007). Declaration on the Rights of Indigenous Peoples. Disponível em: https://www.un.org/development/desa/indigenouspeoples/declaration-on-the-rights-of-indigenous-peoples.html [consulta: 18/05/2021].

UNI (UNIÃO DAS NAÇÕES INDÍGENAS). (1988). “Os povos indígenas e o direito à saúde”. Saúde em Debate, edição especial, 8-9.

VALENTE, Rubens. (2020). “Comissão da OEA notifica governo Bolsonaro a dar proteção aos Ianomâmis”. Notícia Uol, 20 de julho. Disponível em: https://noticias.uol.com.br/colunas/rubens-valente/2020/07/20/coronavirus-amazonia-governo-bolsonaro.htm [consulta: 20/08/2020].

VIEIRA-DA-SILVA, Lígia M. & PINELL, Patrice. (2014). “The genesis of collective health in Brazil”. Sociology of Health & Illness, 36, 432-446.

WHO (WORLD HEALTH ORGANIZATION). (1978). Declaration of Alma-Ata. International Conference on Primary Health Care. Disponível em: https://www.who.int/publications/almaata_declaration_en.pdf [consulta: 18/01/2020].

ZAVALETA, Carol. (2020). “Covid-19: review Indigenous peoples’ data”. Nature, 7 de abril de 2020. Disponível em: https://www.nature.com/articles/d41586-020-01032-1 [consulta: 15/05/2020].


[1]Notas

 Este artigo faz parte do projeto “Saúde dos Povos Indígenas no Brasil: Perspectivas Históricas, Socioculturais e Políticas”, com financiamento concedido ao Dr. Ricardo Ventura Santos, pelo Wellcome Trust/UK (203486/Z/16/Z). A pesquisa documental e de campo aconteceu entre 2018 e 2020, com financiamento do Programa Nacional de Pós-Doutorado da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal e Ensino Superior (CAPES), do governo brasileiro, dentro do Programa de Pós-Graduação de Epidemiologia em Saúde Pública, Escola Nacional e Saúde Pública Sérgio Arouca, da Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ). No contexto da Covid-19, contou com o suporte do projeto “Respostas Indígenas à Covid-19: arranjos sociais e saúde global”, financiada pelo Conselho Médico de Pesquisa da agência governamental de pesquisa e inovação do Reino Unido (MRC/UKRI), e coordenada pelas Dras. Christine MacCourt e Maria Paula Prates.

[2] O material das entrevistas, como um conjunto vultoso de documentos, que aqui não caberiam, foram detalhadamente analisados em outra publicação, da qual este artigo é também subsidiário (Athila, 2021). Para a pesquisa, como um todo, remeto o leitor a Pontes, Machado & Santos (2021).

[3] Boa parte dos episódios digitalizados pode ser consultada diretamente em: http://ikore.com.br/programa-de-indio/

[4] Para uma análise detalhadas das ações de saúde desenvolvidas pela CCPY, remeto o leitor a Athila (2021).

[5] Disponível em: https://www.survivalbrasil.org/artigos/3543-Bolsonaro

[6] Fonte em tempo real: https://apiboficial.org/ (consulta: 15 de julho de 2021).

[7] Dados de 16 de novembro de 2020.